TEXTOS DISSERTATIVO-ARGUMENTATIVOS
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aquelas entre o narrador e o herói. O linguista francês Oswald Ducrot retoma a<br />
ideia de polifonia desenvolvida por Bakhtin. Contudo, diferentemente deste último,<br />
que aplica o conceito de polifonia ao texto, Ducrot mostra que é possível aplicar<br />
esse conceito também aos enunciados que constituem os textos, ou seja, a polifonia<br />
é constitutiva do próprio enunciado. O mundo discursivo, criado pela fala, é<br />
habitado por personagens, ficções discursivas, e não, ao contrário, por indivíduos<br />
objetivamente determinados. Nesse mundo criado no momento da enunciação,<br />
encontram-se personagens discursivos, como: locutores – a quem se referem as<br />
marcas de primeira pessoa e o pronome “eu”; alocutários – a quem se referem<br />
as marcas de segunda pessoa; e enunciadores – personagens que aparecem nos<br />
enunciados como a expressão de uma atitude, posição, ou de ponto de vista, sem<br />
que a eles se possa atribuir alguma palavra, no sentido material do termo.<br />
A conjunção “mas” é um bom exemplo de operador lógico responsável por colocar na<br />
cena textual vozes divergentes. O “mas” de argumentação é considerado por Ducrot<br />
(1987) o operador por excelência. Como operador argumentativo, consiste em dois<br />
movimentos distintos, em que se coordenam os elementos semânticos P e Q por meio<br />
do elemento gramatical. Ducrot (1987, p. 215-216) descreve esse tipo de enunciado<br />
por meio da fórmula “P mas Q”, em que o primeiro argumento orienta para uma<br />
conclusão implícita r e o segundo argumento para uma conclusão implícita não r.<br />
O embate ocorre ao se colocar o locutor em uma interpretação argumentativa contrária<br />
à que poderia ser atribuída ao destinatário. Na argumentação, conectivos adversativos<br />
(“mas”, “entretanto”, “contudo”) contrariam uma posição anteriormente mencionada.<br />
Diferentemente do conectivo “mas”, que descarta prontamente o conteúdo da primeira<br />
oração, a conjunção argumentativa “embora” leva em consideração a informação expressa<br />
na primeira oração antes de descartá-la. Os termos gramaticais que pertencem<br />
à classe dos operadores concessivos (“embora”, “ainda que” etc.) estabelecem uma<br />
relação entre um fato P que deveria, em circunstâncias normais, ser causa para o fato<br />
Q. Embora P seja normalmente a causa de Q (P implica Q), o que se tem é não Q. Os<br />
períodos constituídos por conectivos como já que formam um enunciado único, em<br />
que o locutor explica um fato P, já conhecido/incontestável pelo alocutário a partir de<br />
um fato Q, conhecido ou não. O resultado é o estabelecimento de uma nova relação de<br />
causalidade a partir dos fatos P e Q. Conectivos como “que”, “pois”, “porque” articulam<br />
em um único enunciado dois atos enunciativos diferentes, em que o primeiro representa<br />
a tese e o segundo consiste no argumento. O elo semântico entre a tese do primeiro ato<br />
e o argumento do segundo ato estabelece uma relação de explicação, já que o segundo<br />
fornece a justificativa para o primeiro. Os termos gramaticais “logo”, “tão”, “tanto”, “tal...<br />
que” ligam argumentos a uma conclusão sem a necessidade de recorrer a implícitos<br />
<strong>TEXTOS</strong> <strong>DISSERTATIVO</strong>-<strong>ARGUMENTATIVOS</strong>: SUBSÍDIOS PARA QUALIFICAÇÃO DE AVALIADORES<br />
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