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Eu acho que a descoberta do museu pelos índios passa também por aí.<br />
Cada vez que qualquer museu etnográfico ou não for realizar exposições<br />
relacionadas aos índios chamar os índios que deixaram de ser apenas<br />
objetos musealizáveis para serem sujeitos.<br />
MUSAS: Há pouco você citou 1988, o ano de nossa Constituição.<br />
Também foi o ano do massacre do igarapé do Capacete 6 . Como, 28<br />
anos depois da Constituição, o senhor enxerga a violência contra os<br />
povos indígenas? Há casos emblemáticos, como o dos Guarani-Kaiowá<br />
no Mato Grosso do Sul.<br />
6. No dia 28 de maio de 1988, quando os<br />
Ticuna se reuniam para uma assembleia a<br />
respeito de suas terras a serem demarcadas,<br />
foram atacados por um bando de 15 homens<br />
armados capitaneados por Oscar Castelo<br />
Branco. Foram assassinados 14 indígenas.<br />
BF: Depende da área. No Mato Grosso do Sul está tendo muito mais. No<br />
Nordeste também. Acho que recrudesceu em função basicamente da<br />
luta pela terra. Mas eu acho que a elite brasileira é muito mesquinha. A<br />
elite política, os responsáveis pela formulação de políticas. Você viu essa<br />
CPI da Funai que foi criada? Aí veio um índio Terena, que queria falar em<br />
Terena. Os deputados não permitiram. Quer dizer: “Você não pode falar<br />
na tua língua!”. E ainda entra com o processo contra o cara porque o cara<br />
quer falar na língua materna. E mostram um vídeo em que o cara está<br />
falando em português. Mas e daí? Eu falo francês fluentemente. Eu fui dar<br />
conferência na França agora e me disseram: “Você pode falar em francês ou<br />
português”. Eu vou falar em português porque em português, que é minha<br />
língua materna, eu posso expressar com muito mais facilidade aquilo que<br />
em francês, por mais fluência que eu tenha, eu teria uma certa dificuldade.<br />
Não é minha língua materna, não é? Para falar em museu, eu escrevi sobre<br />
o Museu da Língua Portuguesa. Eu escrevi um artigo sobre o Museu da<br />
Língua Portuguesa quando houve o incêndio. Quase toda vez que eu ia a<br />
São Paulo, eu visitava esse museu que eu achava maravilhoso. É um museu<br />
maravilhoso, eu me encontro naquele museu como falante da língua<br />
portuguesa. Eu acho uma maravilha. Agora, sempre houve uma coisa que<br />
me incomodou no museu. De um lado, tinha algo que me fascinava, que<br />
é a própria linguagem que o museu encontrou para reverenciar a língua<br />
portuguesa. A outra é o lugar das línguas indígenas nesse museu porque<br />
parece que o Brasil é um país monolíngue. As línguas indígenas aparecem<br />
“Não que a<br />
gente deixe de<br />
ser ignorante<br />
quando fica<br />
meio anárquico<br />
assim. Mas eu<br />
saí procurando<br />
aquilo que me<br />
interessava e que<br />
eu achava que<br />
podia interessar<br />
para os índios.”<br />
179 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7