José Capela58a sair em navios portugueses e o 1 % mal chegaria para cobrir os encargoscom o serviço aduaneiro.Mas pior foi a disposição imediata segundo a qual os estrangeiros poderiamcarregar os seus navios nos portos de Portugal, pagando dois porcento, com as mercadorias que, buscadas no país de origem, sofreriam àsaída o imposto de seis a dez por cento. Era afugentar do Brasil todos oseuropeus. Quem iria buscar ao Brasil o que poderia encontrar em Portugalcom direitos muito mais baixos? E como não ia lá carregar, também deixariade lá ir descarregar uma vez que a longa viagem se não justificaria semretorno. Era uma tentativa mais de reaver o monopólio sem legalmentese fecharem os portos brasileiros. A réplica brasileira foi violenta, atravésde Borges de Barros, Zeferino dos Santos e António Carlos: «Os brasileirostêm os precisos conhecimentos dos seus verdadeiros interesses, estão muitoadiantados em civilização e cultura para serem tratados como selvagens.Eles vêem, e todo o mundo vê, a tendência oculta desta medida. Portugalviria a ser o depósito único das produções do Brasil, a ele só concorreriamos estrangeiros a fornecer-se destes produtos, e no mercado brasileirodesde então deserto de qualquer outra competência, ditariam leis os negociantesportugueses e os seus agentes, e deste modo restabelecer-se-iaindirectamente o odioso exclusivo colonial.O mais interessante é que o mesmo Zeferino revelou a parte do relatórioda comissão extra-parlamentar, constituída pelos mais notáveis negociantesportugueses, segundo a qual «se conseguirmos, em virtude das providênciassujeitas ao soberano congresso sobre o comércio do Brasil que a trocados produtos do mesmo Brasil, Portugal e Algarves pelas manufacturasestrangeiros se verifique em a Praça de Lisboa, alcançamos vantagens muitosuperiores sem dúvida às que poderíamos esperar das fábricas».Passo do maior interesse pois nele se patenteia o conflito aberto entreduas burguesias já suficientemente trancadas, ambas, em interessesopostos. E o carácter vincadamente mercantil da burguesia portuguesaeminentemente interessada nos negócios monopolistas que antepunhaàs manufacturas.Cláusula tão gravosa para os interesses brasileiros foi mais do que umavez devolvida à comissão e de todas elas regressou às Cortes aí sendo defendidanomeadamente por Ferreira Borges «manhoso e com interesses2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>no comércio, na qualidade de secretário da Companhia do Alto Douro».Igualmente atacada, de novo, por Zeferino dos Santos, o Congresso não seatrevia a um pronunciamento defini tivo, dada a gravidade da contradiçãoapontada que podia levar até ao levantamento geral do Brasil. Dada, porém,a pressão da burguesia portuguesa é de supor que as Cortes viessem asancionar a medida, se entretanto não se tivesse dado esse acontecimentodefinitivamente significativo que foi a independência do Brasil.Já vimos as circunstâncias e os equívocos em que a escravatura e o seutráfico apareceram referidos nas Cortes e nos assuntos discutidos onde,aliás logicamente, se integravam. Mas onde foram marginais e decorrentesde outras questões, sem verdadeiramente se perceber que o que estavaem causa, no contexto do mercantilismo internacional, era justamente omodo de produção ainda subsistente no Brasil, baseado num sistema detrabalho escravo, e confrontado com o capitalismo industrial já prevalecenteem Inglaterra. Não deixa no entanto de surpreender que os «radicais»não tenham referido concretamente a escravatura. E se, por um lado,isso é perfeitamente explicável pelo estádio de desenvolvimento (ou denão desenvolvimento) das forças produtivas, quer em Portugal quer noBrasil, e pela situação muitas vezes referida das formações sociais que asdominavam, daí decorrente, não se pode esquecer, por outro lado e porexemplo, a influência exercida sobre as Constituintes pela Constituição deCádis. Os deputados tinham jurado solenemente cumprir o que lhes foracometido pelas Constituintes: «Dar-nos uma Constituição pelo menos tãoliberal como a espanhola - é um destes deveres e obrigações juradas» (97) . Nodecorrer das Constituintes ainda se esteve na fase mais ideal da revoluçãoliberal. Ora, em Cádis, são os homens «justos e esclarecidos» que lançamo primeiro grito espanhol de protesto contra a escravatura (98) . A 2 de Abrilde 1811, Arguelles, «com um lirismo belamente feroz, quer lavar o seu paísdo crime horrendo, atroz e desumano que constitui o facto de comerciarcom o sangue de nossos irmãos» (99) . No mesmo dia é apresentado um5997 Almeida Garrett, POLÍTICA, vol. I, Lisboa, 1904, pág. 2. Na sessão de 18 de Fevereiro de 1821, BorgesCarneiro, defendendo a invocação da Constituição espanhola: «porque estou persuadido que semela não estaria reunido este Congresso».98 Roberto Mesa, EL COLONIALISMO EN LA CRISIS <strong>DE</strong>L XIX ESPAÑOL, Madrid, s/d, Pág. 77.99 Idem, ibidem.E-BOOK CEAUP
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