José Capela80O próprio Sá da Bandeira descreveu a guerra que foi feita à sua política,especialmente em Angola e Moçambique, mas também em Portugal,assim como as injúrias e ataques que lhe ocasionou (152) . As coisas estavamde tal maneira radicadas e ligadas a interesses que, a 16 de Março de1839, Sá da Bandeira despachou no sentido de ser incriminado ManoelBernardo Vidal, antigo governador-geral de Angola, que não só não deracumprimento ao Decreto de 10 de Dezembro de 1836, alegando legislaçãoanterior, como autorizava o negócio dos escravos desde que lhe pagassem800$000 réis por navio (153) .A 25 de Janeiro do mesmo ano o Município de Luanda dirigia umamensagem ao novo governador-geral, mandado por Sá da Bandeira paraexecutar o decreto, o vice-almirante Noronha. Nesse documento, os áulicosda cidade, em termos sibilinos, deploram «a próxima aniquilação desta tãorica parte da Monarquia Portuguesa», numa evidente alusão à extinção dotráfico. E afirmam: «é a nossa opinião que convenceu e assegurou o Ex.mo Governador Vidal, de que os cidadãos deste Município de bom gradotragariam toda a qualidade de sacrifício, e mesmo de abusos, menos o deverem por uma crise violenta e prematura aniquilar em dias suas pequenase grandes fortunas, reduzindo-se o litoral de Angola, em poucos meses, aum bocado de costa de África igual ao de Cabo Negro». Assim se declaravauma oposição frontal à supressão do «reprovado comércio que infelizmentemantém e dá existência a estas possessões»; que admitiam dever acabarmas de «uma maneira política e a única possível; de uma maneira que nãoacabe consigo a existência destes povos...». Além disso - alegam - tais medidasem nada beneficiariam a sorte dos escravos africanos; estes seriamvendidos noutros pontos da costa «e o nosso gabinete não conseguiria maisdo que acabar com as suas possessões» (154) .A 5 de Junho do mesmo ano de 1839, isto é, a menos de seis meses dasua chegada a Angola, já Noronha escrevia a Sá da Bandeira: «Vim acabarcom o único ramo de comércio que trazia em giro os capitais desteshabitantes; fechou a alfândega e consequentemente causou um déficit nobalanço geral da receita e despesa que talvez venha a ser de quase dois152 O TRABALHO RURAL, cit., págs. 17-18.153 DIÁRIO <strong>DO</strong> GOVERNO, de 15 de Maio de 1839.154 Idem, ibidem.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>terços da totalidade deste». Considerava-se de tal maneira odiado por sero executor dessas medidas, que pedia para deixar o governo de Angola,uma vez que outro seria melhor recebido (155) .Em 1837 entraram no porto de Havana 48 navios com a bandeira portuguesa,depois de terem desembarcado escravos na vizinhança (156) . Nomesmo ano devem ter entrado no Rio de Janeiro 93 navios do tráfico negreiro,com bandeira portuguesa, que desembarcaram nessa província41 000 escravos (157) . Em 1838, saíram de Benguela 20 000 escravos (158) .Neste ano, foram a Havana 44 navios com bandeira portuguesa, estimando--se, para cada, 443 escravos, pelo que devem ter levado um total de 40 700.E para o Rio, nas mesmas condições, 38 700 escravos.Reacções, revestidas de carácter violento, prolongaram-se durante largotempo e não se restringiram, evidentemente, às capitais mas estenderam-seaos portos onde actuavam os negreiros, como o de Ambriz (159) . Em Portugal,as reacções à política colonial de Sá da Bandeira tinham expressão numórgão de Imprensa (160) que, tudo o indica, foi lançado para defender osinteresses dos negreiros de África, porventura também os da burguesia deLisboa que lhe eram conexos. Lastima a sorte dos capitalistas angolanos quese viram privados dos seus negócios, e impossibilitados de aplicar os seuscapitais, dada a incúria do governo, que não criara condições para que aabolição do tráfico encontrasse alternativa. Assim, os capitalistas angolanosviam-se obrigados a abandonar a colónia. Por outro lado, ataca furiosamentea governação de Noronha, que ridiculariza ao longo das suas edições.Apesar de todas as lástimas choradas pelos escravocratas angolanos eseus porta-vozes, o que é facto é que, como dissemos, eram eles que dominavama sociedade dos portos de Angola, nos primeiros anos quarenta, deoitocentos. Para este período, dispomos de uma pormenorizadas descriçãofeita pelo médico de uma excursão comercial, George Tams (161) . Não se81155 Sá da Bandeira, ob. cit., págs. 17-18.156 <strong>DO</strong>CUMENTOS ACERCA <strong>DO</strong> <strong>TRÁFICO</strong> DA <strong>ESCRAVATURA</strong>..., Lisboa, 1840, pág. 82.157 Idem, ibidem.158 Hammond, PORTUGAL AND AFRICA, cit., pág. 53.159 General Ferreira Martins, FIGURAS E FACTOS DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA, Lisboa, 1944, pág. 44.160 PAQUETE <strong>DO</strong> ULTRAMAR, diário, publicado desde 5 de Julho de 1839 até 27 de Março de 1840 eeditado por H. M.161 VISITA AS POSSESSÕES PORTUGUEZAS NA COSTA OCCI<strong>DE</strong>NTAL D’AFRICA, por George Tams,Porto, 1860. Tudo o que se segue relativamente a Angola é retirado desta obra.E-BOOK CEAUP
- Page 1:
EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6:
AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7:
ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13:
José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23:
José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 24 and 25:
José CapelaCom a extinção das co
- Page 26 and 27:
José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29:
José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31: José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33: José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35: José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37: José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39: José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41: José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43: José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45: José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47: José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49: José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51: José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 52 and 53: José Capelado tráfico da escravat
- Page 54 and 55: José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57: José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59: José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61: José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63: José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65: José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67: José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69: José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71: José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73: José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75: José Capela74que puderam reduzir a
- Page 76 and 77: José Capela76As posições políti
- Page 78 and 79: José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 82 and 83: José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85: José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87: José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89: José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91: José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93: José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95: José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97: José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99: José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101: José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103: José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105: José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107: José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109: José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111: José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113: José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115: José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117: José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119: José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121: José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123: José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125: José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127: José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129: José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131:
José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133:
José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135:
José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137:
José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139:
José Capela138Foi assim que o mini
- Page 140 and 141:
José Capela140atribui às pressõe
- Page 142 and 143:
José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145:
José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147:
José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149:
José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151:
José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153:
José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155:
José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157:
José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159:
José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161:
José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163:
José Capela162da Bandeira recusou
- Page 164 and 165:
José Capela164negócio nada aprove
- Page 166 and 167:
José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169:
José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171:
José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173:
José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175:
José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177:
José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179:
José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181:
José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183:
José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185:
José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187:
José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189:
José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191:
José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192:
José Capela192SANCEAU, Elaine - D.