Parentesco e aliança entre os Kalapalo do Alto Xingu - Comunidade ...
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incorporação de não-parentes ao campo matrimonial quanto “aponta para <strong>os</strong> limites <strong>do</strong><br />
parentesco como ordem de totalização <strong>do</strong> social” (SOUZA, 1995, p. 159).<br />
Tal estrutura hierárquica produziria ainda uma “fratura na afinidade”, transforman<strong>do</strong>-a<br />
em um sistema tripartite que distingue <strong>entre</strong> afinidade “virtual” (ou “afinidade<br />
terminológica”), afinidade efetiva e afinidade potencial ou sociopolítica (cf. VIVEIROS DE<br />
CASTRO, 1993, 2002) – o que explicaria a necessidade que autores como Rivière e Basso<br />
tiveram de distinguir <strong>entre</strong> uma afinidade efetiva, “real”, e uma afinidade “em potência 90 ”.<br />
Este processo de fissão da afinidade teria conseqüências diversas para <strong>os</strong> sistemas n<strong>os</strong> quais<br />
opera, pois a distinção <strong>entre</strong> afins reais e terminológic<strong>os</strong> cria, com o esvaziamento da<br />
categoria d<strong>os</strong> cruzad<strong>os</strong> <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> da afinidade, a necessidade da afinidade potencial no pólo<br />
distal da op<strong>os</strong>ição hierárquica <strong>entre</strong> consangüinidade e afinidade. Em alguns cas<strong>os</strong>, esta forma<br />
da afinidade pode ser explorada p<strong>os</strong>itivamente pelo sistema matrimonial, através da<br />
preferência pelo casamento com cognat<strong>os</strong> “distantes” (voltad<strong>os</strong> para a periferia da parentela),<br />
com não-parentes ou mesmo com cognat<strong>os</strong> distantes reclassificad<strong>os</strong> como indivídu<strong>os</strong> não-<br />
aparentad<strong>os</strong>. Nestes sistemas, seria p<strong>os</strong>sível encontrar um deslocamento da afinidade em<br />
relação ao cruzamento, produzin<strong>do</strong> o desaparecimento da categoria da afinidade virtual em<br />
senti<strong>do</strong> estrito, cuja conseqüência seria a utilização de terminologias geracionais – como é o<br />
caso kalapalo, que produz uma “havaianização” na geração de Ego e tem uma preferência<br />
pelo casamento com parentes distantes.<br />
Souza (1992) testou estas hipóteses <strong>entre</strong> <strong>os</strong> sistemas xinguan<strong>os</strong> a partir de uma<br />
revisão da bibliografia disponível, e pôde de fato encontrar naqueles sistemas características<br />
que permitiram validar sua classificação como componentes <strong>do</strong> “dravidianato amazônico”.<br />
Por causa <strong>do</strong> fato da afinidade virtual próxima ser assimilada à consangüinidade e a afinidade<br />
virtual distante poder ser vista como a “afinidade em sua plena potência”, nestes sistemas o<br />
que se tem de fato é a reprodução (mais sociológica <strong>do</strong> que terminológica) da op<strong>os</strong>ição <strong>entre</strong><br />
consangüíne<strong>os</strong> e afins e da afinidade como um mo<strong>do</strong> de transmissão da <strong>aliança</strong><br />
(características que, segun<strong>do</strong> autores como Taylor 91 e Viveir<strong>os</strong> de Castro 92 , são <strong>os</strong> pont<strong>os</strong><br />
decisiv<strong>os</strong> na definição de um sistema como dravidiano ou não).<br />
90 Basso utiliza o termo “afinidade potencial”, mas em um senti<strong>do</strong> diferente daquele utiliza<strong>do</strong> por Viveir<strong>os</strong> de<br />
Castro. A expressão de Basso se aproximaria mais <strong>do</strong> conceito de “afinidade virtual ou terminológica” utiliza<strong>do</strong><br />
aqui.<br />
91 Cf. TAYLOR, op. cit.<br />
92 Cf. VIVEIROS DE CASTRO, 1998.<br />
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