José Capela140atribui às pressões que sobre ele foram exercidas, pois tinha o marquês naconta de «firme, honrado e leal». Já o plenipotenciário britânico em Lisboa,Howard de Walden, considerou a circular da suspensão como um manifesto«primeiro, para a perpetuação do comércio de escravos em Moçambique;e segundo, para a apropriação de certos fundos como os produtos daqueleinfame tráfico» (301) . De facto, o governador de Quelimane, Thomaz Peres,para lá mandado para dar execução ao decreto, chegado a Moçambique,pediu instruções sobre «a minha principal missão, a qual estava, a todo ocusto, resolvido a dar cumprimento. A notícia da sua ida para Quelimaneprovocara grande efervescência em quase todos os habitantes «porquetodos eles são interessados no bárbaro e nefando tráfico dos escravos».Conseguiu que o deixassem partir de Moçambique para Quelimane mas,uma vez lá chegado, achou melhor não publicar logo o decreto de 1836,o que só veio a fazer em Junho de 1839, com um bando e demais formalidadesdo costume. Dentro de três meses, a partir de 1 de Agosto, teria a leiaplicação rigorosa. «A publicação do referido decreto foi recebida com ummorno silêncio, e com uma demonstração de geral descontentamento» (302) .Ora, o governo provisório, por portaria de 2 de Maio de 1839, proibiao de Quelimane de dar cumprimento às instruções de Lisboa, que ordenavama publicação do decreto. E embora o marquês de Aracaty tivessesuspendido a publicação, já isso tinha sido desaprovado pela Rainha que,por portaria de 23 de Junho de 1838, lhe mandava dar inteiro cumprimento,dando tempo «aos negociantes de retirarem os capitais destinados aotráfico que houvessem mandado para os sertões, prazo de que talvez setem abusado...» (303) .O brigadeiro Marinho era homem assomadiço e estava altamente despeitadopela maneira como fora exonerado do governo de Moçambique. Assuas opiniões são visivelmente apaixonadas. Têm, portanto, de ser devidamenteponderadas. Mas as diatribes que dedica ao conde do Bonfim, entãoministro da Marinha e Ultramar, parecem não ser totalmente despidas derazão. De facto, se Bonfim, por portaria de 29 de Abril de 1844, manda reprimiro tráfico, fá-lo considerando que se era «este negócio da escravatura301 <strong>DO</strong>CUMENTOS ACERCA <strong>DO</strong> <strong>TRÁFICO</strong> DA <strong>ESCRAVATURA</strong>..., Lisboa, 1840, pág. 26.302 Thomaz José Peres a Sá da Bandeira, 7/Ag./1839, A. H. U., Papéis de Sá da Bandeira, Maço 5.303 Pereira Marinho, ob cit., págs. 28 e segs.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>já melindroso, quando se publicou o Decreto de 10 de Dezembro de 1836,se tornou ainda de maior transcendência depois que o governo inglês fezpassar um Bill...». Esta portaria era confidencial e Marinho explica essedetalhe pelo facto de Bonfim, segundo ele protector de negreiros, pretenderfazer recair o odioso sobre o governador. Mas o mais curioso é queMarinho, dizendo ter sido o tenente-coronel Thomaz Peres promovido econdecorado pelos serviços prestados à constituição de Setembro, tambémele seria «aliado negreiro por tal conhecido no Rio de Janeiro, Cabo daBoa Esperança e Província de Moçambique, à qual aliança se lhe atribuia fortuna considerável. Por sua vez, o juiz de direito Joaquim Pompílioda Mata, fora igualmente setembrista e deputado às cortes constitucionais.Em Lisboa, fora recrutado pelo deputado de Moçambique e negreiroTheodorico José de Abranches, para ir para esta colónia contrabandearescravos, como o próprio lhe confessara perante testemunhas. E para lá foitrabalhar com Joaquim de Santa Anna Garcia de Miranda, que esteve nogoverno provisório que o antecedeu, e com Francisco António Cardozo, administradorda Alfândega e membro do mesmo governo. Caetano AntónioPeres da Silva, que era setembrista, não fora exonerado de secretário daFazenda, o que Martinho atribui ao facto de ter a protecção dos negreiros,com quem colaborava (304) .O que é verdade é que o negócio de escravos prosseguiu, com fluxos erefluxos ao ritmo determinado pela procura oriunda do Brasil e de Cuba,mais do que por qualquer outro motivo. Entrou-se nos anos quarenta combarcos negreiros a frequentarem impunemente os portos de Moçambique.A vigilância dos cruzadores ingleses era facilmente iludida. No delta doZambeze não oferecia qualquer dificuldade procurar portos secundários.E mesmo na baia de Lourenço Marques, onde um posto militar dominavao porto entravam constantemente os navios idos do Brasil. Alguns, comindícios seguros de irem a escravos, foram impedidos de receber carga, omesmo tendo acontecido a outro que apareceu sem papéis. Mas governadoresmilitares houve que fecharam os olhos ao contrabando, como foi141304 Pereira Marinho, ob. cit., pág. 88. Este juiz de Direito teria dito ao próprio governador-geral, noquartel-general, «alto e bom som que ia para Moçambique para mandar três navios carregados denegros a seu irmão que estava no Maranhão, e que depois não queria nada mais de Moçambique,nem do Governo». In idem, pág. 38.E-BOOK CEAUP
- Page 1:
EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6:
AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7:
ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13:
José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23:
José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 24 and 25:
José CapelaCom a extinção das co
- Page 26 and 27:
José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29:
José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31:
José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33:
José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35:
José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37:
José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39:
José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41:
José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43:
José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45:
José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47:
José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49:
José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51:
José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 52 and 53:
José Capelado tráfico da escravat
- Page 54 and 55:
José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57:
José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59:
José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61:
José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63:
José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65:
José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67:
José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69:
José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71:
José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73:
José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75:
José Capela74que puderam reduzir a
- Page 76 and 77:
José Capela76As posições políti
- Page 78 and 79:
José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 80 and 81:
José Capela80O próprio Sá da Ban
- Page 82 and 83:
José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85:
José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87:
José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89:
José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91: José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93: José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95: José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97: José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99: José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101: José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103: José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105: José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107: José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109: José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111: José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113: José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115: José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117: José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119: José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121: José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123: José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125: José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127: José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129: José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131: José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133: José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135: José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137: José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139: José Capela138Foi assim que o mini
- Page 142 and 143: José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145: José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147: José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149: José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151: José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153: José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155: José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157: José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159: José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161: José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163: José Capela162da Bandeira recusou
- Page 164 and 165: José Capela164negócio nada aprove
- Page 166 and 167: José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169: José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171: José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173: José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175: José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177: José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179: José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181: José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183: José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185: José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187: José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189: José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191:
José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192:
José Capela192SANCEAU, Elaine - D.