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Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

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conteúdo da ação <strong>de</strong> que se trata. Po<strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>r a um pensamento (sua explicitação<br />

discursiva), uma representação ou a percepções possíveis. Assim, qualquer que seja a forma<br />

como venhamos a concebê-lo (ou expressá-la), trata-se <strong>de</strong> algo a ser realizado, pouco importa<br />

por que meio ou agente.<br />

Avança ainda a seguinte precisão conceitual: “O conteúdo do objetivo não implica<br />

por si mesmo qualquer relação com o futuro. Uma obra real po<strong>de</strong> “ter” ela também um<br />

objetivo. ... De todos os modos, contudo, é necessário que o conteúdo <strong>de</strong> um objetivo seja<br />

dado, dizendo respeito a um <strong>de</strong>ver-ser i<strong>de</strong>al. O que não significa que se oponha a um dado<br />

realizado mas antes a todos os conteúdos que, sendo estranhos ao domínio do <strong>de</strong>ver-ser ou do<br />

<strong>de</strong>ver-não-ser, são simplesmente consi<strong>de</strong>rados como objetivos que existem ou não. O que<br />

permite a aplicação do conceito <strong>de</strong> objetivo é, pois, sempre o fundamentalmente, o fato <strong>de</strong> que<br />

“qualquer coisa <strong>de</strong>ve ser” ou que “qualquer coisa não <strong>de</strong>ve ser”; por conseguinte, uma<br />

estrutura <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver-ser”. E, logo adiante, “A questão torna-se clara se consi<strong>de</strong>rarmos o fato <strong>de</strong><br />

que só e exclusivamente a um nível <strong>de</strong>terminado <strong>de</strong> nossa vida aprece o objetivo” (p. 55).<br />

Em contrapartida, a tendência correspon<strong>de</strong> a “qualquer coisa que nos possui<br />

internamente”. O movimento ten<strong>de</strong>ncial expressa-se <strong>de</strong> chofre, <strong>de</strong> modo simples; tratar-se-ia,<br />

portanto, <strong>de</strong> um impulso. Scheler diz logo que não <strong>de</strong>ve ser i<strong>de</strong>ntificado com o sentimento <strong>de</strong><br />

repulsa em face <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado estado. Neste caso, a repulsa correspon<strong>de</strong>ria ao objeto<br />

contra o qual se dirige a tendência. E mais, a tendência acha-se direcionada a um valor,<br />

restando, a seu ver, “perguntar como e <strong>de</strong> que maneira o valor ou os fatores axiológicos são<br />

imanentes à tendência”. E aqui chega-se à tese central: “Os valores nos são imediatamente<br />

dados na percepção afetiva” (p. 58).<br />

Scheler acha que a i<strong>de</strong>ntificação do prazer com o egoísmo correspon<strong>de</strong><br />

simplesmente a um preconceito, no qual incidiria o próprio Kant. A experiência do prazer da<br />

vivência <strong>de</strong> um valor é, segundo afirma, também um valor, embora possa tratar-se não apenas<br />

<strong>de</strong> um valor positivo mas igualmente <strong>de</strong> um valor negativo. Com esse tipo <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>ração,<br />

propõe-se recusar a longa tradição <strong>de</strong> criticar a chamada “moral dos sentimentos”, que<br />

constitui aliás uma das gran<strong>de</strong>s tradições anglo-saxônicas, (3) da qual o pensamento alemão<br />

achar-se-ia distanciada, registramos <strong>de</strong> nossa parte.<br />

A esse propósito, Scheler enaltece Aristóteles nestes precisos termos: ao contrário<br />

da filosofia mo<strong>de</strong>rna, Aristóteles “consi<strong>de</strong>ra que o homem natural ten<strong>de</strong> a bens <strong>de</strong>terminados<br />

que são coisas, por exemplo, a posse, a honraria, a glória, etc., mas precisamente nessa<br />

“loucura” do homem natural estaria o mais alto valor – idêntico aqui ao sumum bonum –, isto<br />

é, justamente o prazer que proporcionaria a posse, a honra ou a glória, e não estes bens eles<br />

mesmos; <strong>de</strong> sorte que somente o sábio, capaz <strong>de</strong> discernir este valor, esforça-se por<br />

<strong>de</strong>spren<strong>de</strong>r-se <strong>de</strong>sta ilusão natural, que nos faz preferir as coisas ao prazer que nos causa” (p.<br />

59). Haveria assim um hedonismo autêntico.<br />

Desbravado assim o caminho para admitir que a apreensão do valor possa estar<br />

associada ao sentimento (à afetivida<strong>de</strong>), faltaria indicar como po<strong>de</strong> ocorrer que a ética, que é<br />

por <strong>de</strong>finição um tipo <strong>de</strong> conhecimento que requer ser rigorosamente formalizado, possa<br />

provir da experiência, ou como diria Scheler, possa existir uma “ética material”.<br />

(3) Como tivemos oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> indicar na Parte I <strong>de</strong>ste livro, Hume repousa o cumprimento da lei oral num<br />

sentimento, <strong>de</strong> origem instintiva, que inclinaria o homem a preferir contar com a simpatia do meio em que vive.<br />

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