17.04.2013 Views

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

apontando na direção <strong>de</strong> um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> pessoa humana. Eis porque a moral kantiana é um ponto<br />

alto no <strong>de</strong>senvolvimento da moral do Oci<strong>de</strong>nte. Para aproximar-se <strong>de</strong>sse i<strong>de</strong>al o homem não<br />

ce<strong>de</strong>rá às suas inclinações. A sua liberda<strong>de</strong> residirá na escolha da lei moral. E, quanto à<br />

distinção básica entre idéia e i<strong>de</strong>al e o papel que este último <strong>de</strong>sempenha na vida dos homens,<br />

o próprio Kant tivera oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> advertir:<br />

"A virtu<strong>de</strong> e, com ela, a sabedoria humana, em toda a sua pureza são idéias. Mas o<br />

sábio {do estóico) é um i<strong>de</strong>al, isto é, um homem que não existe senão no pensamento, mas<br />

que correspon<strong>de</strong> plenamente à idéia <strong>de</strong> sabedoria. Assim como a idéia faculta a regra, o i<strong>de</strong>al<br />

serve, <strong>de</strong> modo semelhante, <strong>de</strong> protótipo à <strong>de</strong>terminação completa da cópia e nós não temos,<br />

para julgar nossas ações, outra regra senão a conduta <strong>de</strong>ste homem divino que conduzimos em<br />

nós e ao qual nos comparamos para nos julgar c também para nos corrigir, mas sem po<strong>de</strong>r<br />

jamais alcançar a perfeição.” (8)<br />

Ora, na exposição <strong>de</strong> Hegel não aparece nada disto. Há naturalmente o problema<br />

da Crítica da Razão Prática on<strong>de</strong> Kant, ce<strong>de</strong>ndo à intenção sistemática, procurou apresentar o<br />

caminho percorrido na Fundamentação segundo o esquema adotado na Crítica da Razão<br />

Pura. Trata-se <strong>de</strong> um empreendimento mal sucedido, porquanto, no caso da razão prática, não<br />

parece caber uma Analítica nem uma Dialética, como ocorre na obra prece<strong>de</strong>nte. O próprio<br />

Kant parece tê-lo reconhecido ao dar curso ao projeto anunciado na Fundamentação <strong>de</strong><br />

publicar a Metafísica dos Costumes, <strong>de</strong> que se <strong>de</strong>sincumbe, no caso da moral, com a Doutrina<br />

da Virtu<strong>de</strong> (1797), obra que tampouco é mencionada na crítica hegeliana.<br />

Ainda assim, não cabe dar aos postulados sentido diverso daquele <strong>de</strong> que se<br />

revestem. Na obra em questão, o próprio Kant formula esta pergunta:<br />

"Como é possível conceber uma extensão da razão pura do ponto <strong>de</strong> vista prático,<br />

que não seja ao mesmo tempo uma extensão <strong>de</strong> seu conhecimento no plano especulativo?"<br />

E respon<strong>de</strong> afirmando, entre outras coisas:<br />

"Esta extensão da razão teórica não é uma extensão da especulação <strong>de</strong> forma a<br />

autorizar doravante um uso positivo do ponto <strong>de</strong> vista teórico. Com efeito, como a razão<br />

prática nada faz além <strong>de</strong> mostrar que estes conceitos são reais e que têm realmente seus<br />

objetivos (possíveis), mas como nada em matéria <strong>de</strong> intuição <strong>de</strong>sses objetos nos é dado (o que<br />

não po<strong>de</strong> efetivamente ocorrer), nenhuma proposição sintética é possível <strong>de</strong> fato <strong>de</strong>sta<br />

realida<strong>de</strong> que lhe é reconhecida. Por conseguinte, esta revelação não nos ajuda em nada para<br />

exten<strong>de</strong>r nosso conhecimento do ponto <strong>de</strong> vista especulativo. ... As três idéias da razão<br />

especulativa ... não são em si mesmas conhecimentos..." (9)<br />

Em suma, a <strong>de</strong>marche não autoriza nenhuma restauração da metafísica dogmática<br />

para reintroduzir as discussões clássicas em tomo da finitu<strong>de</strong> ou infinitu<strong>de</strong> do mundo; a<br />

sobrevivência da alma e a existência <strong>de</strong> Deus. A filosofia crítica continua exercitando-se<br />

apenas no que respeita aos fundamentos da ciência e à cultura, que são criações humanas,<br />

estando portanto nos limites da experiência possível. E óbvio que, para chegar a tal resultado,<br />

não se vê qual a utilida<strong>de</strong> da Crítica da Razão Prática.<br />

(8) Crítica da Razão Pura. Trad. francesa, Paris, PUF, 2ª ed., 1950, p. 413/414.<br />

(9) Crítica da Razão Prática. Trad. francesa <strong>de</strong> F. Alquié in Oeuvres philosophiques (col. Pléia<strong>de</strong>), Paris,<br />

Gallimard, 1985, vol. II, p. 772.<br />

130

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!