José Capela164negócio nada aproveitava a Portugal porque sendo eles, os negreiros, emgrande parte de nascimento português, estavam no Brasil e para lá faziamreverter todos os lucros, só se lembrando da Pátria quando precisavam dasua protecção (332) . Portanto, o mais que a este respeito se pode dizer comsegurança, é que mesmo que em Lisboa não houvesse interesses no tráficodos escravos, também não havia nenhuma oposição contra ele, bem pelocontrário. Exceptuando alguns governantes setembristas.Que Sá da Bandeira, ao publicar o Decreto, não agia em conformidadecom nenhuma das fracções da burguesia nacional, tal nos é garantido insofismavelmentepelo próprio Walden, que testemunhava a Sá da Bandeiraem pessoa: «É V. o único homem que conheço neste país que parece teruma visão de verdadeiro estadista sobre as importantes consequências queresultam - para Portugal - da abolição do tráfico da escravatura nas suascolónias africanas. É pois com o maior respeito que o vejo arcar com todasas responsabilidades pelas consequências que possam resultar de umaséria discordância connosco acerca desta questão, quando é certo que V.seria a última pessoa a merecer que tal coisa lhe sucedesse» (333) . O mesmodizia Marinho (334) . E é pelo menos curioso anotar que o jornal setembrista«A Vedeta da Liberdade» (335) tenha assinalado a publicação do Decretolouvando-o, exclusivamente, por razões morais e sentimentais.Com a maior clarividência, Oliveira Martins viria a dizer que o sistemacolonial português ficou completamente arruinado com a separação doBrasil e com a abolição do tráfico de escravos em África. Predominavao pensamento económico de Mouzinho que preconizava o regresso dosportugueses ao chão europeu. E - prossegue Oliveira Martins - «apenasSá da Bandeira instava pela volta à política colonial; mas fazia-o de ummodo indiscretamente humanitário, esperando construir um Brasil emÁfrica com o trabalho livre e a concorrência e garantias liberais. Nistose mostrava o seu romantismo. A sua preocupação passava por mania echegava a sê-lo» (336) .332 Pereira Marinho, ob. cit., pág. III.333 Arquivo Histórico Militar de Lisboa, 3.ª Divisão, 18.ª Secção, Caixa n.º 14, Walden a Sá da Bandeira,12/Nov./1838.334 Ob. cit., pág. 101.335 Artigo «O Decreto da Abolição da Escravatura», edição de 4 de Janeiro de 1837.336 PORTUGAL CONTEMPORÂNEO, II vol., 6.ª ed., Lisboa, 1925, pág. 130.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>Metido na contradição apontada, Sá da Bandeira antecipou-se à interferênciainglesa, tentativa infrutífera, dado que Palmerston estava perfeitamenteinformado da situação e sabia que o decreto seria inteiramenteineficaz. Com Sá da Bandeira fora do governo, os negreiros sabiam muitobem dizer que o decreto não passava de uma impostura usada pelo governopara inglês ver e que o próprio ministro da Marinha e Ultramar queria o tráfico.Marinho afirma tê-1o ouvido a diversos negreiros em Cabo Verde, Riode Janeiro e Moçambique. Que lhe chamavam estúpido por ele, Marinho,acreditar tanto no decreto!... (337) .Do exposto resulta igualmente claro porque é que Sá da Bandeira serecusou terminantemente, e até ao fim, a subscrever um novo tratado comos ingleses. Era a incapacidade de o governo impor uma medida que asdiversas burguesias nacionais, metropolitanas e coloniais, não aceitavam,agora com razões bem especificadas ao longo das discussões. Questões quefaziam parte de um contencioso entre Portugal e a Inglaterra e, algumasdelas não dizendo embora directamente respeito à supressão do tráfico,eram a este conotadas pela parte portuguesa, na expectativa de compensaro que tivesse que ceder aí.A primeira, os tratados comerciais. Na conferência de Viena, já Portugalse propusera abolir o comércio da escravatura ao fim de 8 anos, com acondição de a Inglaterra renunciar também a cláusulas opressivas do tratadode <strong>1810</strong> (338) . Palmela acusava a Inglaterra de não cumprir o tratadode <strong>1810</strong>, interpretando-o unilateralmente (339) . Em 1818, no Congresso deAix-la-Chapelle, onde Portugal não esteve oficialmente representado, o observadorportuguês, como compensação às instâncias dos plenipotenciáriosdas outras potências, que exigiam a fixação de uma data para abolição dotráfico da escravatura em Portugal, queria uma modificação nas relaçõescomerciais entre Portugal e a Grã-Bretanha (340) . Em 1825 Palmela fora encarregadode declarar ao governo inglês que Portugal estava na disposiçãode suspender o tratado de <strong>1810</strong>. Entabularam-se negociações que quasechegaram ao seu termo mas que os acontecimentos provocados pela morte165337 Pereira Marinho, ob. cit., pág. 95.338 O INVESTIGA<strong>DO</strong>R PORTUGUEZ, Março de 1815. Sá da Bandeira, O <strong>TRÁFICO</strong>, cit., pág. 10.339 José da Almada, ob. cit., I, pág. 181.340 Idem, pág. 258.E-BOOK CEAUP
- Page 1:
EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6:
AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7:
ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13:
José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20:
As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23:
José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 24 and 25:
José CapelaCom a extinção das co
- Page 26 and 27:
José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29:
José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31:
José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33:
José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35:
José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37:
José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39:
José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41:
José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43:
José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45:
José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47:
José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49:
José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51:
José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 52 and 53:
José Capelado tráfico da escravat
- Page 54 and 55:
José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57:
José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59:
José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61:
José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63:
José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65:
José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67:
José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69:
José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71:
José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73:
José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75:
José Capela74que puderam reduzir a
- Page 76 and 77:
José Capela76As posições políti
- Page 78 and 79:
José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 80 and 81:
José Capela80O próprio Sá da Ban
- Page 82 and 83:
José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85:
José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87:
José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89:
José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91:
José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93:
José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95:
José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97:
José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99:
José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101:
José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103:
José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105:
José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107:
José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109:
José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111:
José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113:
José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115: José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117: José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119: José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121: José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123: José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125: José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127: José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129: José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131: José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133: José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135: José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137: José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139: José Capela138Foi assim que o mini
- Page 140 and 141: José Capela140atribui às pressõe
- Page 142 and 143: José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145: José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147: José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149: José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151: José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153: José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155: José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157: José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159: José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161: José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163: José Capela162da Bandeira recusou
- Page 166 and 167: José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169: José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171: José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173: José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175: José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177: José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179: José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181: José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183: José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185: José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187: José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189: José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191: José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192: José Capela192SANCEAU, Elaine - D.