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Anais do IV Seminário de Pesquisa do Programa de Pós ...

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52<br />

De fato, no presente estu<strong>do</strong>, partimos <strong>do</strong> seguinte pressuposto: o interesse <strong>de</strong> Arriano na<br />

obra e o objetivo que almejava com ela estariam intimamente relaciona<strong>do</strong>s ao mo<strong>do</strong> por ele<br />

escolhi<strong>do</strong> para contá-la – ou seja, as características <strong>do</strong> discurso a<strong>do</strong>tadas pelo autor em sua<br />

composição. Uma análise <strong>do</strong> prefácio da obra é nosso primeiro passo nessa discussão, pois se<br />

trata <strong>do</strong> momento no qual o autor coloca, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> mais direto, seus objetivos mais básicos com<br />

aquele seu escrito. Nesse momento <strong>de</strong> seu escrito, Arriano comenta que consi<strong>de</strong>ra e transcreve<br />

como verda<strong>de</strong>iras as informações que encontra tanto na obra <strong>de</strong> Ptolomeu quanto na <strong>de</strong><br />

Aristóbulo – ambos companheiros <strong>de</strong> Alexandre em sua expedição. Trata-se, nesse primeiro<br />

momento, <strong>de</strong> claramente ressaltar o caráter <strong>de</strong> suposta verda<strong>de</strong> inerente ao seu escrito. Ao<br />

mesmo tempo, percebemos a posição meto<strong>do</strong>lógica <strong>do</strong> autor que permite, primeiramente, esse<br />

alcance da verda<strong>de</strong>: a seleção por <strong>de</strong>terminadas fontes e uma análise comparativa entre elas 106 .<br />

A racionalida<strong>de</strong> e busca pela verda<strong>de</strong> talvez sejam as principais características que nos permitem<br />

afirmar que Arriano preten<strong>de</strong>u construir um discurso histórico em sua obra, ten<strong>do</strong> em vista que o<br />

mo<strong>de</strong>lo historiográfico surgi<strong>do</strong> com Heró<strong>do</strong>to e Tucídi<strong>de</strong>s pressupunha ao historia<strong>do</strong>r o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong><br />

dizer a verda<strong>de</strong> sobre o que relatava. Ou seja, a proposta em torno da escrita da verda<strong>de</strong> era um<br />

elemento constituinte <strong>do</strong> discurso histórico 107 .<br />

Portanto, o relato <strong>de</strong> Arriano, enquanto <strong>de</strong>claradamente verda<strong>de</strong>, se aproximaria <strong>de</strong> um<br />

discurso histórico sobre o passa<strong>do</strong>. Mas, exatamente, quais seriam as conseqüências disso? O<br />

que o discurso histórico possuía que o diferenciava, qualitativamente em sua função, <strong>de</strong> outros<br />

possíveis relatos sobre o passa<strong>do</strong>? Segun<strong>do</strong> o historia<strong>do</strong>r Arnal<strong>do</strong> Momigliano, os historia<strong>do</strong>res<br />

gregos quase sempre acreditavam que os acontecimentos passa<strong>do</strong>s tinham certa relevância para<br />

o futuro, e sua lembrança constituiria uma espécie <strong>de</strong> lição aos contemporâneos <strong>de</strong> tal escrito 108 .<br />

Dessa forma, o ímpeto <strong>de</strong> construção da Anábase <strong>de</strong> Alexandre Magno converge então para o<br />

seguinte senti<strong>do</strong>: Arriano, em sua obra, <strong>de</strong>sejaria fundamentalmente lembrar e ressaltar o caráter<br />

exemplar <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> personagem e a realização, por parte <strong>de</strong>ste, <strong>de</strong> um empreendimento<br />

notável. Tu<strong>do</strong> isso seria digno <strong>de</strong> lembrança, tornan<strong>do</strong>-se uma espécie <strong>de</strong> exemplo para a época<br />

<strong>do</strong> próprio Arriano.<br />

Po<strong>de</strong>mos pensar que a escrita da história, ao assumir uma função instrutiva, tornava-se<br />

praticamente um instrumento <strong>de</strong> reflexão: ela revelava, com base na tradição, quais seriam os<br />

bons e maus exemplos a serem segui<strong>do</strong>s. Em outras palavras, ela legitimava ações,<br />

comportamentos e personagens, especialmente no âmbito da vida política. De certo mo<strong>do</strong>, as<br />

escolhas <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s exemplos (seja para enaltecer ou criticar) realizadas pelos autores<br />

antigos atendiam à seus interesses e idéias sobre a política e o próprio po<strong>de</strong>r na época em que<br />

viveram e escreveram. Justamente por isso, po<strong>de</strong>mos pensar que Arriano, ao compor a Anábase<br />

106 ARRIANO. Anábasis <strong>de</strong> Alejandro Magno: libros I-III. Tradução <strong>de</strong> Antonio Guzmán Guerra. Madrid:<br />

Editorial Gre<strong>do</strong>s, 1982, p. 117.<br />

107 CADIOU, François; COULOMB, Clarisse; LEMONDE, Anne; SANTAMARIA, Yves. Como se faz a<br />

história: historiografia, méto<strong>do</strong> e pesquisa. Tradução <strong>de</strong> Giselle Unti. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p.19.<br />

108 MOMIGLIANO, Arnal<strong>do</strong>. As raízes clássicas da historiografia mo<strong>de</strong>rna. Tradução <strong>de</strong> Maria Beatriz<br />

Borba Florenzano. Bauru/SP: EDUSC, 2004, p. 38.

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