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Tratado de Ética - Instituto de Humanidades

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) Primazia da bem-aventurança sobre a felicida<strong>de</strong><br />

Seria ocioso proce<strong>de</strong>r ao exame circunstanciado da interpretação escolástica da<br />

ética aristotélica quando o nosso propósito é enfatizar o aspecto contra o qual a Época<br />

Mo<strong>de</strong>rna começa a se rebelar.<br />

A subordinação da moralida<strong>de</strong> pública à Igreja – que era reivindicada durante a<br />

Ida<strong>de</strong> Média na Europa – tinha como contrapartida teórica a subordinação da ética à teologia.<br />

Mais precisamente, na interpretação <strong>de</strong> Aristóteles não se trata do simples comportamento<br />

moral dos homens mas da salvação da alma, que era o objetivo maior visado por aquela<br />

socieda<strong>de</strong>. Tal aspecto sobressai precisamente no modo <strong>de</strong> conceber e conceituar a felicida<strong>de</strong>.<br />

Manoel <strong>de</strong> Gois aborda o tema na 3ª Disputa. (11) Define a felicida<strong>de</strong> como sendo<br />

equivalente ao "Sumo bem do homem". Em que pese muito se tenha disputado sobre essa<br />

B<strong>de</strong>finição – tendo Santo Agostinho indicado que <strong>de</strong>terminado autor havia colecionado nada<br />

menos que 288 sentenças acerca da felicida<strong>de</strong> –, todos concordam com parte da <strong>de</strong>finição, isto<br />

é, <strong>de</strong> que consiste num bem. Resta saber <strong>de</strong> que tipo.<br />

São três os gêneros do bem, a saber: externos, do corpo e da alma. Os bens<br />

externos são sobretudo a riqueza, o po<strong>de</strong>r, a honra e a glória. A argumentação do autor cuida<br />

<strong>de</strong> comprovar que o sumo bem do homem não po<strong>de</strong> estar sujeito a algo <strong>de</strong> fortuito como a<br />

fortuna e, em geral, os bens exteriores.<br />

Os bens do corpo são principalmente os prazeres do sentido, a saú<strong>de</strong>, a formosura<br />

e a força. São quatro os argumentos do autor contra a opinião <strong>de</strong> que a felicida<strong>de</strong> consistiria<br />

nesse gênero <strong>de</strong> bem.<br />

Esquematicamente, o primeiro argumento invoca a <strong>de</strong>pendência em que o corpo<br />

se encontra da alma, não po<strong>de</strong>ndo dar-se a circunstância <strong>de</strong> que os fins do primeiro se<br />

sobreponham aos da segunda, sendo a verda<strong>de</strong> justamente o contrário. Em segundo lugar, o<br />

Sumo Bem do homem não po<strong>de</strong> ser comum aos homens e aos animais. Terceiro: muitos<br />

animais privados <strong>de</strong> razão exce<strong>de</strong>m os homens em bens do corpo (p. ex.: têm vida mais longa<br />

ou são mais robustos e mais velozes) e, por essa via, exce<strong>de</strong>riam ao homem na consecução<br />

daquele fim, o que é inadmissível. E, finalmente, os bens do corpo po<strong>de</strong>m encontrar-se<br />

simultaneamente com a <strong>de</strong>sonestida<strong>de</strong> e os vícios, enquanto "a suma felicida<strong>de</strong> exclui toda a<br />

afronta da <strong>de</strong>sonestida<strong>de</strong> e da miséria".<br />

A felicida<strong>de</strong> consistirá, pois, nos bens da alma. Em relação a esta, o autor<br />

distingue potências, hábitos e operações. A perfeição não po<strong>de</strong> consistir numa simples<br />

potência mas em ato. O hábito por sua vez é mais perfeito que o ato. Contudo, o fim do hábito<br />

é a operação. Assim, chega o autor à conclusão <strong>de</strong> que a felicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser buscada num<br />

<strong>de</strong>terminado tipo <strong>de</strong> operação.<br />

Permitimo-nos transcrever o texto integral da argumentação, a fim <strong>de</strong> que seja<br />

apreendida em sua plenitu<strong>de</strong>: (12)<br />

"Porém, para que ensinemos em que operação consiste a felicida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve advertirse<br />

que a felicida<strong>de</strong> é dupla – sobrenatural e natural. Cada uma <strong>de</strong>las se divi<strong>de</strong> ainda em duas:<br />

(11) Ed. do <strong>Instituto</strong> <strong>de</strong> Alta Cultura, cit., p. 105 a 136.<br />

(12) Ed. Cit., p. 123-125.<br />

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