20.02.2017 Views

TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

2. Os topoi<br />

Ducrot desenvolve em separado, mas para melhor sustentar suas teses, um aspecto<br />

segundo o qual a argumentação funciona: porque se baseia em topoi ou lugares,<br />

no sentido que esta palavra tem na retórica (daí “lugar-comum”), ou seja, em<br />

crenças ou em “verdades” amplamente aceitas.<br />

Por exemplo, se alguém pergunta a um amigo se quer tomar vinho e ele responde “não,<br />

está muito quente”, a resposta evoca um tópos, isto é, um lugar-comum, segundo o<br />

qual vinho é bebida de estações (mais) frias. Com cerveja seria o inverso, pelo menos<br />

em nossa cultura (o leitor pode construir o diálogo correspondente).<br />

Contrariar um lugar-comum, isto é, um valor aceito, pode criar problemas de interpretação<br />

para os enunciados, eventualmente para sequências textuais. Outra possibilidade<br />

é que tal contrariedade represente outra posição (cultural, ideológica) ou<br />

que há pessoas de comportamento não convencional (que tomam sorvete no inverno,<br />

vinho na praia etc.) – ver abaixo, o tópico sobre blocos semânticos.<br />

Os exemplos de Ducrot (adaptados) são, entre outros:<br />

Para verificar como funcionam os topoi (plural grego de tópos), vejamos outro<br />

Exemplo 2<br />

Pedro tem dinheiro (saúde), portanto é feliz (que funciona com base no tópos “ter dinheiro<br />

[saúde] traz felicidade”).<br />

Pedro tem dinheiro (saúde), mas não é feliz (que contariam os lugares-comuns, ou os valores<br />

dominantes, por muitos considerados universais).<br />

exemplo com “mas”, em outro campo, o basquete. Suponhamos que, faltando três<br />

segundos para o final de um jogo, o técnico do time que está perdendo por um ponto<br />

proponha escalar certo jogador porque “ele é alto” (no basquete, ser alto é um valor;<br />

é um lugar-comum que jogadores de basquete devem ser altos, embora se aceite que<br />

os armadores possam ser baixos). Suponha agora que seu auxiliar lhe diga: “é alto,<br />

mas é lento” (a velocidade é outro lugar da argumentação). “É alto” é um argumento<br />

para escalar o jogador; “é lento”, para não escalar. A decisão do técnico (é ele quem<br />

decide, o que é outro tópos...) dependerá de ele preferir velocidade ou altura, o que,<br />

por sua vez, depende da jogada que ele vai propor aos seus atletas.<br />

Esse exemplo serve também para ilustrar outra tese de Ducrot, a da polifonia. Segundo<br />

ele, muitos enunciados apresentam mais de uma voz, que podem ser vozes de locutores<br />

(como em um diálogo “real”) ou de enunciadores (pontos de vista representados).<br />

Os dois casos podem ser representados por um diálogo como o exemplificado acima:<br />

o técnico propõe escalar um jogador alto, e seu auxiliar, um jogador rápido. São dois<br />

NOTAS SOBRE SEMÂNTICA ARGUMENTATIVA<br />

140

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!