Parentesco e aliança entre os Kalapalo do Alto Xingu - Comunidade ...
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Como já vim<strong>os</strong> n<strong>os</strong> trabalho de Taylor (op. cit.) e Viveir<strong>os</strong> de Castro (1990, 1993b,<br />
1998), parece p<strong>os</strong>sível supor que sistemas classicamente tid<strong>os</strong> como “elementares” (como é o<br />
caso d<strong>os</strong> sistemas dravidian<strong>os</strong>) operem através de fórmulas complexas, pois na verdade<br />
qualquer tipo de sistema de parentesco, utilizan<strong>do</strong> qualquer um d<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> enunciad<strong>os</strong> por<br />
Héritier, pode operar de forma elementar ou complexa – é a idéia de que elementaridade e<br />
complexidade são men<strong>os</strong> tip<strong>os</strong> distint<strong>os</strong> de estruturas <strong>do</strong> que regimes a partir d<strong>os</strong> quais<br />
qualquer sistema de parentesco poderia operar.<br />
Nesta tipologia, o sistema kalapalo sem dúvida se enquadraria na definição de um<br />
sistema dravidiano operan<strong>do</strong> em regime complexo, pois todas as combinações de parâmetr<strong>os</strong><br />
elementares são permitidas (Ab, aB e AB). Mas, com uma peculiaridade: trata-se de um<br />
sistema no qual se verifica a coexistência de duas estruturas de troca, uma (patri)multibilateral<br />
e outra matrilateral - e aqui retornam<strong>os</strong> à idéia de Lévi-Strauss de que <strong>os</strong> sistemas não-<br />
elementares seriam formad<strong>os</strong> a partir da combinação de diferentes estruturas elementares de<br />
troca. Ainda, estas estruturas se encontram em relação hierárquica uma com a outra, e<br />
apresentam uma relação isomórfica com <strong>os</strong> casament<strong>os</strong> das filhas d<strong>os</strong> chefes e das filhas d<strong>os</strong><br />
homens comuns.<br />
Pela recorrência das formas de troca restrita, não haveria problema em enquadrá-lo no<br />
conjunto d<strong>os</strong> sistemas multibilaterais com este tipo de regime, não f<strong>os</strong>sem algumas<br />
características que destoam da paisagem etnográfica geral da Amazônia dravidiana, como o<br />
caráter não-prescritivo <strong>do</strong> sistema (que apenas proíbe o casamento com alguns pouc<strong>os</strong><br />
parentes definid<strong>os</strong> por grau, deixan<strong>do</strong> a escolha <strong>do</strong> cônjuge livre para o indivíduo) e seu ideal<br />
de casamento com a prima cruzada matrilateral, acompanha<strong>do</strong> de uma grande freqüência<br />
estatística de uniões deste tipo (diferin<strong>do</strong> da fórmula patrilateral que marca <strong>os</strong> sistemas<br />
multibilaterais). E como já notara Lévi-Strauss, a proporção objetiva d<strong>os</strong> casament<strong>os</strong> (sua<br />
estatística) reflete propriedades estruturais <strong>do</strong> sistema, e mesmo em sistemas preferenciais<br />
esta propriedade são isomórficas às d<strong>os</strong> sistemas prescritiv<strong>os</strong> (o que atesta a favor de se<br />
chamar a atenção para a p<strong>os</strong>sível existência de um “opera<strong>do</strong>r” matrilateral na organização<br />
social kalapalo).<br />
Portanto, esta preferência e realização efetiva <strong>do</strong> casamento assimétrico em muit<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> era um problema importante de ser resolvi<strong>do</strong>. Mas acabam<strong>os</strong> de ver que o casamento<br />
matrilateral <strong>entre</strong> <strong>os</strong> <strong>Kalapalo</strong> parece ter uma correspondência direta com a hierarquia d<strong>os</strong><br />
chefes: ao observar o modelo de troca matrilateral para as filhas d<strong>os</strong> chefes (que está<br />
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