José CapelaCom a extinção das companhias monopolistas, nem por isso se segueque o grupo de privilegiados tenha perdido a manipulação do poder económicoa favor dos seus interesses. Mas estavam recuperados pelos mecanismosomnipresentes da ordem antiga. Diz Maxwell que «a opulência destesnobres-comerciantes portugueses do último quartel do século XVIII foicelebrada por poetas, panfletários e impressionou literatos e visitantes» (22) .Afigura-se perfeitamente justo o que, como conclusão, diz AmadeuLopes Sabino: o papel de Pombal foi o de criar as condições históricasque permitiram a consolidação e desenvolvimento do modo de produçãocapitalista, utilizando o Estado absolutista com funções próprias deEstado capitalista. O que beneficiou «fundamentalmente uma burguesiacomercial e industrial a haver, isto é, a surgir» (23) . O que só aconteceriamuito mais tarde.Deixando agora de parte a conclusão de Saraiva, temos como a peculiarestrutura de intumescência das classes não produtoras (24) , contracção dapopulação ocupada na actividade criadora das subsistências de base, mentalidadeconexa, arcaizante (jamais cedendo passo às tentativas isoladasdos estrangeirados) bem figurada nos «castiços» que, defendendo valores,defendiam antes de tudo os interesses estabelecidos (25) , atingiu o século XIX.2422 Kenneth R. Maxwell, ob. cit. Os três primeiros capítulos deste estudo constituem o único trabalhocompreensivo que conhecemos sobre a composição classista dos intervenientes na política económicae colonial pombalina; dado o escopo do autor, ficam obscuros bastantes aspectos que, desenvolvidos,poderiam esclarecer concludentemente o assunto em causa. É nesses três capítulos e ainda em FritzHoppe, A ÁFRICA ORIENTAL PORTUGUESA NO TEMPO <strong>DO</strong> MARQUÊS <strong>DE</strong> POMBAL (1750-1777),Lisboa MCLXX, pág. 301, que fundamentamos o exposto sobre a conclusão de Saraiva.23 Hobsbawm, ob. cit., págs. 35 e 36, afirma que tendo o iluminismo uma ideologia revolucionária,porque o era, os seus sequazes moderados entregaram a abolição da sociedade prevalecente e daordem política à monarquia absoluta, até 1780, na maior parte da Europa, pela razão simples deque nenhum antigo regime se iria abolir a si mesmo voluntariamente. Ao contrário, trataram dereforçar-se, em alguns aspectos, contra o avanço das novas forças económicas e sociais. Onde podiamencontrar o apoio era nas monarquias absolutas que, perante o sucesso do capitalismo britânico, eda concorrência internacional, procuraram desenvolver a coesão do estado, dominar as tendênciasanárquicas dos seus nobres e meter na burocracia funcionários não aristocratas, assim como, naúltima parte do século XVIII, tentar programas de modernização económica, social, administrativae intelectual. Adaptavam os meios mais actualizados para obtenção de rendimentos, riqueza e poder.24 Almeida Garrett, POLÍTICA, vol. I, Lisboa, 1904, pág. 37: «Quanto à justiça, Portugal era um povo dejuízes, jurisdições e alçadas; e a Relação do Porto chegou a contar trezentos desembargadores, e a isto seadicionarmos os oficiais de justiça, a multiplicidade de recursos, e delongas, incerteza de foros contenciosos,crescidas despesas, e perdas de tempo, acharemos em resultado que o povo português pagava aesta gente uma contribuição enorme...» In RELATÓRIO <strong>DO</strong> CÓDIGO ADMINISTRATIVO de 1832.25 Magalhães Godinho, ob. cit., pág. 93.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>Jaime Cortesão (26) põe em relevo um ritmo de fluxo e refluxo na sociedadeportuguesa, segundo o qual, até ao fim do século XV, a burguesiase desenvolve no nosso país e desempenha um papel preponderante. Noséculo XVI a nobreza retoma a iniciativa e o poder económico e político,poder político que jamais perdera, verdadeiramente. Nos fins do séculoXVI e durante o século XVII a burguesia volta a aparecer com o açúcar doBrasil. Burguesia ligada à actividade processada nos portos. Ao encerrar-seo século XVII, de novo sobressai a nobreza, tendo em mãos os meios deriqueza e do poder político (27) .O liberalismo, que fora tomando corpo pela Europa fora, encontravaassim uma sociedade portuguesa condicionada por estruturas ancestraise ao arrepio da evolução contemporânea. Nem a ascensão da burguesiaeuropeia verificada a partir de finais da Idade Média, nem o individualismoe o livre exame suscitados pela Reforma, o Humanismo do Renascimento,a filosofia de Descartes e Bacon, as teorias políticas de Espinosa, Hobbes eLeibniz, dos jus-naturalistas seiscentistas, toda essa movimentação sociale ideológica que precedeu e acompanhou a revolução inglesa de 1689, anada disso foi permeável o nosso antigo regime.Foi assim que, entre nós, e ao contrário do sucedido em Inglaterra eHolanda, a burguesia não chegou a apoderar-se do aparelho do Estado noséculo XVI, nem mesmo nos séculos XVII e XVIII, apesar da envergadurafinanceira e económica em que estiveram envolvidos os grandes comerciantesportugueses, no país e na Europa, até Pombal identificados pelodenominador comum de «cristãos-novos», segundo Saraiva.Não se verificou portanto a oposição frontal de uma burguesia mercantilprogressista a classes escravocratas, operando modos arcaicos de produção,como aconteceu por exemplo em Inglaterra.Já nos últimos tempos de setecentos e começos de oitocentos se2526 Idem, págs. 89 e segs.27 Em finais do século XVII, foi defendida a formação de companhias comerciais e várias foram organizadas.A iniciativa era de nobres metidos nos negócios coloniais e a quem não repugnava associarcomerciantes, o que chegou mesmo a ser imposto pelo governo central, em 1697. A uma companhiafundada, nesta data, pelo marquês de Angeja, vice-rei da Índia, foi concedido o alvará com a condiçãode os vice-reis participarem nela com metade do seu soldo. Fritz Hoppe, ob. cit., págs. 34, 35, 391 epassim.E-BOOK CEAUP
