A PREGAÇÃO NA IDADE MÍDIA - Luiz Carlos Ramos
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diferença, portanto [entre o sagrado e o profano]. Até a venda de CDs é<br />
do mesmo jeito. 826<br />
A homilética espetacular, conquanto trágica, deve, portanto, assegurar o prazer do es-<br />
pectador. Tal prazer consiste num “desafogo, num repouso, num modo de ocupar os laze-<br />
res” 827 . Isso implica em que a sensação, a emoção, o pathos, do público seja determinante<br />
para a construção do discurso.<br />
A homilética trágica deve, afinal, produzir o terror e a compaixão. Para obter esse re-<br />
sultado, afirma Aristóteles, “não se requer tanta arte e exige-se uma coregia [derivado da<br />
palavra “coro”] dispendiosa” 828 . Isso para incutir no espectador o temor e a compaixão. Te-<br />
mor a quê, e compaixão por quê, não cabe aqui discutir, mas basta sinalizar que, obviamen-<br />
te, só pode ser por algo alinhado aos interesses dos detentores dos poderes que sustentam os<br />
meios.<br />
Após a purgação das emoções, segue-se o estado de desafogo e repouso. Ao projetar<br />
suas ansiedades sobre os caracteres, as emoções e as ações apresentados pela homilética<br />
trágica espetacular, o espectador sublima sua própria realidade de terror e compaixão con-<br />
vertendo-a em temor e compaixão pela imitação da realidade, pela encenação do terror, pela<br />
representação da compaixão: temor e compaixão pela mídia.<br />
Sobre o papel da tragédia, Vilhena e Medeiros contrastam as idéias de Aristóteles com<br />
as de Hegel, e depois com as da mídia contemporânea, da seguinte forma: a katarsis, referi-<br />
da por Aristóteles, era possível porque possibilitava ao espectador o distanciamento reflexi-<br />
vo do trágico que está sendo representado pela mediação da arte cênica, a qual torna supor-<br />
tável o que no mundo real seria insuportável — pois trata-se de um relato criado para esse<br />
fim. Hegel, acrescenta a essa reflexão a preocupação com o elemento ético que entra em<br />
jogo na tragédia, pois “os personagens trágicos oferecem ao espectador um relato sobre a<br />
superação da condição humana, marcada por sua finitude” 829 . A purificação das emoções,<br />
conforme Aristóteles, e a superação das condições humanas limitadas, segundo Hegel, não<br />
826 SILVA, Vera. Religião na TV: manipulação psíquica. Observatório da Imprensa, qualidade na TV. Em<br />
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/qtv210220011.htm. Consulta em em 15.6.2005.<br />
827 ARISTÓTELES, [s.d.], p. 234.<br />
828 O corego, na na Grécia antiga, era o cidadão responsável pelo custeio e organização dos coros dramáticos<br />
e/ou pela direção dos coros e da música nas demais festas públicas. Cf. ARISTÓTELES, [s.d.], p. 260.<br />
829 Cf. VILHE<strong>NA</strong>, 2001.