José Capela76As posições políticas desta abastada classe angolana seguiam exclusivamenteos seus interesses momentâneos que se resumiam à garantiada manutenção do fluxo de escravos para o Brasil. Um dos mais ricos dosseus elementos, António José da Silva Lisboa, em <strong>1810</strong>, fez parte de umgrupo numeroso, todos dispondo de meios para irem passar o resto dasua vida noutras paragens, que, afrontando o governo local, requereu emconjunto a saída de Angola. Pois foi ele mesmo que cedeu a sua embarcação«Bela Americana» para o transporte de tropas que foram participar noesmagamento da revolução pernambucana, fazendo ainda à sua custa asdespesas da viagem (140) . Desse grupo faziam parte, entre outros, JoaquimFonseca Negrão, natural de Angola, João Barbosa Rodrigues, possuidorda maior fortuna abaixo do Equador (141) . Por sua vez, Silva Lisboa tinharecebido da Corte, antes desta ter ido para o Brasil, privilégios dos maischorudos: Hábito da Ordem de Cristo, coronel de milícias de Massangano etesoureiro da Junta Geral da Fazenda (142) . Aliás, o governo central, no Rio,preocupava-se com a estabilidade dessa classe toda poderosa em Angolainstruindo o governador no sentido de convencer um dos mais abastadoscomerciantes de Luanda a não abandonar o território «porque convémnão somente ao Reais Interesses em geral, mas aos dessa Praça de Angolaem particular, que não se diminua assim sensivelmente o número dos seusNegociantes de grosso trato e acreditados fundos» (143) .No entanto, o governador-geral de Angola entendia que quanto aoscomerciantes de segunda e terceira classe, saindo mesmo uns dez oudoze, não causariam ao comércio local qualquer prejuízo. Alguns destescomerciantes eram dados como parentes, ou «favorecidos» e «dependentes»dos de grosso trato (144) .Esta ligação das burguesias angolana e brasileira manter-se-ia pelo menosenquanto durou o tráfico da escravatura, isto é, até passante de meadosda B., Pasta não numerada.140 Silva Rebelo, ob. cit., pág. 25.141 Deixou uma fortuna de três milhões de cruzadas. Quando morreu, a Corte mandou a Luanda a fragata«D. Pedro» para transportar os seus fundos para o Rio de Janeiro. Idem, pág. 151.142 Idem, págs. 42 e segs.143 Conde das Galveias a Governador-Geral de Angola, 16/Novembro/<strong>1810</strong>, A. H. U., Códice 551, in SilvaRebelo, ob. cit., pág. 347.144 Governador-Geral à Corte, 15/Julho/1811, A. H. U., Avulsos de Angola, Caixa 59.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>do século, o que é a mesma coisa que dizer durante um período em quePortugal não exercia efectivo domínio sobre o território. José Maria Matôzode Andrade Câmara, de uma família que estava em Angola pelo menosdesde os princípios do século XVIII, teve um conflito com o governadorPedro Alexandrino da Cunha, por estar metido no tráfico clandestino deescravos para o Brasil, de sociedade com Augusto Garrido. Foi pronunciadoem 11 de Janeiro de 1847 por contravenção ao decreto de 10 de Dezembrode 1836. Ele e Augusto Garrido foram, por esse motivo, exonerados daComissão Administrativa da Santa Casa da Misericórdia, lugares ocupados,certamente, por cidadãos de entre os mais em evidência na cidade. «Foihomem muito rico e poderoso, gozando de enorme influência na Província,no Brasil, e até em Portugal» (145) . Seu pai, Inocêncio Matôzo de Andradee Câmara, fora presidente da Câmara de Luanda em 1822, e foi ele querecusou o convite do Brasil para que Angola aderisse à sua causa.Muitos outros testemunhos se poderiam aduzir, confirmando a imbricaçãodas burguesias sedeadas nos portos angolanos e brasileiros e, se bemque nos não seja possível quantificar ou sequer esboçar a parte que tinhanos negócios processados entre as costas africanas e atlântica a burguesiade Lisboa, uma coisa é certa: os esclavagistas angolanos, se sofriam dedependência, esta residia nas relações com o Brasil e, de muito pouca ou nenhumamonta era relativamente a Portugal. Da metrópole europeia apenaspoderiam sentir a dependência política, e quando aquela pudesse exerceruma jurisdição efectiva. De resto, as ligações directas com o Brasil eramas ligações naturais, não apenas de tráfego comercial, como de todas ascomunicações que, a caminho e no retorno da Ásia e da África lá tocavam.Em 1835, o melhor encaminhamento da correspondência de Lisboa paraAngola era via Pernambuco e Rio de Janeiro. E para S. Tomé, pela Baía (146) .77145 Alberto Lamas, NÓTULAS HISTÓRICAS, Luanda, 1969, págs. 189-91, cit., in ANGOLANA II, Lisboae Luanda, 1971, pág. 485.146 A. H. U., Papéis de Sá da Bandeira, Maço 3. Em 1825, era manifesto o alarme de Luanda perante ahipótese de perder o negócio da escravatura para o Brasil. Dizia o governador para Lisboa que perante«a conjuntura em que talvez vão tomar deliberações, ou a formar-se convenções sobre a escravatura, esobre a consideração política que deve tomar o Brasil: tem publicado as gazetas do Rio de Janeiro queem Londres trabalham os comissionados portugueses e brasileiros protegidos pelo ministério inglêsem ajustes pacificadores. Depois de insistir na desgraça total que seria para Angola a extinção de talnegócio sugere uma maneira de tornear o que se vê claramente ser a pressão inglesa: «Convindo poisaos interesses da humanidade e aos da Nação Portuguesa o comércio da escravatura sendo talvez deE-BOOK CEAUP
- Page 1:
EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6:
AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7:
ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13:
José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23:
José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 24 and 25:
José CapelaCom a extinção das co
- Page 26 and 27: José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29: José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31: José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33: José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35: José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37: José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39: José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41: José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43: José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45: José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47: José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49: José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51: José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 52 and 53: José Capelado tráfico da escravat
- Page 54 and 55: José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57: José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59: José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61: José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63: José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65: José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67: José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69: José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71: José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73: José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75: José Capela74que puderam reduzir a
- Page 78 and 79: José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 80 and 81: José Capela80O próprio Sá da Ban
- Page 82 and 83: José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85: José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87: José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89: José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91: José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93: José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95: José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97: José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99: José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101: José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103: José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105: José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107: José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109: José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111: José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113: José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115: José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117: José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119: José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121: José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123: José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125: José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127:
José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129:
José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131:
José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133:
José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135:
José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137:
José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139:
José Capela138Foi assim que o mini
- Page 140 and 141:
José Capela140atribui às pressõe
- Page 142 and 143:
José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145:
José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147:
José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149:
José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151:
José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153:
José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155:
José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157:
José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159:
José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161:
José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163:
José Capela162da Bandeira recusou
- Page 164 and 165:
José Capela164negócio nada aprove
- Page 166 and 167:
José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169:
José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171:
José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173:
José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175:
José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177:
José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179:
José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181:
José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183:
José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185:
José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187:
José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189:
José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191:
José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192:
José Capela192SANCEAU, Elaine - D.