José CapelaFoi sugerido que uma das motivações para a política de fixação esboçadaem Angola na segunda metade do século XVIII, teria sido justamente ainfluência brasileira. Nomeadamente a veiculada por naturais do Brasil ouindivíduos que lá tinham servido e que daí tinham ido para a África. Foi oque aconteceu com o Dr. Lacerda e Almeida (1753-1798), governador dosRios de Sena, que foi o primeiro a tentar a travessia da África com carácterde expedição científica, para a qual partiu de Tete em 3 de Julho de 1789.O Barão de Moçâmedes, governador de Angola (1784-1790), que antesfora governador da capitania de Goiás. E Elias Alexandre da Silva Correia(nascido em 1753), de origem brasileira (147) .A política desenvolvimentista do governador pombalino de Angola,Sousa Coutinho, foi porém um caso isolado, de alguma maneira emcontradição com a política colonial feita a partir da metrópole. Quesobre a África, especialmente sobre Angola, se exercessem influênciasprovenientes do Brasil, é certamente incontestável. Que de lá viessemmesmo ideias ao arrepio do fluxo dominante do tráfico de escravos,nada impede de o admitir. Mais também é mais do que evidente queeste tráfico subvertia tudo o que saísse do âmbito do seu domínio.78forceza política manejar a intervenção inglesa com algum sacrifício lisonjeiro, eu tomo a liberdadede oferecer à consideração de V. Exa. uma lembrança que a este respeito me acorre». Dado que osbrasileiros que vinham aos portos de Luanda e Benguela se viam obrigados a pagar direito sobre aescravatura e sobre o marfim tanto nestes portos como nos do Brasil, sendo este país já independente,acontecia os barcos brasileiros frequentarem portos mais ao norte, nomeadamente o de Ambriz ondefacilmente podiam furtar-se ao controle aduaneiro. D. Maria tinha mandado destruir o forte de Ambrizpor pressão da França e o acesso a este porto era livre. Assim, desistindo da conquista, - sugeria ogovernador - «se poderia tirar uma vantagem dupla com a aparência de um sacrifício à Nação Inglesaem favor da sua empresa de abolição da escravatura, oferecendo-lhe a cedência do direito do comércioda escravatura até a Ambriz, inclusive, Lifune, ou Dande». Nestas condições, os brasileiros impedidosde ir a Ambriz voltariam a Luanda. Nicolau d’Abreu Castello Branco, governador de Angola, a condede Subserra, 23/Fevereiro/1826, A. H. U., Avulsos de Angola, Caixa 70.147 Avila de Azevedo, ob. cit., págs. 121 e segs.Lopes de Lima (citado in Andrade Corvo, ob. cit., I, pág. 149) referindo-se ao governador de AngolaD. Francisco Jerónimo de Sousa Coutinho, nomeado em 1746: «Angola não havia sido mais, até essetempo, do que um país de guerra e comércio, onde no fim de sucessivas pelejas cada um tratavasomente de quinhoar os despojos: governadores, capitães, magistrados, homens de igreja e do claustrotraficavam de um modo escandaloso: este excelente governador foi o primeiro que empreendeucivilizar aquela semi-bárbara possessão; e no seu governo de oito anos e meio fez mais neste sentidodo que todos os seus antecessores haviam nem sequer imaginado: é verdade que ainda então não erachegado o tempo de abolir o prejudicialíssimo tráfico da escravatura: este cancro ficou depois deleroendo, por mais de meio século, as entranhas de Angola, com todos os males, vícios e crimes, quelhe andavam anexos - a despovoação dos campos-desvio de capitais - a desmoralização - rapacidade- o egoísmo que ainda porventura levarão muitos anos a extinguir de todo».2007
As Burguesias Portuguesas e a Abolição do Tráfico de Escravatura, <strong>1810</strong>-<strong>1842</strong>Por isso mesmo, da obra incontestavelmente surpreendente do governadorCoutinho, nada subsistiu.O decreto abolicionista de 1838 não só não extinguiu o tráfico como,de alguma maneira, o excitou. Os comerciantes, ameaçados por umamedida que lhes acabava com o negócio e acossados pelas patrulhasinglesas, trataram de se aproveitar maximamente dele, enquanto o pudessemmanter, mesmo na clandestinidade. Pioraram enormementeas condições de embarque e acumulavam nos transportes quantidadesimpossíveis de negros. A projecção, no tempo e na vida de Angola, dessafase do negócio foi tal que, ainda em 1877, o relatório da AssociaçãoComercial de Luanda a ela se referia dizendo que o comércio lícito eramero acessório ao de carregamento de gente para a América. E que aexportação clandestina, que se sucedera a 1836, foi de tal ordem quea crise de mão-de-obra se fez sentir. As fortunas feitas dessa maneira«foram todas para a Europa» (148) .O tráfico prosseguiria, portanto, durante a década de quarenta, e, em1843-44, cerca de dois terços da receita pública continuavam a ser provenientesdos direitos cobrados sobre os escravos, nos portos (149) : Para Angolafora, como governador, o vice-almirante António Manuel de Noronha.Tomou posse do governo em 25 de Janeiro de 1839 e, de imediato, tornoupúblico que aplicaria rigorosamente o decreto. Convocou os capitalistas ecomerciantes locais, propondo-lhes a formação de uma associação para aexploração das minas de ferro com o capital mínimo de 10 contos de réis,logo elevado para o dobro. A sociedade chegou a realizar capital parainiciar a exploração, mas foi um fracasso completo. Uma expedição mandadapara as minas, com tropa e técnicos, morreu toda em Golungo Alto,de doença. A Fazenda Pública entrara na companhia com algumas acções«para a animar» (150) . A comissão encarregada de acabar com o tráfico «erapor si só bastante motivo para indispor contra ele (Noronha) um País, quedesde longo tempo não sabia dar outro emprego a seus cabedais...» (151) .79148 Costa Lobo, ob. cit., pág. 143.149 Wheeler e Pélisser, ob. cit., pág. 51.150 RELATÓRIO <strong>DO</strong> MINISTÉRIO <strong>DO</strong> ULTRAMAR apresentado em 1840, in ANNAES MARÍTIMOS ECOLONIAES, n.º 4, Fevereiro de 1841.151 Idem, Ibidem.E-BOOK CEAUP
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