Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
função, o quorum de aprovação: elas requerem maioria absoluta de votos<br />
na Câmara dos Deputados e no Senado (art. 69 da CF)h.<br />
Essas leis não têm a rigidez das normas constitucionais, nem a flexibilidade<br />
das leis ordinárias. Isso lhes dá estabilidade maior que a das leis<br />
comuns, evitando que se sujeitem a modificações ao sabor de maiorias ocasionais<br />
do Congresso Nacional. Já nos anos sessenta Miguel Reale ensinava<br />
que a tradicional dicotomia entre leis constitucionais e leis ordinárias<br />
vinha sendo' superada pela "necessidade de intercalar um tertium genus de<br />
leis, que não ostentem a rigidez dos preceitos constitucionais, nem tampouco<br />
devem comportar a revogação (perda da vigência) por força de qualquer lei<br />
ordinária superveniente"'. A essas normas chamou Miguel Reale de "leis<br />
de complementação do texto constitucional", leis orgânicas, ou paraconstitucionaisx.<br />
3.2. Funções da lei complementar no <strong>direito</strong> tributário<br />
As leis complementares prestam-se a dois tipos de atuação em matéria<br />
tributária. Na quase-totalidade das hipóteses, a Constituição lhes confere<br />
tarefas dentro de sua função precípua (de "complementar" as disposições<br />
constitucionais). É o que ocorre quando se lhes dá a atribuição de dispor<br />
sobre confiitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os<br />
Estados, o Distrito F<strong>ed</strong>eral e os Municípios (CF, art. 146, I), explicitando,<br />
por exemplo, a demarcação da linha divisória da incidência do ISS (tributo<br />
municipal) e do ICMS (tributo estadual), ou a de regular as lirnitagões constitucionais<br />
do poder de tributar (CF, art. 146, 11). desdobrando as exigências<br />
da princípio da legalidade, regulando as imunidades tributárias etc.<br />
E, ainda, função típica da lei complementar estabelecer normas gerais<br />
de <strong>direito</strong> tributário (art. 146.111). Em rigor, a disciplina "geral" do sistema<br />
tributário já está na Constituição; o que faz a lei complementar é, ob<strong>ed</strong>ecido<br />
o quadro constitucional, aumentar o grau de detalhamento dos modelos<br />
de tributação criados pela Constituição F<strong>ed</strong>eral. Dir-se-ia que a Constituição<br />
desenha o perfil dos tributos (no que respeita à identificação de cada<br />
tipo tributário. aos limites do poder de tributar etc.) e a lei complementar<br />
adensa os traços gerais dos tributos, preparando o esboço que, finalmente,<br />
6. Sobre O assunto. L: Geraldo Ataliba, Lei complemmrar na Consriruição; José<br />
Souto Maior Borges, Lei complei~rerirar rribirrária.<br />
7. Miguel Reale, Parlrrmenrarismo <strong>brasileiro</strong>, p. 1 10- 1.<br />
8. Parlrimerirarisnio, cit., p. 1 1 I .<br />
será utilizado pela lei ordinária, à qual compete instituir o tributo, na definição<br />
exaustiva de todos os traços que permitam identificá-lo na sua exata<br />
dimensão, ainda abstrata, obviamente, pois a dimensão concreta dependerá<br />
da ocorrência do fato gerador que, refletindo a imagem minudentemente<br />
desenhada na lei, dará nascimento a obrigação tributária.<br />
A par desse adensamento do desenho constitucional de cada tributo,<br />
as normas gerais padronizam o regramento básico da obrigação tributária<br />
(nascimento, vicissitudes, extinção), conferindo-se, dessa forma, uniformidade<br />
ao Sistema Tributário Nacional.<br />
Ainda na vigência da Constituição anterior, discutiu-se sobre a<br />
abrangência que teria a lei complemeiltar então prevista no seu art. 18,s 1".<br />
Embora a doutrina se tenha inclinado para a identificação de três funções<br />
(estabelecer normas gerais, regular as limitações constitucionais e dispor<br />
sobre conflitos de c~mpetência)~, alguns juristas sustentaram haver apenas<br />
duas funções: <strong>ed</strong>itar normas gerais para regular as limitações e para compor<br />
conflitos'". A Constituição atual (art. 146, I, I1 e 111) procurou não deixar as<br />
dúvidas que, a nosso ver, já inexistiam no texto anterior (art. 18, 5 I"),<br />
consoante demonstrara Hamilton Dias de Souza".<br />
Noutros dispositivos da Constituição, prevê-se também a lei complementar<br />
com a mesma função de adensar o modelo constitucionalmente<br />
prefigurado de certos tributos, quando se lhe confere, por exemplo, a tarefa<br />
de definir grandes fortunas (art. 153, VII), ou de fixar critérios de competência<br />
tributária do imposto estadual de transmissão (art. 155, 5 I", 111), ou<br />
de definir aspectos próprios do ICMS (art. 153,s 2", X, a, e XII) ou do ISS<br />
(art. 156, 5 3" com a r<strong>ed</strong>ação da EC n. 3/93). O art. 195, 11 (com a<br />
r<strong>ed</strong>ação da EC n. 20198) atribui à lei complementar a fixação de limite de<br />
valor para a concessão de remissão ou "anistia" de certas contribuições<br />
sociais. A lei complementar é demandada também para dar tratamento sistemático<br />
a certas situações específicas, quando se lhe reconhece a função<br />
de definir tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e<br />
9. Hamilton Dias de Souza, Normas gerais de <strong>direito</strong> tributário. in Direito triburário,<br />
p. 27. As primeiras discussões sobre o assunto, a propósito ainda da Constituição de<br />
1946, são registradas por Rubens Gomes de Sousa (Normas gerais de <strong>direito</strong> financeiro,<br />
RDA, n. 37, p. 12 e S.).<br />
10. Geraldo Ataliba, Normas gerais de <strong>direito</strong> financeiro, RDP, n. 10, p. 45 e S.;<br />
Paulo de Barros Carvalho, O campo restrito das normas gerais de <strong>direito</strong> tributário, RT. n.<br />
433, p. 297; Roque Carrazza, O sujeito, cit., p. 47.<br />
I I. Normas gerais, in Direito tributário, cit., p. 27.