José Capelado tráfico da escravatura pelo tratado de 1815, sugerem a utilização dosrecursos mais convenientes para se recuperar tal comércio. E propõem,então, a criação de duas companhias, uma na costa ocidental e outra nacosta oriental de África, às quais fosse dado o exclusivo de todos os produtosnovos de indústria, ou naturais, que pudessem exportar. Consideravam,porém, tal iniciativa como «incerta, dispendiosa e arriscada» e impossívelde realizar individualmente Mas companhias bem dirigidas poderiamobter de África o que provinha do Brasil e ainda produtos que lhe erampeculiares, como o óleo de palma, ferro, marfim, cola, etc (91) .Se é certo que tal sugestão dá bem ideia da consciência que os comerciantesde Lisboa tinham acerca das dificuldades e contradições com que sedeparavam, já é mais problemático admitir que estivessem dispostos, desdelogo, a reconverter a exploração comercial, virando-a para a África O queé confirmado pela discussão durante o funcionamento das Constituintes,onde a recuperação do mercado do Brasil tomou aspectos de obsessão5291 Idem, pág. 10.A luta da burguesia mercantil portuguesa pela manutenção do mercado brasileiro prolongar-se-ia muitopara além da independência do Brasil e foi uma constante antes e depois de 1820, das representaçõesda classe junto da Coroa e dos governos. Numa delas, de 14 de Dezembro de 1825, os negociantes efabricantes da praça de Lisboa estavam a reclamar junto do Rei o retorno à metrópole do comércio dacosta de África desviado para o Brasil. Este comércio tinha sido «um dos mais lucrativos e vantajososdestes Reinos», mas «veio de todo a trasladar-se ao Brasil, onde as relações que produzia então a novametrópole, duplicamente aí o atraiu: no reinado do sr. D. João V de gloriosa memória como é notório,a quem passou as folhas e notícias do tempo, passava de mais de 30 navios os que a praça de Lisboaanualmente despachava só para Angola, deixando os mais portos da Costa Ocidental de África, o quefazia um equivalente ao terço do comércio total que nessa época feliz se fazia para o Brasil».A guerra com os holandeses privara os exportadores portugueses não só dos mercados da Áfricacomo depois se deu a interrupção do comércio com o Brasil, devido às desordens constantes nosseus portos que impedia estes também de transaccionar com Angola. Nesta emergência, a praça deLisboa tentou investir na restauração do comércio com a África. Na concorrência porém «vai conhecidaperda pela igualdade em que ao momento se acham com o comércio britânico que não pagammais dos mesmos 15 por cento estipulados no dito Tratado a favor de Portugal mas o que há mais, otráfico que os suplicantes vinham de abrir com Angola e portos de África de todo perecerá uma vezque ao menos se não faça então extensivo em seu auxílio para os ditos portos, o mencionado tratadoconsiderando-se o Brasil Independente. Reino separado toda a razão se dava e haveria para que fosseproibida a sua navegação para aqueles portos bem como é para todas as outras nações estrangeiras...».Alegam mais os comerciantes não poderem concorrer com os produtos idos do Brasil, porque mesmoaqueles que provinham do Norte da Europa eram muito mais favorecidos no Brasil quanto a direitos,baldeação, etc., do que em Lisboa. Chegavam mesmo a ser reembarcados para África com prejuízo,este a ser coberto com produtos de retorno. E concluíam: «Isto é conhecido, e isto é palpável, bemcomo a todo o discreto juízo e será que as fábricas do Reino, e ofícios mecânicos... virão a morrerde todo». In Manuel dos Anjos da Silva Rebelo, RELAÇÕES ENTRE ANGOLA E BRASIL 1808-1830,Lisboa, MCMLXX, págs. 421 e segs.2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>(que