A PREGAÇÃO NA IDADE MÍDIA - Luiz Carlos Ramos
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um duplo caminho: o do pensamento ascendente e o do pensamento descendente” — este<br />
serviço, o pregador o faz mediante o que ele chamou de Ankündignung, ou “anúncio de um<br />
acontecimento por vir” e Verkundung, ou “anúncio do que está acontecendo”. 250<br />
Karl Barth teria sido o primeiro a se referir às três formas da Palavra de Deus: prega-<br />
da (ou proclamada), escrita e revelada. Heinrich Vogel diz o mesmo com outra ordem: a<br />
Palavra que “aconteceu”, a Palavra que é “testemunhada” e a Palavra que é “proclamada”.<br />
Na analogia trinitária de Barth, cada forma da Palavra se relaciona com uma das pessoas da<br />
Trindade: Deus o Pai Criador com a Palavra revelada, Deus o Filho Reconciliador com a<br />
Palavra escrita e o Espírito Santo Redentor com a Palavra proclamada — essas três, no en-<br />
tanto, são uma única e só Palavra de Deus. 251 Portanto, Karl Barth eleva a prédica à catego-<br />
ria de Palavra de Deus, no mesmo nível da Palavra escrita e da Palavra revelada.<br />
Um novo elemento é acrescentado por Dietrich Ritschl, para quem o que há de especi-<br />
al com a prédica é que esta “oferece o que o mundo não pode oferecer”, na medida em que<br />
“cada sermão deve expressar a vontade graciosa de Deus em Cristo Jesus para estar em so-<br />
lidariedade com os pecadores” 252 . A novidade do pensamento de Ritschl está na compreen-<br />
são de que “nós [os pregadores] não convertemos os outros, mas temos que nos converter<br />
aos outros”. 253 Nesse sentido, a homilética, em lugar de se ocupar da oratória, deveria se<br />
ocupar de um tipo de escutatória, para que a prédica possa ser transformada pela cumplici-<br />
dade com a experiência (o “pecado”) da comunidade para a qual é pregada.<br />
Não faltam as concepções dicotomistas que não conseguem superar o entendimento<br />
preconceituoso de que teoria e prática são coisas distintas, também na prática homilética.<br />
Assim, para J. A. Jungmann, a diferença fundamental entre teologia e pregação está no fato<br />
de que a “teologia está antes de tudo a serviço do conhecimento” ao passo que “a pregação<br />
se orienta totalmente à vida” 254 . Na prática essa dicotomia não se sustenta, pois não há teo-<br />
logia que não seja um logos (discurso) à respeito das coisas de Deus (theos) e não há como<br />
a pregação estar “totalmente” voltada para a vida sem tocar os limites do sagrado, pois falar<br />
250<br />
Cf. BARTH, 2003, p. 15-16.<br />
251<br />
Cf. RITSCHL, Dietrich. A theology of proclamation. Rchmond: John Knox Press, 1960. p. 29.<br />
252<br />
Id., ibid., p. 13-23.<br />
253<br />
Id., ibid., p. 13-23.<br />
254<br />
GRASSO, Domenico. Teologia de la predicación. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1968. p. 35.<br />
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