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Anais do IV Seminário de Pesquisa do Programa de Pós ...

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182<br />

A ação da política pombalina e o discurso absolutista acabaram por inaugurar uma nova<br />

percepção sobre o mun<strong>do</strong> da política portuguesa, constituin<strong>do</strong>-se numa linguagem política influente<br />

que tencionou os <strong>de</strong>bates políticos e jurídicos das décadas subseqüentes. No último quarto <strong>do</strong> século<br />

XVIII, os <strong>de</strong>bates em torno da elaboração <strong>de</strong> um Novo Código <strong>de</strong> Direito Público para Portugal<br />

constituem-se em excelente exemplo das concepções em disputa. Paschoal <strong>de</strong> Mello Freire, autor <strong>do</strong><br />

Código <strong>de</strong> Direito Público na parte relativa à reforma <strong>do</strong> livro II das Or<strong>de</strong>nações Filipinas, filiava-se à<br />

tradição absolutista ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r que<br />

aos vassalos compete amar e obe<strong>de</strong>cer ao imperante e aos que governam<br />

em seu nome, servir aos cargos públicos e pedir ao Príncipe, não só a sua<br />

proteção, mas graças e mercês em remuneração <strong>de</strong> seus serviços 9 .<br />

Em caso <strong>de</strong> agravo, ao súdito cabia apenas a eventual e humil<strong>de</strong> representação ao monarca,<br />

sen<strong>do</strong> as <strong>do</strong>utrinas que consi<strong>de</strong>ravam a idéia <strong>de</strong> pacto social coisa <strong>de</strong> monarcômacos 10 . Já Antonio<br />

Ribeiro <strong>do</strong>s Santos, censor da Junta <strong>de</strong> Censura e Revisão <strong>do</strong> Novo Código, explicitou o caráter<br />

<strong>de</strong>spótico <strong>do</strong> Novo Código proposto por Mello Freire, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a idéia <strong>do</strong> pacto social que<br />

<strong>de</strong>limitava a esfera voluntarista <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> Príncipe e a <strong>do</strong>s direitos e <strong>de</strong>veres <strong>do</strong>s povos. O censor<br />

fundamentava historicamente esta convenção entre o rei e o povo nas Leis Fundamentais, que<br />

estariam pautadas pelas Atas <strong>de</strong> Lamego 11 e as reuniões das Cortes durante o século XVII 12 .<br />

A divergência <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is letra<strong>do</strong>s quanto ao po<strong>de</strong>r tinha como questão central o papel das Leis<br />

Fundamentais. Segun<strong>do</strong> Paschoal <strong>de</strong> Mello Freire, as Atas <strong>de</strong> Lamego dispunham somente sobre a<br />

sucessão <strong>do</strong>s reis, sen<strong>do</strong> a monarquia pura e absoluta, fundada na conquista e na hereditarieda<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r, uma vez que to<strong>do</strong>s os po<strong>de</strong>res da soberania resi<strong>de</strong>m na única pessoa <strong>do</strong>s nossos príncipes,<br />

sen<strong>do</strong> recebi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Deus To<strong>do</strong> Po<strong>de</strong>roso 13 . Já Ribeiro <strong>do</strong>s Santos afirmava que tratavam também da<br />

natureza <strong>do</strong> governo, encontran<strong>do</strong> no tradicionalismo constitucional uma saída mais equilibrada e<br />

disciplinada que a <strong>do</strong> ―<strong>de</strong>sarruma<strong>do</strong> avulso pombalino e o ultrapassa<strong>do</strong> das Or<strong>de</strong>nações‖ 14 .<br />

Embora Ribeiro <strong>do</strong>s Santos <strong>de</strong>monstrasse uma percepção mais voluntarista das relações<br />

entre soberano e vassalos, referin<strong>do</strong>-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma refundação constitucional 15 , a<br />

manutenção da referência a tradição <strong>de</strong>monstra o quan<strong>do</strong> estes homens ainda se mantinham presos<br />

ao espaço <strong>de</strong> experiência <strong>do</strong> mesmo passa<strong>do</strong> que referendava a or<strong>de</strong>m corporativa. As Atas <strong>de</strong><br />

Lamego legitimavam uma concepção corporativa <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> e a permanência <strong>de</strong>ssa referência<br />

9 Paschoal <strong>de</strong> Mello Freire MELLO, Novo Código <strong>de</strong> Direito Público <strong>de</strong> Portugal, Coimbra, 1844, p.1.<br />

10 José Esteves PEREIRA, O pensamento político em Portugal no século XVIII: Antônio Ribeiro <strong>do</strong>s Santos.<br />

Lisboa, Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1983, p. 243-269 e 364-387.<br />

11 Airton Cerqueira Leite SEELAENDER, Notas sobre a constituição <strong>do</strong> direito público na ida<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />

Revista Seqüência, Nº 53, ano XXVI, Florianópolis, <strong>de</strong>z-2006, p. 202-3.<br />

12 IDEM, Ibi<strong>de</strong>m, p. 243-269.<br />

13 Logo, partia <strong>do</strong> mesmo pressuposto que Seabra da Silva usara na Dedução Chronológica. Neste,<br />

buscava-se a legitimação da soberania no direito <strong>de</strong> conquista por meio da batalha <strong>de</strong> Ourique, ao mesmo<br />

tempo em que afirmava-se a sacralida<strong>de</strong> com a aparição divina a D. Afonso Henriques durante a tomada <strong>do</strong><br />

reino aos mouros. GOMES, op.cit, p. 74-75.<br />

14 PEREIRA, op. cit, p. 254.<br />

15 HESPANHA, A. M e XAVIER, Angela Barreto, A representação da socieda<strong>de</strong> e <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r IN HESPANHA,<br />

Antonio Manuel (coord.), História <strong>de</strong> Portugal, vol. 4: O Antigo Regime, Lisboa, Estampa, 1993, p.144-145.

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