17.04.2013 Views

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

esgotam, no plano psicológico, remetendo, a seu ver, a uma experiência metafísica que o<br />

sentimento como tal é impotente para expressar.<br />

Quando nos <strong>de</strong>paramos com o fato religioso, uma tendência natural ao espírito<br />

humano consiste em torná-lo compreensível. “Para toda idéia teísta <strong>de</strong> Deus, mas muito<br />

especialmente para a cristã – frisa Rudolf Otto – é essencial que a divinda<strong>de</strong> seja concebida e<br />

<strong>de</strong>signada com rigorosa precisão por predicados tais como espírito, razão, vonta<strong>de</strong>, vonta<strong>de</strong><br />

inteligente, boa vonta<strong>de</strong>, onipotência, unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> substancia, sabedoria e outros semelhantes;<br />

quer dizer, por predicados que correspondam aos elementos pessoais e racionais que o homem<br />

possui em si mesmo, ainda que em forma mais limitada e restrita Ao mesmo tempo, todos<br />

esses predicados são, na idéia do divino, pensados como absolutos; ou seja, como perfeitos e<br />

supremos (...)". Justamente o que nos permite apreen<strong>de</strong>r o fato religioso como algo mais que<br />

puro sentimento é a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formularmos, <strong>de</strong>le, idéias claras e distintas. Esse é, aliás,<br />

um dos distintivos <strong>de</strong> religiões como o cristianismo.<br />

Mas, ao mesmo tempo, <strong>de</strong>vemos chamar a atenção para um outro aspecto<br />

fundamental: se, por um lado, captamos em conceitos claros o fato religioso, a experiência do<br />

transcen<strong>de</strong>nte, não há dúvida, por outro <strong>de</strong> que eles não esgotam a essência da divinda<strong>de</strong>. Há<br />

uma como que ina<strong>de</strong>quação fundamental entre o conceito e aquilo que preten<strong>de</strong> ser<br />

significado através <strong>de</strong>le: Deus não é (somente) aquilo que falamos <strong>de</strong>le. Os nossos predicados<br />

acerca da divinda<strong>de</strong> seriam, assim, essenciais sintéticos, ou seja, como frisa Rudolf Otto, “(...)<br />

predicados atribuídos a um objeto que os recebe e sustenta, mas que não é compreendido por<br />

eles nem po<strong>de</strong> sê-lo, mas que, ao contrário, <strong>de</strong>ve ser compreendido <strong>de</strong> outra maneira distinta e<br />

peculiar (...).<br />

O erro do racionalismo consiste, no terreno da religião, em ter substituído os<br />

conceitos com que nos aproximamos do absoluto, por outros que não são privativos da esfera<br />

religiosa, mas que pertencem, também, "à esfera natural das representações humanas".<br />

Preten<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong>itar luz sobre a essência da religião, os racionalistas terminam por inviabilizála,<br />

<strong>de</strong>spindo do seu caráter emocional e supra-racional. Certamente, quando os adversários da<br />

religião frisam que a "agitação mística nada tem a ver com a razão, prestam um maior serviço<br />

àquela, do que o prestado pelos seus pretensos <strong>de</strong>fensores, os racionalistas. "(...) Tomara – diz<br />

Rudolf Otto – "que seja um saudável estímulo o observar que a religião não se reduz a<br />

enunciados racionais (...)<br />

O estudo da base vivencial do fato religioso envereda necessariamente pelo<br />

caminho do conhecimento do sagrado. Po<strong>de</strong>ríamos, em primeiro lugar, fazer uma <strong>de</strong>finição<br />

<strong>de</strong>scritiva <strong>de</strong>sse termo. “O sagrado é – frisa Rudolf Otto – uma categoria explicativa e<br />

valorativa que, como tal, se apresenta e nasce exclusivamente na esfera religiosa. É certo que<br />

interfere em outras, por exemplo, na ética; mas não proce<strong>de</strong> <strong>de</strong> nenhuma É complexa, e entre<br />

os seus diversos componentes contém um elemento específico, singular, que escapa à razão<br />

(...) e que é árreton, inefável; ou seja, completarnente inacessível à compreensão por<br />

conceitos (como em terreno diferente ocorre com o belo)”.<br />

Na tentativa em prol <strong>de</strong> chegar à essência da categoria do sagrado, é necessário<br />

que o separemos do seu componente moral, bem como <strong>de</strong> qualquer outro componente<br />

racional. A essência da categoria do sagrado seria, para Rudolf Otto, o numinoso. Trata-se <strong>de</strong><br />

uma categoria peculiar, explicativa e valorativa, que vai acompanhada <strong>de</strong> uma disposição<br />

numinosa <strong>de</strong> ânimo, não passível <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição, mas apenas <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrição, compreensível<br />

indiretamente, mediante sugestões aproximadas que se apresentam ao espírito, <strong>de</strong> forma a<br />

permitir que emerja nele a vivência característica do sagrado, num misto <strong>de</strong> terror-admiração.<br />

171

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!