- Page 1: EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6: AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7: ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13: José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23: José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 26 and 27: José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29: José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31: José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33: José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35: José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37: José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39: José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41: José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43: José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45: José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47: José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49: José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51: José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 52 and 53: José Capelado tráfico da escravat
- Page 54 and 55: José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57: José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59: José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61: José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63: José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65: José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67: José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69: José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71: José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73: José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75:
José Capela74que puderam reduzir a
- Page 76 and 77:
José Capela76As posições políti
- Page 78 and 79:
José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 80 and 81:
José Capela80O próprio Sá da Ban
- Page 82 and 83:
José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85:
José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87:
José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89:
José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91:
José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93:
José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95:
José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97:
José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99:
José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101:
José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103:
José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105:
José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107:
José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109:
José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111:
José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113:
José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115:
José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117:
José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119:
José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121:
José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123:
José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125:
José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127:
José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129:
José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131:
José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133:
José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135:
José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137:
José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139:
José Capela138Foi assim que o mini
- Page 140 and 141:
José Capela140atribui às pressõe
- Page 142 and 143:
José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145:
José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147:
José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149:
José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151:
José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153:
José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155:
José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157:
José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159:
José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161:
José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163:
José Capela162da Bandeira recusou
- Page 164 and 165:
José Capela164negócio nada aprove
- Page 166 and 167:
José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169:
José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171:
José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173:
José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175:
José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177:
José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179:
José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181:
José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183:
José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185:
José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187:
José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189:
José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191:
José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192:
José Capela192SANCEAU, Elaine - D.