José Capela96Como a transmissão dos prazos só podia ser feita por via feminina, ecomo escasseavam os portuguesa do reino, com quem as herdeiras deveriamcasar, e tendo repugnância em fazê-lo com negros, aconteceu teremestendido o recrutamento a funcionários governamentais e a goeses. Foiassim que governadores dos Rios de Sena levaram às famílias prazeirasposições e títulos por que estas tanto ambicionavam (182) .Segundo a memória de Miranda, eram as seguintes as casas mais importantesde Sena, além da de D. Inês: Martinho Mendes Vasconcelos, filhodo Reino, casado com uma goesa, com 500 escravos; António José PereiraSalema e Henrique Dias da Silva, filhos do Reino, casados com filhas daterra, com 400 escravos; Diogo Pereira Pinto e Sam Payo, filho do Norte,casado com uma filha da terra e 200 escravos; Luiz Roiz, do Reino, casadocom uma filha da terra, 500 escravos; Sebastião António de Souza, de Goa,com 700 escravos; D. Maria, da terra, viúva, com um filho casado com umagoesa, 200 escravos; Gil Bernardes Coelho de Campos, do Reino, com 400escravos; João Roiz Perdigão, casado com uma filha da terra, 150 escravos;José Carlos Coelho de Campos, do Reino, casado com uma goesa, com 400escravos; Bento da Cunha Rego, português, casado com uma filha da terra,com 600 escravos; José Caetano da Motta, português casado em Goa, com60 escravos; Eugénio da Silva Vasconcelos, de Goa, casado com uma filha daterra, com 500 escravos; Luís Lobo, patrício (183) , com 150 escravos; VicenteSerrão e Sousa, do Norte, com 800 escravos; Agostinho Viegas de Britto,do Norte, casado com uma goesa, com 800 escravos (184) .Na informação que, dois anos mais tarde que a data do códice com aenumeração acima, deu o governador Pereira do Lago, isto é, em 1768,dizia-se que na vila de Quelimane havia «casas na posse de terras por doaçõesreais e cartas de sesmaria de tanta grandeza, que receio padeça omeu crédito em dizer que tem sessenta léguas à margem do Zambeze,sem ser calculado o seu dilatado centro como é a terra do Báruè, a terraTambara, Luabo, e outras de pouca inferior reputação, mas todas como jáfica dito, sem mais produções que as de natureza...» (185) . Ainda segundo a182 Iaaacman, ob. cit., pág. 58.183 Filho de português ou de goês e de negra.184 In Andrade, ob. cit., pág. 260.185 In idem, pág. 327.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>mesma memória, se vê que em Tete havia nove casas das quais a mais ricaera senhora de 2 000 escravos e a mais pobre de 100; três delas tinham,respectivamente, 1 000, 1 200 e 1 600; uma 600 e as outras duas, uma200 e outra 300. Em Quelimane, além da mencionada casa de D. Catarina,havia ainda a do feitor do porto, com vinte a trinta escravos; e várias outrascom escravaria que ia dos 40 aos 500, em número.Por sua vez, Montaury, descrevendo as habitações dos senhores daZambézia, um tanto mais tarde (1778), diz dos moradores de Quelimane,uns vinte, serem «ricos, e bem estabelecidos e de alguns canarins (186) emulatos do país» (187) . As casas eram construídas com materiais da terrae «ornadas com móveis ricos, e de luxo». As casas de Sena, porém, erammelhores que as de Quelimane, mais luxuosamente mobiladas, mais ricas.Dizia o cronista haver nesta vila «considerável luxo, tanto no trato, comono vestir». Em Tete, havia menos moradores que em Sena mas mais do queem Quelimane; as casas eram de pedra, dada a abundância deste materialna região; «são a maior parte cobertas de telha, reina o mesmo luxo queem Sena, tanto no trato como ornato das casas» (188) . Miranda descreve avida dos europeus como sendo «todo afidalgado desde o mais ínfimo até omais superior. Desprezam os seus ofícios quando com eles podiam passaralegremente a vida; casam com algumas senhoras naturais e outras quede Goa descendem: e como todas são possuidoras de terras e fâmulos,jamais cuidam em a cultivação delas ou na boa disciplina daqueles (...).Quase todos dizem que descendem de progenitores ilustres e fidalgostitulares; mas são as suas acções humildes». A prática da mancebia tomavaproporções enormes, tendo alguns, de portas adentro, verdadeirosharens de cem e mais escravas para esse efeito e que, morrendo, deixavamcativas. Davam-se ao jogo até à ruína. Para as mais pequenas distânciasutilizavam a machila. Quanto às mulheres, fossem elas europeias, filhasda terra, ou goesas, diz Miranda, eram comumemente «altivas e de condiçãosoberba». E sem excepção davam-se dons e senhorias. Passavam todoo tempo em frivolidades e tinham à sua disposição 40, 50 e mais escravas97186 Termo depreciativo para designar os goeses. Sobre a sua história e significado, vide C. R. Boxer, RACERELATIONS, cit., pág. 84.187 In Andrade, ob. cit., pág. 355.188 Alexandre Lobato, ASPECTOS <strong>DE</strong> MOÇAMBIQUE NO ANTIGO REGIME COLONIAL, Lisboa, 1953, pág. 19.E-BOOK CEAUP
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