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USP em Geografia, senta a porrada. Para discutir o artigo dele com meus<br />
alunos, eu coloquei no Google e o Google me remeteu ao Clube Militar do<br />
Rio de Janeiro, que publicou o artigo do Demétrio Magnoli. Aí o ministro<br />
da Educação, o Mercadante, em vez de defender esse espaço, essa brecha<br />
mínima, para fazer média com a mídia, ele disse: “Não, o Brasil são os<br />
europeus. Estão dando muito peso...”. Quer dizer, não existe nada. Você<br />
quer uma brechinha e os caras fazem um escândalo, caem de pau. Os<br />
caras passaram o trator. Ali eu me senti realmente impotente. Quando<br />
nem isso eles deixam, uma brechinha para a gente falar um pouquinho<br />
sobre as matrizes culturais formadoras do Brasil, indígenas e africanas... É<br />
um problema esse processo de apagamento. É uma luta constante!<br />
MUSAS: Além de sua atuação acadêmica, o senhor mantém há muitos<br />
anos coluna semanal nos jornais de Manaus. Nela escreve textos sobre<br />
a realidade da cidade, sua história, sobre cenários e debates políticos,<br />
e sobre personagens interessantes, alguns deles indígenas. Como você<br />
avalia essa experiência?<br />
BF: Eu acho que é um trabalho de professor também, para dizer a verdade.<br />
Eu sempre me preocupei com esse conhecimento que a academia<br />
produz, tese de doutorado, dissertação de mestrado, que não passa<br />
para o conjunto da população. Nós estávamos falando desse processo<br />
de esquecimento e o João Pacheco de Oliveira 12 tem um artigo muito<br />
bonito em que ele fala que, na verdade, há uma narrativa consolidada<br />
sobre o Brasil, que é essa que a gente conhece, e aí esses conhecimentos<br />
não se encaixam dentro dessa narrativa. Então ele fala que não tem<br />
espaço nessa narrativa que já foi construída. Teria que implodir essa e<br />
criar uma outra narrativa. O fato é que a população brasileira não tem<br />
acesso a essas informações. Aí o que eu passei a fazer? Eu pensei que<br />
na minha coluna eu tenho que tentar explorar coisas que as pessoas não<br />
encontrariam em outros lugares. Às vezes, tem leitores que reclamam um<br />
pouco. Tem leitores que reclamam quando repito demasiado a temática<br />
indígena. Eles querem que eu comente a política local e nacional. E aí<br />
eu vou negociando. Faço duas ou três crônicas relacionadas a índio e<br />
“Manaus, em 1850,<br />
quando se cria<br />
a província do<br />
Amazonas, 48%<br />
da população não<br />
falava o português<br />
como língua<br />
materna. Então<br />
essa hegemonia<br />
é muito tardia.<br />
Isso que a gente<br />
esperava um<br />
pouco de um<br />
Museu de Língua<br />
Portuguesa.”<br />
12. João Pacheco de Oliveira é antropólogo<br />
e professor do Programa de Pós-graduação<br />
em Antropologia Social do Museu Nacional<br />
(PPGAS-MN) da UFRJ. Sua produção<br />
intelectual é dedicada sobretudo ao estudo<br />
de povos indígenas da Amazônia. Contribui<br />
ativamente em processos sociais de<br />
valorização da cultura e memória indígenas.<br />
Exemplo disso é sua atuação nos anos iniciais<br />
do Museu Magüta.<br />
191 • Revista MUSAS • 2016 • Nº 7