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Se o legislador quiser tributar a forma alternativa, basta fazê-lo de<br />

modo expresso, sem deixar para o intérprete a tarefa (ilegal) de estender o<br />

tributo para situações não previstas.<br />

A prática legislativa em nosso país (inclusive no plano constitucional)<br />

tem endossado essa exegese. Quando a Constituição prevê a competência<br />

dos Estados para tributar a transmissão causa mortis, confere-lhes também<br />

competência para gravar as doações, imp<strong>ed</strong>indo com isso que. m<strong>ed</strong>iante<br />

doação cÒm cláusula de usufruto, se evite o imposto na transmissão causa<br />

mortis. Também a lei ordinária, quando quer obstar que, por fórmulas jurídicas<br />

alternativas, se evada o tributo, explicita os diferentes negócios jurídicos<br />

hábeis a realizar o fato gerador.<br />

Na lição de Alberto Xavier, o legislador dispõe, no nosso <strong>direito</strong>, de<br />

diferentes mecanismos para evitar as formas de planejamento tributário.<br />

Partindo da distinção entre tipos estruturais e tiposfincionais, anota que,<br />

se o legislador se vale dos primeiros, é fácil escapar ao tributo, m<strong>ed</strong>iante a<br />

utilização de uma forma jurídica que não esteja catalogada na hipótese de<br />

incidência, mas, quando a lei refere tiposfincionais, em que a lei defina o<br />

resultado econômico da situação e não sua forma jurídica, o espaço para a<br />

economia fiscal diminui". O autor dá como exemplo de tipo funcional a<br />

definição de fato gerador do imposto de renda dada pelo art. 43 do Código<br />

Tributário Nacional, que fala em "aquisição de disponibilidade de renda",<br />

sem especificar a forma ou formas jurídicas pelas quais alguém pode adquirir<br />

renda"" Outra forma usual em nossa lei - diz Alberto Xavier - é a das<br />

presunções, com as quais o legislador busca fugir aos limites do tipo que<br />

estruturou, m<strong>ed</strong>iante equiparação de situações que tenham efeito equivalente;<br />

é o caso da distribuição disfarçada de lucros, na legislação do imposto,<br />

quando a lei considera como tal a prática, por uma empresa, de negócios<br />

de favor com pessoas ligadas, negócios esses que, na sua estrutura formal,<br />

não se confundem com os atos jurídicos m<strong>ed</strong>iante os quais normalmente se<br />

estrutura a distribuição de lucross6.<br />

Porém, na ausência de disciplina legal específica, não cabe ao intérprete<br />

ou ao aplicador da lei ignorar a forma ou a estrutura jurídica utilizada<br />

e substituí-Ia por outra, fiscalmente mais onerosa, a pretexto de que ambas<br />

levam ao mesmo resultado econômico e, por isso, igual deve ser o trata-<br />

54. Evasão e elisão ..., ABDF - Resenha, n. 15, p. 7.<br />

55. Evasão e elisão ..., ABDF - Resenha, n. 15, p. 7.<br />

56. Evasão e elisão ..., ABDF - Resenha, n. 15, p. 7-8.<br />

mento tributário, desprezando a circunstância de a estrutura jurídica utilizada<br />

não ter previsão na norma de incidência.<br />

10. A DISSIMULAÇÃO DO FATO GERADOR<br />

A Lei Complementar n. 10412001 acrescentou parágrafo único ao art.<br />

116 do Código Tributário Nacional, para dar à autoridade administrativa a<br />

faculdade de "desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a<br />

finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza<br />

dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os proc<strong>ed</strong>imentos<br />

a serem estabelecidos em lei ordinária".<br />

A disposição foi inserida no artigo que define o aperfeiçoamento do<br />

fato gerador da obrigação tributária, que estudaremos no capítulo d<strong>ed</strong>icado<br />

a esse tema. Quando o fato gerador da obrigação se traduzir numa<br />

situação jurídica. ele se considera ocorrido (gerando, por conseguinte, a<br />

obrigação tributária) desde o momento em que tal situação estiver definitivamente<br />

constituída, nos termos de <strong>direito</strong> aplicável (art. 116, 11). Vale<br />

dizer, é preciso identificar se, concretamente, foi aperfeiçoada determinada<br />

situação jurídica (apta a realizar o fato gerador) para que surja a obrigação<br />

tributária.<br />

Pode ocorrer que o indivíduo, para fugir ao cumprimento do dever<br />

tributário, atue no sentido de dissimular a ocorrência do fato gerador (ou a<br />

natureza de seus elementos), usando, para lograr esse intento, de roupagem<br />

jurídico-formal que esconda, disfarce, oculte, enfim dissimule o fato realmente<br />

ocorrido.<br />

Prevê o parágrafo transcrito que, observados os proc<strong>ed</strong>imentos a serem<br />

definidos em lei ordinária (portanto, lei do ente político competente<br />

para instituir o tributo cujo fato gerador possa ser dissimulado), a autoridade<br />

fiscal pode desconsiderar os atos ou negócios aparentes, que serviram de<br />

disfarce para ocultar a ocorrência do fato gerador.<br />

Essa disposição, obviamente, deve ser interpretada no sistema jurídico<br />

em que ela se insere, ou seja, em harmonia com as disposições do próprio<br />

Código e da Constituição. Não nos parece que proc<strong>ed</strong>am críticas fundadas<br />

em que a disposição teria dado à autoridade o poder de criar tributo sem lei. A<br />

autoridade, efetivamente, não tem esse poder. O questionado parágrafo não<br />

revoga o princípio da reserva legal, não autoriza a tributação por analogia,<br />

não introduz a consideração econômica no lugar da consideração jurídica.<br />

Em suma, não inova no capítulo da interpretação da lei tributária.

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