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cobradas dos indivíduos a cuja disposição é posta essa utilidade (por exemplo,<br />

serviço de coleta de esgoto). Aliomar Baleeiro faz igual registro ao<br />

dizer: "Certos serviços trazem vantagem pela sua existência mesma (...),<br />

apresentam vantagem efetiva para quem pode dispor deles"35.<br />

Por outro lado, a triburabilidade da fruição potencial nada tem que<br />

ver com a obrigatori<strong>ed</strong>ade de utilização do serviço, nem com o descumprimento<br />

da obrigação legal que imponha essa utilização. A eventual<br />

infraçã6 de norma imperativa ensejaria sanção (administrativa ou penal),<br />

com o que o tributo não se confunde (art. 3"). Ademais, não faria sentido<br />

tributar apenas a não-utilização ilegal, e não taxar a não-fruição legal. O que<br />

ocorre é que, de acordo com a previsão constitucional, a taxa será devida<br />

por estar o serviço à disposição; se a não-utilização do serviço implicar<br />

infração de norma cogente, o indivíduo, além do tributo, sujeitar-se-á a<br />

sanção pertinente. Suponha-se que a legislação proíba os indivíduos, habitantes<br />

de certa área densamente povoada, de lançar o esgoto em fossas,<br />

obrigando-os a utilizar o serviço público de coleta de esgoto. Ora, a taxa<br />

que for instituída pelo Estado pode ser cobrada de quem tem o serviço a<br />

disposição, ainda que não o utilize efetivamente, porque, por exemplo,<br />

mantém fechada sua casa ou ainda não a construiu. Nenhuma infração de<br />

norma administrativa haverá aí, mas a taxa será devida. E se, pagando ou<br />

não a taxa, o indivíduo lançar o esgoto no quintal ou na rua, ferindo a<br />

norma legal proibitiva, aí, sim, terá cometido infração da lei. mas não será<br />

punido com o tributo, e sim com a sanção administrativa prevista na lei,<br />

sem prejuízo do recolhimento da taxa pela utilização potencial do serviço.<br />

Outras tentativas de identificar o conceito de serviço "compulsório"<br />

foram apresentadas pela doutrina. Segundo certa corrente, tratar-se-ia de<br />

serviços dirigidos ao atendimento de necessidades para as quais inexista<br />

alternativa ou sejam legalmente v<strong>ed</strong>adas outras formas de atendimento. Nessa<br />

linha, Hugo de Brito Machado registra que a compulsori<strong>ed</strong>ade da utilização<br />

do serviço público "se traduz pela impossibilidade jurídica do atendimento<br />

da respectiva necessidade por outros meios, ou pela cobrança da remuneração<br />

pela simples utilização potencial do ser~iço"~'. Observe-se que há, na<br />

transcrição, duas compulsori<strong>ed</strong>ades: a primeira, quanto ao uso; a segunda,<br />

quanto ao pagamento. Ora, no uso potencial, o que resta compulsório é o<br />

pagamento da taxa e não o uso do serviço a que ela se conecta.<br />

35. Direito, cit., p. 352.<br />

36. Taxa e preço público, Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 10, p. 144-5<br />

A nosso ver, esse critério também improc<strong>ed</strong>e. Em primeiro lugar, porque<br />

ele é por demais amplo: há serviços (como a administração de justiça<br />

com coerção3') que. no sentido alvitrado, seriam "compulsórios" (por falta<br />

de alternativa), mas não se concebe que sejam taxados quando não utilizados.<br />

Em segundo lugar, há serviços que, mesmo havendo outra forma de<br />

atendimento da necessidade do indivíduo (esgoto, por exemplo, onde haja<br />

alternativa legal de perfurarem-se fossas), podem ser taxados mesmo que<br />

não haja utilização efetiva, bastando que o Estado se tenha aparelhado convenientemente<br />

e haja posto o serviço a disposição do indivíduo.<br />

Aliomar Baleeiro, ao falar sobre o assunto, averbou: "Compulsório o<br />

pagamento, não o uso"3X. A frase, embora contrária a letra do Código Tributário<br />

Nacional, encerra um truísmo: o pagamento da taxa é compulsório,<br />

não apenas porque ela possui natureza jurídica de tributo, mas, mais genericamente,<br />

porque toda prestação que seja objeto de obrigação jurídica é<br />

compulsória no sentido de que deve ser atendida sob pena de cumprimento<br />

coercitivo. Flávio Bauer Noveli, em nota a <strong>ed</strong>ição póstuma da obra de<br />

Aliomar Baleeiro, adverte: "A despeito do afirmado no texto, o art. 79, I, b,<br />

se refere à 'utilização compulsória', isto é, uso compulsório"".<br />

Não nos parece que o equacionamento da questão esteja na "compulsori<strong>ed</strong>ade"<br />

de utilização do serviço, seja lá isso o que for. É verdade que.<br />

em alguns casos, haverá uma necessidade imperiosa de usar o serviço público<br />

(por exemplo, o serviço funeráriolO, se não houver alternativa lícita<br />

para disposição dos restos mortais de pessoa falecida; assim também o serviço<br />

de esgoto, se for v<strong>ed</strong>ada ou impraticável outra forma de dar vazão ao<br />

esgoto); noutros casos, a utilização do serviço será opção de racionalidade<br />

(por exemplo, usar o serviço público de coleta de lixo, em vez de, por seus<br />

próprios meios, removê-lo para um aterro sanitário ou enterrá-lo no quintal,<br />

ainda que isso não seja v<strong>ed</strong>ado por lei); noutros, faltará opção econômica<br />

(por exemplo, o serviço público de fornecimento de água, em região onde<br />

37. Sobre a natureza tributária das custas judiciais. cf. José Carlos Moreira Alves, A<br />

natureza tributária das custas e emolumentos e sua fixação por lei. in PriricQ>ios tributários<br />

no <strong>direito</strong> <strong>brasileiro</strong> e comparado.<br />

38. Direito. cit., p. 353.<br />

39. Direito, cit., p. 353, nota do atualizador. Aires Rarreto também registra sua<br />

discordância com a afirmação de Aliomar Baleeiro (As taxas na Constituição, in Comenfários<br />

ao Código Tribu!ário Nacional. v. 5. p. 31).<br />

40. Geraldo Ataliba e Aires Barreto sustentaram que o sepultamento é serviço obrigatório,<br />

portanto taxável pelo uso potencial (Considerações sobre a questão do p<strong>ed</strong>ágio<br />

f<strong>ed</strong>eral, DCI. 22 e 24 abr. 1989).

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