Tratado de Ética - Instituto de Humanidades
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compararmos sempre àquele i<strong>de</strong>al (que equipara ao "sábio estóico") –, instaura o conflito no<br />
próprio âmago da experiência moral individual, que, <strong>de</strong>ste modo, não se limita ao plano<br />
social.<br />
Não correspon<strong>de</strong>, portanto, a nenhuma aberração o fato <strong>de</strong> que as particulares<br />
tradições culturais dos povo – naturalmente tenho em vista aqueles que, como o nosso,<br />
inserem-se no interior da cultura oci<strong>de</strong>ntal – introduzam, adicionalmente, outros conflitos <strong>de</strong><br />
valores. Mais das vezes, resultam do fato <strong>de</strong> que uma nova tradição não revoga<br />
automaticamente as prece<strong>de</strong>ntes.<br />
Tomemos o caso brasileiro.<br />
As pesquisas <strong>de</strong>senvolvidas até o presente (12) sugerem que nossa moralida<strong>de</strong><br />
social básica seja contrareformista, isto é, proceda <strong>de</strong> valores cultuados no ciclo histórico<br />
prece<strong>de</strong>nte à sacieda<strong>de</strong> industrial, tendo, adiante, se fundido com outras tradições igualmente<br />
oriundas <strong>de</strong> Portugal, a primeira muito mais antiga – a patrimonialista – e, a segunda –<br />
cientificista – estruturada no período pombalino. A tradição mo<strong>de</strong>rna, também presente entre<br />
nós, não conseguiu eliminar as outras, obrigando a uma opção que se encontra no cerne da<br />
nossa cultura. Assim, a experiência moral reveste-se <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> singularida<strong>de</strong>.<br />
Po<strong>de</strong> a escolha provir exclusivamente <strong>de</strong> elocubrações racionais? Creio que as<br />
análises prece<strong>de</strong>ntemente referidas, <strong>de</strong>vidas a gran<strong>de</strong>s mestres do porte <strong>de</strong> Scheler ou<br />
Gurvitch, permitem-nos respon<strong>de</strong>r negativamente. A a<strong>de</strong>são a esse ou aquele valor equivale a<br />
uma escolha, geralmente exclu<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> outra, envolvendo uma componente irracional <strong>de</strong><br />
difícil <strong>de</strong>terminação. Como a pessoa humana é uma totalida<strong>de</strong> e não po<strong>de</strong> haver ciência <strong>de</strong><br />
totalida<strong>de</strong>s – sendo obrigatório que a ciência circunscreva e <strong>de</strong>limite rigorosamente seu objeto<br />
– , trata-se <strong>de</strong> um problema que jamais encontrará uma resposta <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> universal (isto é,<br />
cientifica).<br />
A suposição <strong>de</strong> que a filosofia não possa conviver com o mistério é uma violação<br />
<strong>de</strong> ensinamento básico dos gregos – justamente os criadores da disciplina –, estando a história<br />
cheia <strong>de</strong> exemplos das calamida<strong>de</strong>s que a onipotência da razão po<strong>de</strong> proporcionar.<br />
(12) Procurei resumi-las no texto Roteiro para estudo e pesquisa da problemática moral na cultura brasileira,<br />
Londrina, Editora UEL, 1996.<br />
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