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Musas7

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nessa história é que eles entrevistaram mais de 400 pessoas entre índios e<br />

não-índios. Quando foi perguntado aos não-índios “o que é o museu para<br />

você?”, grande parte da população não-indígena de Benjamin Constant<br />

disse: “museu é coisa de índio!”. Por quê? Porque o Estado brasileiro não<br />

havia apresentado nunca a essa população um museu. O primeiro museu<br />

que eles viram na vida foi um museu feito pelos índios. O raciocínio foi o<br />

seguinte: “arco e flecha nós temos? Não, então é coisa de índio. Museu<br />

nós temos? Não. Então é coisa de índio!”. A própria biblioteca do museu...<br />

Não existia uma estante de livros em Benjamin Constant. As crianças<br />

não-indígenas, quando os professores pediam para fazer trabalhos de<br />

pesquisa, tinham que procurar livros na biblioteca do Magüta. Aí a gente<br />

ficou encantado com o papel do Magüta. Veio então a definição que os<br />

próprios índios deram de museu. Foi uma coisa que me encantou. Eu<br />

até fiz referência a essa definição que os índios deram de museu quando<br />

Gilberto Gil assumiu o Ministério da Cultura e, dois ou três meses depois,<br />

quando ele propôs uma política para museus, houve um grande almoço<br />

no Museu Histórico [Nacional] na Praça 15. E eu fui representando a<br />

Sociedade de Amigos do Museu do Índio, da qual eu era presidente. E<br />

me pediram para discursar. E eu falei para o Gil e arranquei lágrimas do<br />

Gil de verdade porque eu falei para ele qual foi definição que os índios<br />

deram de museu. Primeiro, para explicar a definição: até o museu, todas<br />

as narrativas míticas dos Ticuna eram transmitidas oralmente, de boca ao<br />

ouvido. Com o museu, pela primeira vez os índios viram materializados<br />

certos personagens que só circulavam na transmissão oral. Os dois heróis<br />

míticos, Yo´i e Ipi. O Pedro Inácio, que é um índio Ticuna sábio, fez uns<br />

desenhos coloridos desses dois heróis míticos, dos quais só se ouvia falar,<br />

mas nunca se tinha visto. O museu permitiu que vissem pela primeira<br />

vez. Então um índio definiu: “museu é um lugar que serve para colorir o<br />

pensamento!”. Achei lindíssimo. O Gil adorou essa definição também.<br />

Como eles estavam pensando que a tradição oral estava se esfacelando,<br />

outro índio disse: “museu é o lugar que serve para segurar as coisas no<br />

mundo”. Uma terceira definição que achei muito bela também foi:<br />

“museu é o lugar que serve para guardar nosso futuro!”. Com o Gil nesse<br />

dia, eu estava dizendo que essa instituição museu, que era desconhecida<br />

“O canto da<br />

museologia me<br />

tomou. Quer<br />

dizer, eu fui<br />

convertido à<br />

área pelos meus<br />

alunos, que me<br />

mostraram – e<br />

eu acredito<br />

nisso – o poder<br />

que o museu<br />

tem. O poder<br />

de reafirmar<br />

preconceitos<br />

ou de quebrar<br />

preconceitos<br />

e até o de<br />

ressuscitar, como<br />

diz o Clifford,<br />

formas de vida.”<br />

171 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7

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