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A representação feminina nos lendários gaúcho e quebequense

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carregam em si elementos do maravilhoso que lhes dão dimensões muitas vezes bem maiores<br />

das que eles têm. Por isso, tais narrativas passam uma idéia de intervenção/advertência, na<br />

medida em que são contra-exemplos face ao comportamento que se espera de uma determinada<br />

sociedade. A referência ao caráter real e maravilhoso é necessária porquanto os fatos –<br />

históricos ou cotidia<strong>nos</strong> – podem ser transformados em lendas a partir de uma conversa familiar.<br />

Entretanto, a conversa nunca é inocente e pura: há sempre uma disposição mental que se verá<br />

concretizada justamente a partir do processo narrativo de imitação da realidade.<br />

Afirma Zumthor (1997, p. 27):<br />

(...) a oralidade não significa analfabetismo, o qual, despojado de valores da própria<br />

voz e de qualquer função social positiva, é percebido como uma lacuna (...) toda<br />

oralidade <strong>nos</strong> aparece mais ou me<strong>nos</strong> como sobrevivência, reemergência de um<br />

antes, de um início, de uma origem (...).<br />

Assim, mesmo que algumas narrativas orais se originem de fatos contados por pessoas<br />

iletradas, esse fato não é determinante para a caracterização daqueles que contam as histórias<br />

orais; ou seja, falar em iletrado não implica afirmar que todas as narrativas orais se originem em<br />

iletrados; ao contrário, o objetivo é mostrar que o grau de instrução não influi na legitimação de<br />

uma narrativa oral; não importa se a pessoa lê ou escreve, importa é a história que ela conta com<br />

o intuito de resgatar suas origens, de manter viva sua cultura e suas normas sociais.<br />

dirá:<br />

Por outro lado, o teórico <strong>quebequense</strong> Jean Du Berger (in DION et al, 1999, p. 191),<br />

na ordem da memória de um indivíduo, a narrativa que dá conta de uma vida é uma<br />

construção, portanto, uma escolha que responde à necessidade de <strong>representação</strong> de si<br />

mesmo. Retórica, ela visa a persuadir o destinatário de que a vida do “sujeito que se<br />

conta” tem um sentido, positivo ou negativo.<br />

Assim, o fato de o indivíduo transmitir valores morais e sociais a partir do ato de<br />

contar algo (e de ver esses valores sendo retransmitidos e legitimados no seio da sociedade<br />

sob a forma de narração oral) faz com que ele se sinta capaz de exercer algum poder, na<br />

medida em que seus atos e idéias têm uma função determinada: a de ser representante das<br />

idéias, virtudes e expectativas de um dado grupo social.<br />

Assim, vemos que a memória do indivíduo funciona como uma ferramenta na<br />

construção dos elementos que ele espera ver como participantes de uma sociedade; ele vê a<br />

memória narrativa ou como solução para seus problemas ou como forma de acomodar sua<br />

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