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Musas7

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suas variadas vertentes; compreendê-la, mais de perto, como imagem<br />

que, de maneiras variadas, pode recriar certos fios que a temporalidade<br />

racionalista (des)atou, na medida em que dispôs o tempo numa trama<br />

pré-moldada”. Nesta perspectiva, Ramos nos mostra como a literatura, a<br />

história, a museologia e a tradição antiquária compartilham muito em suas<br />

experiências com o passado, sensibilidades que ora vêm como saudade,<br />

ora como melancolia, “ora como porta de entrada para o passado, ora<br />

como vontade de vasculhar a terra para ver, pelo menos em parte, as<br />

raízes do presente”. Todas fazem parte da escrita da história moderna em<br />

sua busca pela distribuição do tempo em dimensões diferentes.<br />

Nas reflexões do autor, há um alargamento da noção de “escrita da<br />

história”, que, tomada em sentido mais amplo, é “exatamente o protocolo<br />

que, em determinado lugar do poder institucional, sustenta-se por maneiras<br />

de fazer o tempo ser distribuído entre o antes, o agora e o depois”.<br />

Ao analisar a persistência das referências à “poeira do passado”<br />

na literatura, Ramos nos leva a refletir como a escrita se apropria do<br />

“antigo” para torná-lo um passado domesticado, uma vez que tudo<br />

aquilo que é tomado como patrimônio histórico passa necessariamente<br />

por uma domesticação. Escreve ele: “Nos museus, o processo tende a<br />

ser mais intenso, sobretudo quando a instituição prima pela elaboração<br />

de inventários e legendas”. Isto nos traz novamente à tessitura<br />

dessas narrativas na construção romântica que Gustavo Barroso faz<br />

do passado, ao jogo entre a palavra e os objetos. Estes “tornam-se<br />

significativos na literatura porque são inseparáveis das construções<br />

culturais, porque juntam e dividem seres humanos, porque habitam<br />

no âmago das relações sociais”. A imposição da palavra diante dos<br />

objetos atribui-lhes uma existência específica para atender a certas<br />

demandas dos processos de musealização. O desejo de informação<br />

que acompanha as legendas expositivas é relacionado, por Ramos,<br />

à própria ausência da memória, pois como atenta Pierre Nora, mais<br />

lugares de memória significa mais esquecimento. A palavra então é o<br />

remédio para o esquecimento, ocasião em que o autor cita o romance<br />

Cem anos de solidão, no qual a doença da falta de sono gerou uma<br />

amnésia coletiva, que ocasionou a necessidade dos habitantes de<br />

294 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7

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