17.04.2013 Views

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

PARTE II – SURGIMENTO DA MORAL SOCIAL E PROBLEMA TEÓRICO<br />

SUSCITADO PARA A ÉTICA<br />

INTRODUÇÃO<br />

Nesta oportunida<strong>de</strong>, estamos nos propondo examinar o processo segundo o qual a<br />

meditação sobre a moral ganha autonomia em relação às outras esferas do saber.<br />

No pensamento grego, a ética esteve subordinada à política, na forma especial<br />

como a esta última <strong>de</strong>finia, isto é, tendo por missão contribuir no sentido <strong>de</strong> que a cida<strong>de</strong><br />

pu<strong>de</strong>sse “realizar uma vida perfeita e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte” (Aristóteles). Na <strong>Ética</strong> a Nicômaco<br />

política e ética estão <strong>de</strong> certa forma superpostas, confundindo-se o objeto <strong>de</strong> ambas porquanto<br />

a segunda trata das virtu<strong>de</strong>s e dos meios <strong>de</strong> adquiri-las, sendo condição da felicida<strong>de</strong>, que, por<br />

sua vez, é o objetivo visado pela cida<strong>de</strong>.<br />

Na interpretação realizada pela Escolástica, notadamente em São Tomás, o<br />

objetivo <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser a felicida<strong>de</strong> terrena. Em seu lugar aparece a bem-aventurança, a<br />

felicida<strong>de</strong> eterna, cujo ápice seria a contemplação <strong>de</strong> Deus. Como adverte René Antoine<br />

Gauthier, a ética é <strong>de</strong> fato absorvida pela teologia.<br />

O empenho <strong>de</strong> autonomizar a meditação acerca da moralida<strong>de</strong> ocorre na Época<br />

Mo<strong>de</strong>rna. Inicia-se com a proposição <strong>de</strong> Pierre Bayle (1647/1701), no sentido <strong>de</strong> tornar a<br />

moral in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da religião. Não se buscou, então, dissociar a meditação aristotélica da<br />

interpretação escolástica, partindo-se diretamente <strong>de</strong>sta última. A i<strong>de</strong>ntificação é<br />

improce<strong>de</strong>nte – o que, entretanto, só foi reconhecido muito mais tar<strong>de</strong>. Em que pese a<br />

circunstância, não po<strong>de</strong>ríamos nos dispensar <strong>de</strong> fazê-lo.<br />

O momento seguinte a Bayle consiste no gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>bate teórico realizado na<br />

Inglaterra em que intervêm, entre outros, Bernard Man<strong>de</strong>ville (1670/1733), Anthony Ashley<br />

Cooper, 3º con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Shafsterbury (1671/1713), Joseph Butler, bispo <strong>de</strong> Durham (1692/1752)<br />

e David Hume (1711/1776). Ao longo <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>bate tem nascimento a moral social<br />

propriamente dita, isto é, <strong>de</strong> tipo consensual.<br />

Ainda assim, na meditação inglesa consi<strong>de</strong>rada, a moralida<strong>de</strong> individual aparece<br />

como indissociável da religião, não se tendo realizado plenamente o projeto <strong>de</strong> Bayle. Aqui<br />

precisamente se insere a solução kantiana, em especial a que aparece na Fundamentação da<br />

Metafísica dos Costumes (1785). Conclui-se o ciclo em que a ética encontra o seu lugar<br />

autônomo no conjunto do saber.<br />

A rigor, a nossa investigação <strong>de</strong>veria encerrar-se nesse ponto. Contudo, a solução<br />

kantiana mereceria uma complementação digna <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada, <strong>de</strong>vida a Max Weber<br />

(1864/1920), que a <strong>de</strong>nominou <strong>de</strong> ética <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>.<br />

Portanto o objeto <strong>de</strong>sta Parte II compreen<strong>de</strong> a herança grega na interpretação<br />

escolástica e os momentos mencionados, a saber: a hipótese <strong>de</strong> Bayle; o encaminhamento da<br />

discussão por Man<strong>de</strong>ville e Shafsterbury e seu amadurecimento em Butler e Hume; a solução<br />

ensejada por Kant e, finalmente, as sugestões <strong>de</strong> Max Weber como corolário do <strong>de</strong>bate<br />

prece<strong>de</strong>nte. Pareceu-nos imprescindível abordar a crítica <strong>de</strong> Hegel à ética kantiana, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

69

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!