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A representação feminina nos lendários gaúcho e quebequense

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transgredir as normas da Igreja, ela foi condenada a perder aquele a quem seduziu, para que<br />

se sentisse culpada pela transgressão.<br />

Religião e magia caminham juntas, são dois elementos que se completam e se fazem<br />

presentes nas características desta personagem. Teiniaguá é moura e, mesmo possuindo uma<br />

religião que não é aceita pela sociedade, assume sua condição e sua cultura; possui os poderes<br />

da magia que, aliados à perspicácia <strong>feminina</strong>, tornam-na sedutora. A mistura da religião com<br />

o sobrenatural <strong>nos</strong> dá a idéia da concepção de mundo que ela possui e o encontro com o Blau<br />

formará o cosmos organizado, a partir do surgimento desse novo par.<br />

No contexto da literatura oral <strong>quebequense</strong>, Marie-Josephte Corriveau é uma de suas<br />

mais legítimas representantes. Ela também inspirou peças de teatro, canções, romances (como<br />

aqueles dos quais extraímos as versões da lenda aqui estudadas, Les anciens canadiens e Le<br />

chien d´Or) e se mantém viva e permanente na cultura desse povo. Ela é, além de um mito,<br />

vista pelo povo <strong>quebequense</strong> como uma personagem histórica, uma heroína, quase uma Joana<br />

D’Arc do Canadá francês. Viveu no período da Conquista do Canadá, no qual os franceses<br />

lutavam para dominar o território. É um contexto que, como o da Revolução Federalista, no<br />

Rio Grande do Sul, prima pela superioridade masculina. No entanto, a Corriveau é muito mais<br />

dissimulada que sedutora; não que ela não seduza, mas todas as narrativas que envolvem sua<br />

<strong>representação</strong> a colocam como quem simula a morte dos maridos, que planeja os assassinatos<br />

da mesma forma como quem planeja uma festa; é oportuno citarmos aqui o encontro da<br />

Corriveau com Angélique des Méloises e todo o prazer demonstrado pela Corriveau, que<br />

planeja a morte da rival Caroline como quem planeja uma reunião de amigos.<br />

Planejar as mortes, pensar <strong>nos</strong> detalhes: tudo isso é o que caracteriza a Corriveau<br />

como a <strong>representação</strong> <strong>feminina</strong> assassina. Para a sociedade, ela mata porque é fria, calculista,<br />

porque isso está no seu instinto feminino. Ela foi capaz, ainda segundo a história, de deixar<br />

que seu pai fosse, num primeiro momento, condenado, demonstrando assim sua maldade.<br />

Nunca foi provado se esse pai não teria realmente cometido o crime. Contudo, condenar uma<br />

mulher era muito mais fácil. A sociedade <strong>quebequense</strong> da época também passava por um<br />

período tumultuado em que ingleses e franceses lutavam pela conquista do Quebec; sendo ela<br />

do Quebec, sua condenação representa uma vitória dos ingleses sobre os franceses, <strong>nos</strong><br />

interesses de colonização.<br />

Nesse contexto, eram os homens que lutavam e tinham poderes não só sobre a mulher,<br />

mas sobre a sociedade. Em <strong>nos</strong>so ponto de vista, é possível que a Corriveau tenha sido vítima<br />

da justiça popular, que condenava todas aquelas que não obedecessem aos seus pais, maridos,<br />

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