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Anne Buck, uma das pioneiras no estudo de indumentária e excuradora<br />
do The Gallery of English Costume, Platt Hall, em Manchester,<br />
Inglaterra, observou que em seu país os museus demoraram a constituir<br />
coleções especializadas em indumentária e têxteis e que isso seria um<br />
reflexo do pouco interesse que a história atribuiu a estes temas como<br />
objeto de estudo 18 . Para ela, o interesse em preservar tecidos e trajes<br />
deveu-se mais ao vínculo que eles tiveram com um artista ou um estilo<br />
estético do que propriamente pelas características do traje como uma<br />
possível categoria antropológica 19 .<br />
O corpo é um elemento importante quando tratamos de indumentária<br />
em coleções de museus e ainda é mais comum encontrarmos exposições<br />
que utilizam manequins como o principal suporte para trajes. A<br />
indumentária parece perder seu sentido original quando não veste um<br />
corpo, mas o corpo ausente está frequentemente enunciado nos museus e<br />
parece haver uma grande dificuldade de se separar esses dois objetos. Isto<br />
pode ser uma fantasia, uma ilusão persistente que mistura noção identitária<br />
à indumentária, e como bem lembrou Márcia Chuva 20 , os objetos são<br />
desprovidos de sentido, e somos nós a lhes atribuir valores. Alguns museus<br />
ainda encontram dificuldade em relacionar a indumentária que está em<br />
seu acervo às outras coleções e chegam a esquecê-la nos porões ou mesmo<br />
descartá-la por isso, e seria o caso de considerar os modos de lidar com o<br />
corpo no museu como um aspecto que influencia essa dificuldade, e porque<br />
não dizer resistência de tratar indumentária como patrimônio. Estamos<br />
no presente perdendo oportunidades de manter coleções que poderiam<br />
fortalecer e alimentar a pesquisa de indumentária no Brasil no contexto<br />
das preocupações relativas ao patrimônio cultural e à patrimonialização.<br />
O que mais será necessário perder para começar a reverter essa situação?<br />
Outro marco teórico sobre a história da indumentária que trata do<br />
colecionismo é Understanding Fashion History, de Valerie Cumming<br />
(2004). Apesar de tratar particularmente do caso de museus no Reino Unido<br />
e daqueles que se tornaram referência internacional em coleções desse<br />
tipo, essa publicação fornece um estudo histórico sobre formação dessas<br />
coleções e questões importantes que podem servir de modelo comparativo<br />
para a realidade brasileira que em muito absorveu tendências estrangeiras<br />
“(...) indumentária<br />
vem sendo<br />
colecionada nos<br />
museus brasileiros<br />
randomicamente,<br />
com pouco<br />
suporte de<br />
políticas públicas<br />
e institucionais<br />
claras que<br />
sinalizem a<br />
importância deste<br />
tipo de artefato<br />
na constituição<br />
do patrimônio<br />
cultural nacional<br />
público.”<br />
18. BUCK, Anne. Foreword In: Standards in<br />
the Museum: care of costume and textiles<br />
collections 1998. Museums and Galeries<br />
Commission, 1998, p. 3. Disponível em:<br />
http://www.collectionstrust.org.uk/media/<br />
documents/c1/a83/f6/000076.pdf. Acesso em:<br />
20/04/2014.<br />
19. Na perspectiva proposta por José<br />
Reginaldo Santos Gonçalves (op.cit.) ao<br />
discutir a contribuição da antropologia sobre<br />
a formação de categorias de pensamento, em<br />
particular para a noção de “patrimônio” como<br />
categoria de pensamento.<br />
20. CHUVA, Márcia. Por uma história da<br />
noção de patrimônio cultural no Brasil.<br />
Revista do Serviço do Patrimônio Histórico e<br />
Artístico Nacional, v. 34, p. 1-15, 2012.<br />
17 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7