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tade do curador e do historiador da arte. Para além dos gabinetes abarrotados<br />
e das salas recheadas de artefatos do chão ao teto do connoisseur<br />
e dos museus altamente tecnológicos do século XIX em outro extremo,<br />
deparamo-nos nesse lugar com objetos que se relacionam em processos,<br />
numa relação de tensão. Tensionados entre a vontade de identificação e<br />
imposição de alteração, purificação e hibridização, normal e patológico, de<br />
ordem e caos, com traços de evidência e traços de irreflexão. “Objetos que<br />
se exprimem por extratos, blocos híbridos, rizomas, complexidades específicas,<br />
retornos frequentemente inesperados e objetos sempre frustrados”<br />
4 , marcados por obsessões, “sobrevivências”, remanescências e pela<br />
reaparição das formas.<br />
Um território em potencial que não corresponde já há muito ao seu<br />
projeto primitivo, desenhado em folhas de papel vegetal, esquadrinhando a<br />
organização e disposição dos bens culturais em grupos tipológicos e classes<br />
de identificação museológica. Os expositores com suas braças de ferro<br />
já se encontram enferrujados, os vidros quebrados, a tinta branca dos<br />
totens de madeira já desbotou, as moedas saíram do lugar e as traças aos<br />
poucos atacam as legendas de papel ainda legíveis. Os objetos continuam<br />
dispostos no mesmo lugar desde então, parecendo que se encontram ali<br />
encerrados e sepultados, vazios – sem jogos de significação.<br />
Contudo, esse é, por excelência, um lugar onde podemos sempre ver<br />
alguma outra coisa além do que vemos. Como em uma grande construção<br />
fantasmática e consoladora, diante de restos do passado, um tempo<br />
reinventa-se aí, de uma cisão aberta pelo que nos olha no que vemos 5 . O<br />
que o mantém em movimento é a vontade das formas e suas reaparições, já<br />
que a ação do especialista praticamente inexiste nesse lugar (historiadores,<br />
arqueólogos, arquivistas, profissionais da conservação e do restauro,<br />
museólogos), sendo este o maior desafio dos museus espalhados pelo<br />
interior do país, os quais se encontram como uma Template – em estado de<br />
ruína, por possuir uma estrutura frágil e efêmera.<br />
Ao mesmo tempo em que esse lugar se constitui pela complexidade das<br />
interações, imbricações e ocultamentos entre imagens, objetos e coisas,<br />
nossa sensibilidade parece já não os acessar. Por isso nos lançamos a<br />
seguinte pergunta:<br />
3. NORA, Pierre. Entre memória e história: a<br />
problemática dos lugares. In: Projeto História.<br />
São Paulo: EDUC, n. 10, dez 1993, p. 22.<br />
4. DIDI-HUBERMAN, George. A imagemfantasma:<br />
sobrevivência das formas e<br />
impureza do tempo. In:<br />
. A imagem<br />
sobrevivente: História da arte e tempo dos<br />
fantasmas segundo Aby Warburg. Rio de<br />
Janeiro: Contraponto, 2013, p. 25.<br />
5. Cf. . O que vemos, o que nos olha.<br />
São Paulo: Editora 34, 1998, p. 46.<br />
103 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7