A representação feminina nos lendários gaúcho e quebequense
A representação feminina nos lendários gaúcho e quebequense
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de um pacto real com o diabo. Assim, a bruxa não age sozinha: todas as coisas são<br />
feitas por intermédio daquele após o pacto. Portanto, para os inquisidores, a bruxaria não é<br />
mera ilusão, fantasia ou imaginação, já que o diabo teria poder sobre a mente humana para<br />
gerar tais acontecimentos psíquicos.<br />
Dada essa relação da bruxa com o diabo, podemos pensar que as manifestações<br />
bruxólicas são feitas tão somente com base no elemento diabólico, a partir do pacto realizado<br />
entre ambos. Todavia, e com base naquilo que já analisamos, a <strong>representação</strong> <strong>feminina</strong><br />
também tem seus poderes empíricos de sedução e persuasão, que a auxiliam na relação com o<br />
masculino. A <strong>representação</strong> <strong>feminina</strong>, em geral à margem do discurso, é aquela que serve tão<br />
somente para pactuar com o homem e agir por suas causas. Nisso se percebe a relação que<br />
existe entre eles, e é essa relação que o gênero representa. Segundo Teresa de Lauretis (1994,<br />
p. 211),<br />
o termo gênero é, na verdade, a <strong>representação</strong> de uma relação, a relação de pertencer<br />
a uma classe, um grupo, uma categoria. Gênero é a <strong>representação</strong> de uma relação, ou<br />
se me permitirem adiantar-me para a segunda proposição, o gênero constrói uma<br />
relação entre uma entidade e outras entidades previamente constituídas como uma<br />
classe, uma relação de pertencer; assim, o gênero atribui a uma entidade, digamos a<br />
uma pessoa, certa posição dentro de uma classe e, portanto, uma posição vis-à-vis<br />
outras classes pré-constituídas. (...) Assim, gênero representa não um indivíduo e<br />
sim uma relação; uma relação social, em outras palavras representa um indivíduo<br />
por meio de uma classe.<br />
Nas práticas da vida cotidiana é que irão surgir os mitos e as personagens da literatura<br />
oral, e o gênero é produto de tais práticas, que atribuem funções determinadas tanto ao<br />
feminino quanto ao masculino, e é a partir dessas funções que Teiniaguá e Corriveau serão<br />
representadas e socializadas. Teiniaguá e Corriveau irão surgir em sociedades que vêem a<br />
<strong>representação</strong> <strong>feminina</strong> como sombra da masculina, “mulheres” entendidas com base naquilo<br />
que é importante para os homens.<br />
Joana Philadelphio, ao citar Roger Samuel (in FONTES, 2002, p. 34-35), sustenta que<br />
o mito exprime uma visão da realidade e que pode ser definido como um discurso ou uma<br />
narrativa de histórias, reais ou fantasiosas, por várias razões consideradas pelos seres<br />
huma<strong>nos</strong> como imbuídos de um significado anterior do universo e da vida humana. Segundo<br />
Samuel, é uma narrativa que poderia ter acontecido no passado, se a realidade presente puder<br />
ser explicada pelo modelo de realização que o mito propõe (como exemplo, o mito de Adão e<br />
Eva). O mito expressa “o supratemporal e permanente, o que jamais deixa de ocorrer e que<br />
como paradigma vale para todos os tempos”.<br />
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