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Parentesco e aliança entre os Kalapalo do Alto Xingu - Comunidade ...

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o cal<strong>do</strong> resultante <strong>do</strong> processo, <strong>do</strong> qual é feito uma bebida <strong>do</strong>ce (kwigiku ou “perereba”). Estas<br />

c<strong>os</strong>tumam ser áreas bem movimentadas, pois muitas vezes mulheres de diferentes grup<strong>os</strong><br />

<strong>do</strong>méstic<strong>os</strong> se reúnem para trabalhar e conversar em um mesmo ngüne unhalü mais espaç<strong>os</strong>o<br />

ou com maiores recurs<strong>os</strong> (mais bacias, panelas, rala<strong>do</strong>res, etc.), além de também ser ocupada<br />

pel<strong>os</strong> homens que fazem algum trabalho manual, como banc<strong>os</strong> (ugi) ou colares de caramujo<br />

(o objeto produzi<strong>do</strong> pel<strong>os</strong> <strong>Kalapalo</strong> no sistema de especialização econômica <strong>do</strong> <strong>Alto</strong> <strong>Xingu</strong> 52 ).<br />

Para além das casas estão o mato (atambape ou itsuni) e as roças (kwigi andagü). O<br />

atambape é o mato mais próximo da aldeia, que já sofreu a ação <strong>do</strong> homem. Já o itsuni é o<br />

mato no qual o homem não interferiu, o mato na sua forma mais natural, e é onde o perigo de<br />

se encontrar algum tseke (“espírito”) é maior. Os tseke são seres sobrenaturais que muitas<br />

vezes p<strong>os</strong>suem características simultaneamente humanas e animais e, a maioria deles,<br />

culturais 53 (têm aldeia própria, vivem como human<strong>os</strong>, têm chefes, luta<strong>do</strong>res, etc.), e<br />

representam perig<strong>os</strong> 54 potenciais para quem <strong>os</strong> encontre no mato, itsuni. Um tseke pode<br />

roubar a alma (akuã) de uma pessoa, por vontade própria (“porque quer coisas”; c.f<br />

CARDOSO, 2005b) ou a pedi<strong>do</strong> de algum feiticeiro, provocan<strong>do</strong> <strong>do</strong>enças que devem ser<br />

tratadas pel<strong>os</strong> xamãs, que indicam se há necessidade de oferecer rituais em pagamento ao<br />

tseke causa<strong>do</strong>r da <strong>do</strong>ença. A própria visão de um tseke significa que a pessoa morrerá em<br />

breve, e o contato direto com estes seres, um pouco raro, c<strong>os</strong>tuma ocorrer no mato mais<br />

distante da aldeia, onde estas forças não são controláveis pela potência <strong>do</strong>mesticável da<br />

cultura humana (controle que só pode se realizar de fato com a intervenção <strong>do</strong> xamã e da<br />

prática ritual). Nas roças também ocorrem cas<strong>os</strong> de aparição de tseke, mas o mais comum é<br />

que, ao invés de espírit<strong>os</strong>, elas sejam alvo de feiticeir<strong>os</strong> que queiram acabar com as plantações<br />

alheias. As roças são o espaço no qual homens e mulheres trabalham junt<strong>os</strong>, é onde a família<br />

nuclear atua em conjunto como unidade produtiva, cultivan<strong>do</strong> a mandioca (produto principal<br />

das roças) e, eventualmente, banana, amen<strong>do</strong>im e batatas.<br />

52 Os pov<strong>os</strong> <strong>do</strong> <strong>Alto</strong> <strong>Xingu</strong> p<strong>os</strong>suem um sistema étnico de especialização produtiva, que dá o “monopólio” de<br />

confecção de cert<strong>os</strong> artefat<strong>os</strong> a alguns grup<strong>os</strong>. Os <strong>Kalapalo</strong> detêm o monopólio da fabricação de colares de<br />

caramujo, objet<strong>os</strong> fundamentais da indumentária cerimonial da região (mas que são produzid<strong>os</strong> por vári<strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />

da região, já que são objet<strong>os</strong> que podem ser vendid<strong>os</strong> por preç<strong>os</strong> elevad<strong>os</strong> para <strong>os</strong> não-índi<strong>os</strong>), enquanto <strong>os</strong><br />

Kamayurá são <strong>os</strong> “<strong>do</strong>n<strong>os</strong>” d<strong>os</strong> arc<strong>os</strong> de madeira preta, <strong>os</strong> Waurá são <strong>os</strong> “<strong>do</strong>n<strong>os</strong>” da cerâmica e <strong>os</strong> Nahukwá são<br />

<strong>os</strong> “<strong>do</strong>n<strong>os</strong>” de um tipo específico de colar de caramujo (oĩke).<br />

53 Nem tod<strong>os</strong> p<strong>os</strong>suem tais características, pois alguns vivem sozinh<strong>os</strong> no mato, não conhecem a<strong>do</strong>rn<strong>os</strong><br />

corporais, festas e p<strong>os</strong>suem hábit<strong>os</strong> alimentares ou outr<strong>os</strong> tip<strong>os</strong> de comportamento reprovad<strong>os</strong> (como é o caso <strong>do</strong><br />

ahasa, representa<strong>do</strong> por uma forma “sub-humana” incapaz de produzir sua própria comida, que pratica o roubo<br />

de víveres e o canibalismo, ou a nhahügü, a “mulher <strong>do</strong> mato”, que vive sozinha e tem um apetite sexual<br />

incontrolável).<br />

54 Também nem tod<strong>os</strong> representam perig<strong>os</strong>: tseke que sejam “caciques” nunca deixam ninguém <strong>do</strong>ente.<br />

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