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Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

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A vida religiosa <strong>de</strong>ve ser julgada apenas pelos resultados. Contudo, o estudo<br />

existencial <strong>de</strong> suas condições tem este mérito: "A massa <strong>de</strong> fenômenos colaterais, mórbidos<br />

ou sãos, com que precisamos cotejar os vários fenômenos religiosos, para melhor<br />

compreendê-los, forma o que a gíria psicológica <strong>de</strong>nomina <strong>de</strong> "massa aperceptiva", pela qual<br />

os compreen<strong>de</strong>mos". James supõe que a singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua análise resi<strong>de</strong> precisamente na<br />

amplitu<strong>de</strong> da massa aperceptiva que mobiliza. Com efeito, é <strong>de</strong>veras imensa a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

relatos em cuja análise se <strong>de</strong>tém.<br />

Classifica essas experiências em alguns grupos, iniciando por aquele que retrata<br />

equilíbrio mental e postura otimista, confrontado ao estado típico <strong>de</strong> morbi<strong>de</strong>z e melancolia.<br />

James consi<strong>de</strong>ra que a busca da felicida<strong>de</strong>, em geral, consiste numa das principais<br />

preocupações dos homens. Por isto mesmo não <strong>de</strong>ve surpreen<strong>de</strong>r que muitos entendam que a<br />

felicida<strong>de</strong>, proporcionada por <strong>de</strong>terminada crença religiosa, constitui prova suficiente <strong>de</strong> sua<br />

verda<strong>de</strong>. Arrola nessa categoria diversos movimentos religiosos verificados nos Estados<br />

Unidos, entre estes o luterano e o weslyano. O seu traço característico seria a total entrega, <strong>de</strong><br />

que resulta alteração instantânea. Afirma tratar-se <strong>de</strong> "forma fundamental da experiência<br />

humana, qualquer que seja a sua significação final." Descreve-a <strong>de</strong>ste modo: "Passivida<strong>de</strong>,<br />

não-ativida<strong>de</strong>, relaxação, não-concentração, será agora a regra. Desista do sentimento <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong>, solte o que está segurando, confie o cuidado do seu <strong>de</strong>stino a po<strong>de</strong>res mais<br />

altos, seja genuinamente indiferente ao que será feito <strong>de</strong> tudo, e <strong>de</strong>scobrirá não só que ganhou<br />

um perfeito alívio interior, mas muitas vezes também, <strong>de</strong> quebra, os próprios bens aos quais<br />

supunha estar renunciando. Esta é a salvação através do <strong>de</strong>sespero, o morrer para nascer <strong>de</strong><br />

verda<strong>de</strong> da teologia luterana, a passagem para o nada ... Para chegar a isto, faz-se mister,<br />

quase sempre, ultrapassar um ponto critico, virar uma esquina <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> nós mesmos. Há que<br />

ce<strong>de</strong>r alguma coisa, uma dureza nativa <strong>de</strong>ve quebrar-se e liquefazer-se; e esse acontecimento<br />

... não raro, e repentino e automático, e <strong>de</strong>ixa no sujeito uma impressão <strong>de</strong> ter sido manejado<br />

por um po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> fora."<br />

Enten<strong>de</strong> naturalmente que certo tipo <strong>de</strong> temperamento há <strong>de</strong> predispor à<br />

experiência <strong>de</strong>scrita. De todos os modos, encaminha os que a vivenciaram a enxergar o lado<br />

bom das coisas. Entretanto, o temperamento contrário também tem o seu papel.<br />

O temperamento equilibrado apresenta uma incapacida<strong>de</strong> constitucional para o<br />

sofrimento prolongado, a tendência para ver as coisas por um prisma otimista. Parece-lhe que<br />

o mal é uma doença e preocupar-se com isto não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma forma <strong>de</strong> enfermida<strong>de</strong>, que<br />

só contribui para agravá-la. Examina a repercussão <strong>de</strong> tal entendimento na filosofia e na<br />

teologia, notadamente a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta última em explicar a origem do mal.<br />

James não procura obscurecer que a melancolia corresponda a uma situação<br />

patológica e examina as suas gradações, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um sentimento alegre à<br />

angústia positiva e ativa. Entre as experiências que <strong>de</strong>screve encontra-se o relato que Tolstoi<br />

nos legou, no livro Minha confissão, do estado <strong>de</strong> espírito que o levou ás suas convicções<br />

religiosas. Depois <strong>de</strong> passar em revista os casos expressivos, assinala que, em nenhum <strong>de</strong>les,<br />

havia "qualquer insanida<strong>de</strong> intelectual ou ilusão a respeito dos fatos".<br />

Acrescenta que a melancolia realmente insana, com suas alucinações e ilusões,<br />

nos levaria a tomar contato com "o <strong>de</strong>sespero absoluto". A presença <strong>de</strong>ste, parece-lhe,<br />

assegura a sobrevivência <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas espécies <strong>de</strong> religiões, como escreve: "Nem o<br />

conceito nem a percepção intelectual do mal, senão a sensação pavorosa, enregelante,<br />

paralisante, <strong>de</strong> estar ali em contato com ele, sem que nenhuma outra idéia ou sensação possa<br />

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