José Capela86netos, e a sua fortuna era avaliada em 20 000 000 de piastras (40 milhõesde cruzados, pouco mais ou menos). Este comerciante tinha sucursais eempregados para o sul de Novo Redondo, nas povoações entre esta e a deBenguela. Tinha ainda uma milícia permanente de 25 soldados armados.O pátio da sua casa tinha uma grande porção de pequenos edifícios paraarmazéns e muitos estavam cheios de marfim. Nos altos e sólidos muros querodeavam o pátio viam-se cadeias e argolas de ferro destinadas a castigoe encadeamento de escravos.Dos nove ou dez europeus de Novo Redondo, seis eram naturais deItália. Para ali tinham sido degredados, em 1818, numa leva de vinte e trêsou vinte e quatro italianos, e dos quais alguns já tinham morrido. Haviaosparricidas. Quase todos tinham adquirido fortuna suficiente para vivercomodamente na Europa. O aspecto e a falta de cultura indicavam «a suabaixa origem». Só um deles sabia escrever no próprio idioma.No porto de Luanda, os barcos demoravam-se muito pouco tempo porqueempregando-se a maior parte deles na exportação de escravos eramdespachados pelos donos residentes na cidade o mais rapidamente possível.Instalado na casa do médico, Tams descreve-a bem como à vida que levavao clínico. Havia numerosos escravos, criados e escravas que assistiam amulher, em mansão espaçosa e ricamente mobilada. Fala de um europeu,negreiro, que viajava a cavalo, sempre acompanhado por um criado branco,igualmente montado. Os escravos eram constantemente castigadose... «A ideia que prevalecia quase geralmente neste país, de que os negrosmão eram homens, mas - macacos - como usualmente lhes chamavamos portugueses, seria, talvez, a causa principal porque os escravos só emmuitas raras ocasiões encontravam algum tratamento mais humano daparte dos europeus».Contrasta este tipo de tratamento com o dos que, tanto em Benguelacomo em Luanda, tendo primeiramente sido escravos, se transformaramdepois em senhores e traficantes. Cita o caso de D. Ana Oberthali que tinha«nascido no interior de África, e havia sido trazida como escrava paraLuanda, onde vivia então com pompa, manejando um próspero negóciode escravatura». É já proverbial o retrato que Tams deixou da sociedade deLuanda no baile que semanalmente o governador oferecia aos «principaishabitantes que tinham a fortuna de se não acharem separados da estima de2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>S. Exa.» Havia uma multidão de pretos, brancos e mulatos. Todos eram negociantesde escravos, e nenhum havia que «recusasse entrar em qualquertransacção criminosa, com tanto que por meio dela pudesse aumentar osseus lucros». Quanto à sua proveniência: desde antigos escravos até «umhomem que tinha recebido a sua principal e única educação, como moçode câmara ou marinheiro; e que tendo vindo como prisioneiro a bordo deum navio de escravatura para esta cidade, em pouco tempo havia feito a suafortuna». Um outro «que tendo sim banido de Lisboa por vadio e criminoso,havendo sido educado pelas ruas da sua cidade natalícia, tinha recuperadoaqui a reputação, e adquirido tantas riquezas... ». Outro, «certos motivoso haviam obrigado a desertar de uma companhia de actores ambulantesda Madeira; o qual manejava então aqui o negócio mais lucrativo». Semqualquer cultura, «tais eram os elementos de que se compunha a sociedadeem Luanda; e nem por momentos um estrangeiro se poderá esquecer dacompanhia porque se haverá visto rodeado».Tams faz este avisado comentário: «As duas classes - agricultores eescravos - jamais poderão existir reunidas; e a extirpação da segunda seráa condição indispensável para a prosperidade da primeira. Entre os negrosda costa, nenhuma qualidade de indústria floresce, nem indício algumde actividade intelectual se descobre; porque aqui quase todos os negrostiram a sua subsistência, directa ou indirectamente, do tráfico da escravatura:- pelo contrário, no interior, onde a feitura de escravos em vez deser o negócio exclusivo, é inteiramente uma excepção, e um assunto deestado, sendo apenas manejado por alguns indivíduos, florescem em talproporção as artes e as manufacturas que as produções dos industriososhabitantes de Matamba, e as engenhosas manufacturas dos de Cassange,se fazem célebres por toda a parte. Refiro-me aqui particularmente, àcultivação de várias qualidades de grãos, e às manufacturações de tecidospara vestuário, tapetes, e cestos».De Luanda, a excursão dirigiu-se a Ambriz, onde o tráfico da escravaturaabsorvia todos os interesses. Algumas semanas antes da chegada tinhasaído um navio negreiro com quinhentos escravos. Perseguido pelo cruzadoringlês, o capitão fez varar e despedaçar o seu navio sobre os rochedose nenhum negro escapou. Havia unicamente sete armazéns em Ambriz:três portugueses, três americanos e um brasileiro. A população regulava87E-BOOK CEAUP
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