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Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

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sucessão no tempo <strong>de</strong> dois processos consecutivos, que, em virtu<strong>de</strong> da intermediação da<br />

categoria, apresentam-se a nós na relação <strong>de</strong> causa e efeito".<br />

Rudolf Otto i<strong>de</strong>ntifica a idéia do sagrado – associada aos racional e irracional que<br />

a acompanham em todas as religiões elevadas – com a ocorrência <strong>de</strong> um esquema autêntico,<br />

que se diferencia <strong>de</strong> uma simples associação por semelhança, pelo fato <strong>de</strong> que não se <strong>de</strong>sfaz<br />

no seio do processo religioso, mas ao contrário, se vê confirmado por ele. A forma toda<br />

peculiar em que o racional e o irracional se interpenetram na idéia do sagrado, po<strong>de</strong> ser<br />

explicada a partir <strong>de</strong> um exemplo bastante conhecido: a criativa interpenetração, na esfera do<br />

erótico, do aspecto irracional (instinto sexual) e do sentimento geral humano, a inclinação ou<br />

simpatia A respeito, frisa Rudolf Otto: "(...) Quando o instinto da espécie transcen<strong>de</strong> a vida<br />

instintiva e irrompe na esfera dos altos sentimentos humanos e grava a sua marca nos <strong>de</strong>sejos,<br />

apetites e aspirações, na poesia, nas imagens da fantasia, gera-se a esfera própria do erótico".<br />

O erótico exprime-se, geralmente, com as mesmas expressões o que usamos na restante vida<br />

sentimental. Uma criança, referindo-se ao seu pai, diz "me ama"; uma moça, referindo-se ao<br />

seu amante, diz, igualmente, "me ama ". A diferença entre as duas manifestações está,<br />

justamente, nos meios auxiliares que ro<strong>de</strong>iam a palavra, como o tom <strong>de</strong> voz, o jeito, a mímica,<br />

os quais, ao serem esquematizados na esfera do erótico, per<strong>de</strong>m a ‘inocência’ da manifestação<br />

infantil. De forma semelhante, na esfera religiosa ocorre a esquematização dos elementos<br />

racionais e dos irracionais ao redor da idéia do sagrado, quando por exemplo dizemos às<br />

crianças, fazendo referência aos pais, ou quando dizemos ao homem, fazendo referência a<br />

Deus: “Devemos amá-lo, temê-lo, confiar nele". Nos caso, frisa Rudolf Otto, (...) os conceitos<br />

estão empapados <strong>de</strong> uma significação que somente percebe, enten<strong>de</strong> e nota o <strong>de</strong>voto a quem<br />

‘ensina o espírito’. O terror <strong>de</strong> Deus é semelhante ao respeito da criança face ao pai; mas, ao<br />

mesmo tempo, é algo mais do que isso, não só em quantida<strong>de</strong>, mas em qualida<strong>de</strong> (... )".<br />

Rudolf Otto trata em seguida dos meios <strong>de</strong> expressão do numinoso. O meio direto<br />

mais importante é o texto sagrado, o que, a seu ver, faz sobressair a importância da liturgia do<br />

sagrado. Há também meios indiretos: o terrível, o sublime e o misterioso. E, ainda, os meios<br />

artísticos. Escreve, a esse propósito:, "(...) a música emu<strong>de</strong>ce, e emu<strong>de</strong>ce por longo tempo e<br />

por completo, <strong>de</strong> sorte que o silêncio mesmo se ouve, por assim dizer (...)". Sob esse ângulo<br />

po<strong>de</strong>ríamos analisar a música <strong>de</strong> Bach (Missa em si menor), <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>lssohn (Música para o<br />

Salmo II, versículo 2: "Servi ao Onipotente com medo, e alegrai-vos com tremor', Tomás Luiz<br />

(Música do "Popule meus" interpretada pelo Madrigal-Chor <strong>de</strong> Berlim), etc. Nesses autores, a<br />

inenarrabilida<strong>de</strong> do numinoso é expressa mediante o silêncio, como para significar que<br />

perante o “absolutamente heterogêneo” tudo cala. A imensidão do silêncio expressa,<br />

negativamente, a terrível gran<strong>de</strong>za do sagrado”. O sagrado vê-se, <strong>de</strong> igual modo, submetido a<br />

processo <strong>de</strong> racionalização. Eis a forma em que, segundo Rudolf Otto, acontece essa<br />

evolução: “(...) nos domínios mais diversos da história da religião po<strong>de</strong>-se seguir esse<br />

processo em todas as suas fases. Po<strong>de</strong>-se afirmar que o numinoso atrai para si e assimila<br />

sempre os pensamentos que formam o i<strong>de</strong>al das socieda<strong>de</strong>s e dos indivíduos sobre o<br />

obrigatório, o legal, o bom. Esses i<strong>de</strong>ais convertem-se na ‘vonta<strong>de</strong>’ do numen, que ao mesmo<br />

tempo se tornam o seu guarda, or<strong>de</strong>nador e fundador. E cada vez se inserem com mais força<br />

nele e o moralizam. O sagrado se faz bom e, por isso, o bom se faz sagrado, sacrossanto, até<br />

que ambos os elementos se juntam em fusão já indissolúvel, e então constitui-se o sentido<br />

cabal e complexo do sagrado, que ao mesmo tempo é bom e sacrossanto. O mais<br />

característico da religião do antigo Israel, ao menos a partir <strong>de</strong> Amos, é justamente a íntima<br />

reunião <strong>de</strong> ambos os elementos. Deus nenhum é como o Deus <strong>de</strong> Israel. Pois ele é o sagrado<br />

absoluto. Mas, <strong>de</strong> outro lado, nenhuma lei é como a lei <strong>de</strong> Jahveh, porque ela não é<br />

simplesmente boa, mas também ‘sagrada’”.<br />

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