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da instrumentação para o negócio jurídico não chega a configurar ilegalidade.<br />
Essa zona de atuação legítima (economia lícita de tributos) baseia-se no<br />
pressuposto de que ninguém é obrigado, na condução de seus negócios, a<br />
escolher os caminhos, os meios, as formas ou os instrumentos que resultem<br />
em maior Ônus fiscal, o que, repita-se, representa questão pacífica.<br />
Acordes não obstante nessa premissa, os autores passam a polemizar<br />
inconciliavelmente quando alguns buscam estabelecer a linha divisória<br />
entre cáminhos que poderiam, sem maiores questionamentos, ser percorridos<br />
com economia de imposto legítima e aqueles cuja utilização (também<br />
com o mesmo fim de pagar menos ou nenhum imposto) já seria<br />
abusiva, ilegal, e, portanto, insuscetível de produzir o efeito querido pelo<br />
indivíduo".<br />
Alberto Xavier enumera diversas situações em que o indivíduo, utilizando-se,<br />
por exemplo, de uma compra e venda, busca efeitos de garantia:<br />
ou, valendo-se de uma locação a prazo longo, quer atingir os efeitos de uma<br />
compra e venda; ou, usando o mandato em causa própria, busca os efeitos<br />
de um mútuo et~.~'.<br />
Diversas abordagens exegéticas procuram, diante dessa questão, estabelecer<br />
critérios que possam, em face dos diversos caminhos que a prática<br />
sugere, segregar os lícitos e os ilícitos. Se a atuação do indivíduo percorre<br />
trilhas lícitas (no pressuposto de que, por outras sendas, seria tributado),<br />
diz-se que ele proc<strong>ed</strong>eu à evasão lícita, ou elisão, ou economia de imposto.<br />
Ao contrário, se, na tentativa de encontrar um percurso livre de ônus fiscais,<br />
o indivíduo adotou um roteiro ilegal, diz-se que ele praticou evasão<br />
ilegal (ou evasão, tout court)-".<br />
Mas isso nos devolve à questão inicial; o problema está exatamente<br />
em saber em que circunstâncias o meio utilizado é ou não lícito, na perspectiva<br />
da lei fiscal.<br />
39. Explica Raoul Lenz que, na Suíça, o Tribunal F<strong>ed</strong>eral aceita o <strong>direito</strong> de o contrihuinte<br />
arranjar seus negócios m<strong>ed</strong>iante a utilização das estruturações jurídicas existentes e<br />
da maneira que julgue adequada, mas com critérios restritivos; o primeiro destes, objetivo,<br />
consiste eni não acolher o uso de caminhos anormais; o segundo, subjetivo, refuta a escolha<br />
do caminho que tenha sido adotado com o único propúsito de economizar tributo (Elisão<br />
fiscal e a apreciação econômica dos fatos, in Princ@ios rriburúrios no direi10 bra.rileim e<br />
comptrrado, p. 593-4).<br />
40. Evasão e elisão fiscal e o art. 51 do Pacote. ABDF - Resenha, n. 15, p. 6.<br />
41. Para uma visão abrangente do tema, no <strong>direito</strong> comparado, v. João Dácio<br />
Rolim, Normas unrielisivas rrihurárius, e Cesar A. Guimarães Pereira, Elisüa rriburúrin<br />
fun(.cío adminisrrciriva.<br />
I<br />
I<br />
I<br />
Nesse cenário é que se põem as discussões sobre o abuso de forma, o<br />
abuso de <strong>direito</strong> e a simulação.<br />
O abuso dejorma consistiria na utilização, pelo contribuinte, de uma<br />
forma jurídica atípica, anormal ou desnecessária, para a realização de um<br />
negócio jurídico que, se fosse adotada a forma "normal", teria um tratamento<br />
tributário mais oneroso.<br />
Em certa m<strong>ed</strong>ida confundindo-se com o abuso de fomla, oabuso de <strong>direito</strong><br />
traduzir-se-ia em proc<strong>ed</strong>imentos que, embora correspondentes a modelos<br />
abstratos legalmente previstos, só estariam sendo concretamente adotados para<br />
fins outros que não aqueles que normalmente decorreriam de sua prática.<br />
Já a simulnpio seria reconhecida pela falta de correspondência entre o<br />
negócio que as partes realmente estão praticando e aquele que elas formalizam.<br />
As partes querem, por exemplo, realizar uma compra e venda, mas<br />
formalizam (simulam) uma doação, ocultando o pagamento do preço. Ou,<br />
ao contrario, querem este contrato, e formalizam o de compra e venda.<br />
devolvendo-se (de modo oculto) o preço formalmente pago.<br />
A teoria do abuso de forma (a pretexto de que o contribuinte possa ter<br />
usado uma forma "anormal" ou "não usual", diversa da que é "geralmente"<br />
empregada) deixa ao arbítrio do aplicador da lei a decisão sobre a "normalidade"<br />
da forma utilizada. Veja-se que o foco do problema não é a legalidade<br />
(licitude) da forma, mas a "normalidade", o que fere, frontalmente. os postulados<br />
da certeza e da segurança - do <strong>direito</strong>. Sempre que determinada forma<br />
fosse adotada pelo contribuinte para implementar certo negócio, ele<br />
teria de verificar se aquele modelo é o que mais frequentemente se utiliza<br />
para a realização daquele negócio; o critério jurídico seria substituído pelo<br />
critério estatístico, e as variadas formas que o <strong>direito</strong> cRou para instrumentar<br />
as atividades econômicas dos indivíduos seriam r<strong>ed</strong>uzidas a uns poucos<br />
modelos sue fossem "validados" fiscalmente.<br />
Parece-nos que, se a forma utilizada pelo contribuinte for lícita (vale<br />
dizer, prevista ou não defesa em lei), ela não pode ser considerada abusiva.<br />
o sue traduziria uma contradição.<br />
Ninguém pode ser obrigado, por exemplo, a utilizar a forma da compra<br />
e venda para transferir um imóvel para uma empresa (que seria uma operação<br />
sujeita a imposto de transmissão), se o indivíduo tem o <strong>direito</strong> de utilizar<br />
outra forma (igualmente lícita), que é a conferência do imóvel na integralização<br />
de capital da soci<strong>ed</strong>ade (operação que não estaria sujeita àquele imposto).<br />
O problema, portanto, não nos parece que possa ser solucionado com<br />
a simples consideração de que esta ou aquela forma é ou não a que "usu-