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usuários de línguas indígenas particulares e eram considerados selvagens.<br />
Por quê? Porque eles só conseguiam se comunicar ali entre eles porque<br />
a língua deles não servia para eles se comunicarem com ninguém mais.<br />
Os jesuítas chegam já no período colonial. Eu pego como exemplos:<br />
entre um índio Munduruku e um índio Tapajós devia haver algum grau<br />
de intercompreensão como existe entre o português e o espanhol. Mas<br />
8. Cestmir Loukotka (1895-1966) foi<br />
importante linguista tcheco.<br />
“O próprio Museu<br />
Magüta. Qual é<br />
a situação do<br />
Museu Magüta<br />
hoje? Quer dizer,<br />
são experiências<br />
que nem sempre<br />
apontam naquela<br />
direção que a<br />
gente quer, mas<br />
são marcos, são<br />
referências de<br />
resistência e de<br />
organização.”<br />
entre um Tukano e um Munduruku era como o português e o alemão. Eu<br />
faço um levantamento logo no início baseado num quadro do Loukotka 8 ,<br />
um tcheco que estudou a classificação de línguas. Para a Amazônia são<br />
718 línguas, 130 do grupo Tupi, 108 do grupo Karib, 83 do Aruak. E por aí<br />
vai, se pressupõe a possibilidade de um grau mínimo de comunicação<br />
entre línguas da mesma família. E o que acontece? Os jesuítas chegam<br />
e impõem a língua-geral, que era uma língua falada na costa salgada,<br />
o tupi, Tupinambá, que eles usam como língua-geral. Por quê? Porque<br />
eles tentaram outras formas. Tentaram no litoral brasileiro impor o<br />
português. Não deu. Seria a mesma coisa se os japoneses tomassem o<br />
Brasil e dissessem: “Só come quem falar japonês”. Nós iríamos morrer de<br />
fome. Agora, se nuestros hermanos argentinos invadem o Brasil e falam<br />
“Solo come los que hablen español”. Nosotros hablaríamos. Os jesuítas<br />
perceberam isso e usaram a língua Tupinambá. E aí os índios se tornaram<br />
bilíngues na língua particular deles e na língua-geral trazida pelos jesuítas.<br />
Acontece que nessas aldeias, já não mais as de origem, mas aldeias feitas<br />
pelos jesuítas que depois se transformaram em vilas e povoados, casavam<br />
índios de diferentes filiações linguísticas. Então se um Munduruku casa com<br />
uma Tukano, eles vão falar só a língua-geral. Eles não vão falar sua língua<br />
materna. O filho vai ouvir só essa língua. E aí se criou um monolinguismo<br />
em língua-geral. Esse índio bilíngue era chamado de índio manso na<br />
documentação porque a língua-geral amansou. E aí quando em várias<br />
gerações volta a ser monolíngue mas em língua-geral, a denominação<br />
passa a ser de índio tapuio. Se eles transitassem por cidades, isso já no<br />
início do século XIX, eles adquiriam a língua portuguesa e voltavam a<br />
ser bilíngues no português e na língua-geral. Esse era chamado de índio<br />
civilizado. Permanecendo na cidade, a língua-geral já não tinha serventia<br />
e eles eram monolíngues em português, que dava no caboclo, você, eu,<br />
184 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7