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Musas7

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tento traduzir do antropologuês da linguística. Ali evidentemente você<br />

simplifica, esquematiza, com o risco que se corre, mas você consegue<br />

passar o conhecimento.<br />

MUSAS: Para encerrar, que tipo de desenvolvimento é possível e bemvindo<br />

para a Amazônia? Como vê as perspectivas de desenvolvimento<br />

da Amazônia?<br />

BF: Anos atrás estavam construindo habitações populares na Nova<br />

Cidade, periferia de Manaus, e descobriram um cemitério indígena. Mais<br />

de cinco mil urnas e os tratores passaram quebrando para construir casa.<br />

Os índios organizados foram protestar. O Ministério Público embargou.<br />

Aí o Ministério Público me chamou para fazer uma avaliação histórica do<br />

sítio arqueológico. Tinham descoberto [cemitério indígena] também na<br />

Praça da Prefeitura [em Manaus]. Aí eu fui lá visitar o cemitério com o<br />

procurador e a Bernardete Andrade, que era do Iphan e tinha sido minha<br />

aluna. Estava um tempo meio feio, e chegaram os representantes das<br />

empreiteiras que quebraram as urnas. O procurador me apresentou:<br />

“Aqui é o professor Bessa, veio aqui fazer uma avaliação”. E um deles:<br />

“Você é o que [fez sinal de quem escreve]?”. Ele fez por conta das<br />

crônicas de jornal. Eu disse a eles “É!”. E veio um silêncio constrangedor.<br />

O que eu podia fazer, né? E para quebrar um pouco, eu disse: “É, eu<br />

tenho feito críticas a vocês”. Porque eu pegava pesado em cima deles. É<br />

uma turma pesada. Eles mandaram me acertar aqui em Niterói, né? E ele<br />

disse: “Injustas!”. Aí o procurador disse: “Olha só, a última vez que vocês<br />

foram lá era uma intimação. Agora não é uma intimação. É um convite.<br />

O professor vai dar uma conferência no auditório do Ministério Público<br />

às 14 horas sobre arqueologia da Amazônia e vocês estão convidados”.<br />

Aí começou a chover e todo mundo correu pros carros. E o procurador<br />

disse: “500 anos que eles vão. Não vão”. Eu tinha preparado uma fala<br />

e, às 14 horas, eles estão todos, nove empreiteiras representadas. Eu<br />

comecei assim: “O André Gide dizia que não queria ser apresentado ao<br />

diabo porque se ele fosse apresentado ao diabo, o diabo ia tentar explicar<br />

os motivos da diabrura e ele não queria saber as razões da diabrura. Eu<br />

“São<br />

conhecimentos<br />

diferentes<br />

baseados em<br />

experiências<br />

milenares que<br />

acho que a<br />

sociedade está<br />

de costas. Isso é<br />

uma das tarefas<br />

do museu, a de<br />

tentar recuperar<br />

essa informação,<br />

que circula<br />

oralmente.”<br />

193 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7

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