se manteria, até muito mais tarde), e não é bastante para o admitirum projecto que não ultrapassa hipótese aleatória e reticente, nos própriostermos em que é apresentado. Além disso, mesmo sem se insurgirem contraa supressão do tráfico ao norte do Equador, a transformação profunda queimplicava a nova exploração de África, tão debilmente formulada, nãoé, de modo nenhum, equacionada. Nomeadamente no que respeita aosproblemas a pôr ao sistema de trabalho escravo e ao seu tráfico.Curiosamente, os comerciantes do Porto começam por lastimar a faltade armazéns da Alfândega, o que tinha motivado acabasse «o mercadodiário dos géneros do Brasil, o qual se fazia no antigo cais de descargacom notável facilidade dos compradores e vendedores que ali acorriama toda a hora do dia» (92) . Se cria perplexidade a ausência de registo deoutras causas para a decadência do comércio dos produtos coloniais, poroutro lado patenteia-se a importância que o mesmo comércio tinha na cidade.O que é confirmado pela afirmação, mais adiante, de que o comérciocom o Brasil é «o que certamente emprega a maior parte dos cabedais dosportugueses...» (93) . E para o restaurar propõem, tão simplesmente, que seaprove o que falta do projecto de decreto sobre as relações comerciais entreo Brasil e Portugal, apresentado ao Congresso. Uma das subalternidadesque a classe do Porto refere, relativamente à de Lisboa, é a da proibiçãoque a Praça sofre, desde há séculos, de comerciar com a Ásia. O que tinhafeito «acumular riquezas na capital, a despeito das províncias... » (94) .Em qualquer caso, pode afoitamente afirmar-se que a grande burguesiacomercial portuguesa não se punha a si mesma quaisquer problemasoriundos do facto de a produção colonial assentar num sistema de trabalhoescravo, e nem sequer manifestava especiais preocupações com asinterferências que o tráfico estava a sofrer. Nessa altura, no decorrer dasConstituintes, a África não era a alternativa que de imediato respondesseaos problemas criados pela situação incerta do Brasil. Começa, isso sim,a falar-se muito vagamente da hipótese africana, como aliás já se falaraantes. Mas enquanto Saldanha da Gama, em 1814, como vimos, percebia5392 RESULTA<strong>DO</strong> <strong>DO</strong>S TRABALHOS DA COMISSÃO <strong>DO</strong> COMMERCIO DA PRAÇA <strong>DO</strong> PORTO..., Porto,1823, pág. 5.93 Idem, pág. 10.94 Idem, pág. 13.E-BOOK CEAUP
- Page 1: EDIÇÕESELECTRÓNICASCEAUPAS BURGU
- Page 5 and 6: AS BURGUESIAS PORTUGUESASE A ABOLI
- Page 7: ÍNDICEPREFÁCIO 9INTRODUÇÃO 111.
- Page 12 and 13: José Capela12Estudar, pois, a abol
- Page 15 and 16: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 17 and 18: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 19 and 20: As Burguesias Portuguesas e a Aboli
- Page 22 and 23: José Capela22da tal ordem senhoria
- Page 24 and 25: José CapelaCom a extinção das co
- Page 26 and 27: José Capela26defrontavam em Portug
- Page 28 and 29: José Capelaexpansão que dela se p
- Page 30 and 31: José CapelaOra, a primeira de toda
- Page 32 and 33: José Capela32retirada dos monopól
- Page 34 and 35: José CapelaSe pode aceitar-se como
- Page 36 and 37: José Capelada consideração sober
- Page 38 and 39: José Capela38«Tolos eram os portu
- Page 40 and 41: José Capelapronto, e que era miste
- Page 42 and 43: José Capela42comércio legítimo n
- Page 44 and 45: José Capelaem que este comércio d
- Page 46 and 47: José Capela46Porto do que em Lisbo
- Page 48 and 49: José Capela48metrópole» (81) . M
- Page 50 and 51: José Capela50momentâneo bem da ag
- Page 54 and 55: José Capela54que o tráfico da esc
- Page 56 and 57: José Capela56Mas os brasileiros ta
