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símbolos que insistem em resistir à ação do tempo,<br />
mantendo a brancura do linho, algumas delas,<br />
porém, não conseguindo resistir ao ataque de insetos<br />
xilófagos e aos rasgões. Prelatícios e roquetes com<br />
borlas púrpuras nos confundem, pois não sabemos<br />
que chapéus são esses e num último ato lançamos<br />
nossa mão ao fundo da gaveta e descobrimos uma<br />
infinidade de fitas, galões e brocados soltos e avulsos<br />
enrolados em um papelão, como que à espera de<br />
novos usos sobre novas vestes que, parece, não<br />
serão costuradas.<br />
Terceira Template<br />
“Contudo, esse é um lugar por<br />
excelência onde podemos ver<br />
sempre alguma outra coisa além<br />
do que vemos. Como em uma<br />
grande construção fantasmática<br />
e consoladora, diante de restos<br />
do passado, um tempo reinventase<br />
aí, de uma cisão aberta pelo<br />
que nos olha no que vemos.”<br />
Quando fechamos o armário e dentro dele esse<br />
mundo maravilhoso das coisas, subimos a escadaria<br />
observando uma série de fragmentos de retábulos<br />
e frontões com motivos decorativos diversos e,<br />
assim, nos entretemos enquanto os degraus de<br />
madeira rangem. No alto do salão, somos atraídos<br />
agora por retratos, que dispostos aleatoriamente<br />
pelas paredes e painéis nos olham e nos fazem ver<br />
o que olham. Como o retrato do menino que veste<br />
um terno cinza sobre um colete abotoado com a<br />
camisa branca de gola rendada e gravata vermelha<br />
em laço. Sua pele é clara, seus cabelos penteados<br />
para a direita nos hipnotizam com o movimento<br />
sinuoso das mechas. Outros retratos exercem a<br />
mesma força: o Major Matias Moinhos de Vilhena e<br />
sua esposa Escolástica Carvalho de Oliveira Vilhena<br />
nos veem e nos apontam para outras coisas, dentre<br />
elas móveis, luminárias e arandelas, instrumentos<br />
de castigo e uma liteira, que poderiam ser muito<br />
bem vestígios de sua fazenda. Caso prefiramos<br />
uma presença mais oficial, o Imperador D. Pedro II<br />
carregando no peito suas insígnias nos leva a olhar<br />
para as espadas enferrujadas em suas bainhas e<br />
estribos de bronze com o brasão imperial. Tais<br />
imagens nos inquietam, pois eles olham para fora<br />
do quadro, enquanto a paisagem atrás deles nos<br />
fala de outra coisa, de outros significados, de outro<br />
tempo – o tempo dos mortos.<br />
Pois “o passado está felizmente morto e seus<br />
restos só interessam no presente como material<br />
para um trabalho de destruição de universalismos<br />
que descartam sua historicidade. Os mortos só<br />
interessam na crítica dos vivos e dos muito vivos” 8 .<br />
Devemos pensar nas especificidades históricas dos<br />
restos e como nós os acessamos e os lemos, longe de<br />
querermos dispô-los em nichos ou grupos estilísticos,<br />
8. HANSEN, João Adolfo. Barroco, neobarroco e outras ruínas. Revista destiempos.com. México/Distrito Federal, Ano 3, n. 14, mayo-junio 2008, p. 180.<br />
107 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7