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Anais do IV Seminário de Pesquisa do Programa de Pós ...

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446<br />

Com todas essas sensações inexplicáveis, Jan começa a esquecer-se <strong>de</strong> si mesmo e percebe<br />

que há em seu íntimo algo inteiramente novo, algo que não se conecta com o passa<strong>do</strong>, que se faz<br />

presente sem que se possa nomear <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vem, uma ruptura. Não sente mais o chão sob os<br />

pés, <strong>de</strong>seja <strong>de</strong>sesperadamente encontrar um local inacessível ao pensamento, esse pensamento<br />

persecutório e incessante que <strong>de</strong>cidira montar guarda em sua mente. — Quem sou eu? O que me<br />

explica? Quais são as marcas da cultura que levo marcadas em minha pele? Um animal selvagem<br />

<strong>do</strong>mestica<strong>do</strong>, uma fera que vive em rebanho. Sou um <strong>de</strong>spropósito para a natureza. Maldita<br />

cultura, maldita moral. — Sua cabeça gira, suas mãos tremem, sente ar<strong>de</strong>r-se em febre. Vê<br />

flashes <strong>do</strong>s momentos vertiginosos que passou com LeBrasseur no topo daquela torre. Conforme<br />

os pensamentos cruzam sua mente como relâmpagos, Jan escuta as badaladas estouran<strong>do</strong> em<br />

seus ouvi<strong>do</strong>s. E lembra-se das palavras <strong>do</strong> professor:<br />

Você precisa tomar cuida<strong>do</strong>. ―[...] Irão lhe explicar que essas torres são<br />

símbolos <strong>do</strong> temor a Deus <strong>de</strong> nossos ancestrais, que são monumentos que<br />

simbolizam a mais profunda submissão <strong>do</strong>s homens ante o Absoluto e,<br />

símbolos dura<strong>do</strong>uros da entrega da vonta<strong>de</strong> humana nas mãos da Divina<br />

Providência.‖<br />

[...]<br />

Irão lhe dizer muitas coisas e você ―[...] terá que se <strong>de</strong>cidir se irá querer<br />

acreditar em nossas <strong>do</strong>utrinas inspiradas na teologia das torres ou se irá<br />

preferir confiar em seus olhos, que veem uma coisa completamente<br />

diferente daquilo que dizem seus ouvi<strong>do</strong>s. (Sloterdijk. A árvore mágica, p.<br />

48).<br />

As badaladas ficam cada vez mais altas, sua cabeça pulsa, a incessante voz <strong>do</strong> professor: ―[...]<br />

Enquanto se fala da impotência, verá nessas torres a mais terrível ânsia pelo po<strong>de</strong>r [...]‖; ―[...]<br />

Enquanto com belas palavras se fazem os mais humil<strong>de</strong>s votos <strong>de</strong> obediência e <strong>de</strong> entrega, verá<br />

a vonta<strong>de</strong> rebelar-se da maneira mais ar<strong>do</strong>rosa.‖ (Sloterdijk. A árvore mágica, p. 48-9). — O que<br />

ele quis dizer com ‗colocamos a faca na garganta <strong>do</strong> velho Deus para <strong>de</strong>pois ocuparmos seu<br />

lugar?‘ Há muito esse Deus <strong>de</strong> meus ancestrais morreu, mas nunca me senti tão responsável pela<br />

sua morte quanto agora. Eu sou o animal mais maldito sobre a face da Terra, sou responsável por<br />

esse caos que aí está. E o caos parece que está somente em mim. —<br />

Jan passa o cair da tar<strong>de</strong> e toda noite persegui<strong>do</strong> por esses pensamentos. No dia seguinte,<br />

sente-se mais calmo e consegue pensar melhor sobre a ‗Psicologia das alturas‘. Segun<strong>do</strong><br />

Lebrasseur, no futuro essa psicologia que dará eficácia à medicina, pois será<br />

necessário aos<br />

médicos curar os homens mo<strong>de</strong>rnos da <strong>do</strong>ença que eles se tornarão. O homem, ten<strong>do</strong> se<br />

coloca<strong>do</strong> tão superior à natureza, sentirá vertigens ao olhar para baixo. (Sloterdijk. A árvore<br />

mágica, p. 49-50). Caberá ao ‗psicólogo das alturas‘ trazê-lo <strong>de</strong> volta para o chão, pois<br />

[...] Quem constrói obras que alcançam tamanha altura só po<strong>de</strong>rá ter<br />

problemas no chão. Quem sobe tão alto, sentirá que a mal<strong>do</strong>sa Mãe-Terra<br />

se abrirá sob seus pés como abismo assusta<strong>do</strong>r. Sintomas <strong>de</strong> altura, nada<br />

mais são que sintomas <strong>de</strong> altura e apenas com isto teremos que lidar. A<br />

nova arte precisa resgatar o cidadão refugia<strong>do</strong> nas alturas e <strong>de</strong>forma<strong>do</strong>

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