Tratado de Ética - Instituto de Humanidades
Tratado de Ética - Instituto de Humanidades
Tratado de Ética - Instituto de Humanidades
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
exemplo das imposições <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m legal, isto é, oriundas do direito. Santo Agostinho<br />
acreditava que a disposição do homem para a prática do bem <strong>de</strong>pendia da interveniência da<br />
graça divina, solução que parecera comprometedora da liberda<strong>de</strong> ou limitando-a à prática do<br />
mal. A hipótese jansenista, que tão funda impressão causou aos moralistas ingleses, e, em<br />
geral, nos países protestantes, é <strong>de</strong>sse último tipo. Lutero também a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u em De servo<br />
arbitrio (1525)<br />
Kant irá recolocar o tema da moralida<strong>de</strong> nos termos tradicionais, isto é,<br />
vinculando-o à noção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>. Ao fazê-lo <strong>de</strong>svincula inteiramente a moral individual da<br />
religião. E, <strong>de</strong>ste modo, cumpre-se o i<strong>de</strong>al contido na proposta <strong>de</strong> Bayle.<br />
b) A solução kantiana do problema da liberda<strong>de</strong><br />
Immanuel Kant (l724/1804) é o filósofo que coroou o processo <strong>de</strong> dissociação<br />
entre a Filosofia Mo<strong>de</strong>rna e a Filosofia Antiga, ao elaborar uma nova perspectiva filosófica.<br />
A Filosofia Antiga nutria-se da suposição <strong>de</strong> que as aparências (o que aparece) se<br />
sustenta numa realida<strong>de</strong> que está oculta, realida<strong>de</strong> a que Aristóteles chamou <strong>de</strong> substância.<br />
Aspirando a se constituir num saber permanente, a filosofia há <strong>de</strong> ser um discurso sobre a<br />
substância. Kant formulará um postulado diametralmente oposto: só temos acesso ao<br />
fenômeno (o que aparece), sendo-nos inteiramente <strong>de</strong>sconhecidas e inacessíveis as coisas<br />
como seriam em si mesmas. A principal conseqüência <strong>de</strong> semelhante colocação cifra-se em<br />
que os temas clássicos da metafísica são abandonados. A razão é impotente para <strong>de</strong>cidir se a<br />
alma sobrevive ou não após a morte; se o mundo é finito ou infinito ou se Deus existe ou não.<br />
As discussões clássicas <strong>de</strong>sses temas somente conduziram a paralogismos, antinomias e a<br />
razão a ultrapassar os seus limites. Em conseqüência, a metafísica dogmática, isto é, praticada<br />
nos mol<strong>de</strong>s antigos, é impossível.<br />
Ao mesmo tempo, Kant acreditava na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma nova metafísica. Seu<br />
primeiro patamar correspon<strong>de</strong>ria ao que contemporaneamente <strong>de</strong>nominaríamos <strong>de</strong> filosofia<br />
das ciências (teoria do conhecimento ou epistemologia). Na Crítica da Razão Pura, publicada<br />
em 1781, quando o autor já contava 57 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, estabelece a diferença entre filosofia e<br />
ciência e <strong>de</strong>monstra que esta última requer meditação <strong>de</strong> cunho filosófico para encontrar os<br />
próprios fundamentos.<br />
A nova metafísica não limitaria seu objeto ao conhecimento científico. Existem<br />
muitas outras questões que não po<strong>de</strong>m ser equacionadas segundo o mo<strong>de</strong>lo da ciência, isto é,<br />
pelo encontro <strong>de</strong> soluções <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> universal. Entre estas, Kant <strong>de</strong>stacou, em especial, a<br />
religião e a moral.<br />
Não seria esta a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> examinar as questões que Kant legou à<br />
posterida<strong>de</strong> e que tiveram o mérito <strong>de</strong> fecundar a filosofia oci<strong>de</strong>ntal em duas oportunida<strong>de</strong>s, a<br />
primeira dando surgimento ao chamado i<strong>de</strong>alismo clássico alemão, em seguida à sua morte, e,<br />
nas últimas décadas do século passado, ao neokantismo, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> provém a parcela<br />
fundamental da filosofia contemporânea. Importa aqui examinar a maneira como solucionou o<br />
problema teórico da liberda<strong>de</strong>, ensejando a completa separação entre moral e religião.<br />
Ao tema Kant <strong>de</strong>dicou três livros: Fundamentação da Metafísica dos Costumes<br />
(1785); Crítica da Razão Prática (1788) e Doutrina da Virtu<strong>de</strong> (1797). A primeira contém os<br />
121