José Capela118todos os navios da mesma nacionalidade de que, no dia 10 de Fevereiro de1830, deveriam sair impreterivelmente dos portos de África (230) .Em Maio de 1829, regressava a Quelimane o famigerado governadorCirne, que tinha ido de férias à Metrópole. No mesmo barco partia paraMoçambique o novo governador-geral, Paulo Miguel José de Brito. Nasinstruções confidenciais que o ministro deu a este último, incluía-se ade conferenciar a bordo com o Cirne que, apesar de ser um negreiro, lhepoderia ser de proveito. E que tivesse presente «que se a marcha da ordempública obriga muitas vezes a fechar os olhos a alguns desvios políticosnas colónias, pela falta de gente de graduados, que para aí se destinam,é isso mais necessário, principalmente em Moçambique, que ao presentesolto de toda a dependência, e interesses com a metrópole, tão diversassão as suas relações; pois ainda que o termo do comércio da escravaturadepois a ligará mais a Portugal, é preciso sustentar essa crise e promovero que para isso seja conducente» (231) . Era o reconhecimento do abandonoa que estavam votadas as colónias africanas, da parte do governo central,e a absolvição para o que se passava com a escravatura. Tanto nesta comoem outras instruções dadas ao governador, se sugere que procure outrotipo de actividades, dada a iminência do fim do tráfico. Mas nem Lisboaestava em condições de fazer mais do que recomendações nem uma classedominante local, inteiramente formada por negreiros, estava disponívelpara a revolução que se fazia mister. Uma vez em Moçambique, o novogovernador lastimava-se do «estado de desgraça e miséria geral em quese achava a capitania dos Rios de Sena, por efeito das secas, e outras causastanto físicas como políticas». Ainda havia numerário abundante noscofres da Fazenda devido ao grande tráfico da escravatura que florescerano período anterior (232) .Por sua vez Cirne, de novo em Quelimane, reabre as suas acusaçõescontra o governador-geral Xavier Botelho: que prejudicara Quelimane, nãorespeitando o privilégio de abertura do seu porto; vendendo passaportes,por avultadas quantias, a navios franceses que lá iam em negócios em queBotelho tinha parte; que permitia o contrabando a estes barcos; que o230 Gov. do Presídio de L. M. a Gov. Geral, 25/ /Nov./1829, A. H. U., Avs. de Moç., Maço 9.231 A. H. U., Avs. de Moç., Maço 9.232 Paulo José Miguel e Brito a Conde de Basto, 23/Out./1829, A. H. U., Avs. de Moç., Maço 7.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>governador e seus protegidos se assenhorearam do monopólio, vendendocaras as mercadorias e comprando baratos os escravos, etc. Procuravaprovar, com números, que a ida a Moçambique dos barcos resultava emgrande prejuízo para a Fazenda Real; e que se a admissão de navios emQuelimane, outrora para os escravos, agora que o negócio destes ia serproibido, com maioria de razão se justificava. Porque as riquezas naturais,como o ouro e marfim, que só iam para a Ásia, podiam passar a ir paraPortugal e seus domínios (233) . Tudo indica que Cirne era um tipo da piorespécie e que os seus interesses e actividades estavam inteiramente voltadospara os negócios da escravatura. As suas acusações têm portanto de serencaradas com sérias reservas. No entanto, uma informação do ConselhoUltramarino, de 10 de Setembro de 1830, dizia ser «tão grande o númerode arbitrariedades, excessos de autoridade e desobediências praticadaspelo dito Sebastião Xavier Botelho» que sugerem dever o Rei fazer-lheconstar o seu desagrado (234) .Vários factores houve que contribuíram muito particularmente paraexcitar o tráfico de escravos de Moçambique. A independência do Brasilfoi um deles. Como o seu reconhecimento pela Inglaterra esteve semprecondicionado à abolição do tráfico, em total oposição aos interesses brasileirosque dependiam da mão-de-obra escrava, veio tal contradição aincentivar uma corrida acelerada aos escravos africanos. Como, por suavez, os comerciantes de Moçambique se tinham deixado absorver inteiramentepelos lucros fáceis do mesmo negócio, a breve trecho brasileiros emoçambicanos coincidiam em sentimentos de independência relativamentea Portugal, condição que entendiam facilitar-lhes a consecução dos seusinteresses imediatos.O ex-governador Botelho, em 1832, estava a acusar Cirne de quererfazer o mesmo que se tinha feito em Moçambique em 1821. Esta provínciaestivera em rebelião e a capitania dos Rios de Sena, entrou nela, contrao Reino, querendo entregar-se ao Brasil, e não cumprindo as ordens dogoverno provisório. O que se pretendia, então e agora, era a autonomiaque permitisse aos governadores distribuir os prazos a seu belo talante e119233 Cirne a Conde de Basto, 6/Dez./1829, A. H. U., Moç., Maço 10.234 A. H. U., Avs. de Moç., Maço 13.E-BOOK CEAUP
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