- Page 58 and 59: José Capela58a sair em navios port
- Page 60 and 61: José Capelaprojecto para proibiç
- Page 62 and 63: José Capelaefeitos da convulsão p
- Page 64 and 65: José Capelaexactamente porque não
- Page 66 and 67: José Capela66milícia, no comérci
- Page 68 and 69: José Capela68extremamente diversif
- Page 70 and 71: José Capela70da proibição que im
- Page 72 and 73: José Capela72desenganar aos comiss
- Page 74 and 75: José Capela74que puderam reduzir a
- Page 76 and 77: José Capela76As posições políti
- Page 78 and 79: José CapelaFoi sugerido que uma da
- Page 80 and 81: José Capela80O próprio Sá da Ban
- Page 82 and 83: José Capela82limitando a observaç
- Page 84 and 85: José Capela84se viam pequenos cobe
- Page 86 and 87: José Capela86netos, e a sua fortun
- Page 88 and 89: José Capela88de 150 a 200 pessoas,
- Page 90 and 91: José Capela90medida havia de traze
- Page 92 and 93: José CapelaOutro índice significa
- Page 94 and 95: José Capela94senhores. Conquista q
- Page 96 and 97: José Capela96Como a transmissão d
- Page 98 and 99: José Capela98com que se divertiam
- Page 100 and 101: José Capela100de escravos em grand
- Page 102 and 103:
José Capela102populações dominad
- Page 104 and 105:
José Capela104militarmente aqueles
- Page 106 and 107:
José Capela106economicamente. A au
- Page 108 and 109:
José Capela108capitão-general Dav
- Page 110 and 111:
José Capela110O mesmo governador,
- Page 112 and 113:
José Capela112eram dos mais ricos
- Page 114 and 115:
José Capela114Estamos portanto dia
- Page 116 and 117:
José Capela116O que aproveitava, s
- Page 118 and 119:
José Capela118todos os navios da m
- Page 120 and 121:
José Capela120enriquecer rapidamen
- Page 122 and 123:
José Capelatem ido deste país par
- Page 124 and 125:
José Capela124Não há dúvida que
- Page 126 and 127:
José Capela126disso o mesmo govern
- Page 128 and 129:
José Capela128para fazer o contrab
- Page 130 and 131:
José Capela130Ocidental apenas um
- Page 132 and 133:
José Capela132Esta narrativa deixa
- Page 134 and 135:
José Capela134de que Cirne o acusa
- Page 136 and 137:
José Capela136sindicância, porque
- Page 138 and 139:
José Capela138Foi assim que o mini
- Page 140 and 141:
José Capela140atribui às pressõe
- Page 142 and 143:
José Capela142ocaso do capitão Al
- Page 144 and 145:
José Capela144porque em Moçambiqu
- Page 146 and 147:
José Capela146no tráfico da escra
- Page 148 and 149:
José Capela148fronteiro à Ilha de
- Page 150 and 151:
José Capela150artigos adicionais s
- Page 152 and 153:
José Capela152vitória. E quando f
- Page 154 and 155:
José Capela154Os ingleses, que já
- Page 156 and 157:
José Capela156intervir no tráfico
- Page 158 and 159:
José Capela158domínios portuguese
- Page 160 and 161:
José Capela160Inglaterra disposta
- Page 162 and 163:
José Capela162da Bandeira recusou
- Page 164 and 165:
José Capela164negócio nada aprove
- Page 166 and 167:
José Capela166de D. João VI inter
- Page 168 and 169:
José Capelacomércio britânico, a
- Page 170 and 171:
José Capela170nesta verba débitos
- Page 172 and 173:
José Capelaeconómico dos dois pa
- Page 174 and 175:
José Capela174Os projectos, tímid
- Page 176 and 177:
José Capela176em nova era. O que a
- Page 178 and 179:
José Capelaesclavagistas e dadas a
- Page 180 and 181:
José Capela180algodão, para o qua
- Page 182 and 183:
José CapelaANEXOSCOMPRA DE UM ESCR
- Page 184 and 185:
José Capela184CIRNE, Manuel Joaqui
- Page 186 and 187:
José CapelaRESULTADO DOS TRABALHOS
- Page 188 and 189:
José Capela188AZEVEDO, Julião Soa
- Page 190 and 191:
José Capela190GOMES, Marques - LUC
- Page 192:
José Capela192SANCEAU, Elaine - D.