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guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

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100 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />

européia, criou um espírito algo superficial que era uma <strong>de</strong>corrência direta do<br />

realismo.<br />

Enquanto, em outros setores, Rimbaud rasgava as veias <strong>de</strong> uma nova<br />

poesia e os impressionistas iniciavam o movimento que veio acabar, e continuar,<br />

na pintura mo<strong>de</strong>rna, e Debussy dava tons novos à música - o romance<br />

ficava, apesar <strong>de</strong> Kafka, Joyce, Hermann Hesse e Virginia Woolf, na narrativa<br />

imediatamente tradicional, então, como agora ainda muito, sob a forma do<br />

psicologismo.<br />

O Brasil passou também por esses caminhos. O que nos faltou, durante<br />

muito tempo, foi consciência <strong>de</strong> povo. O expoente <strong>de</strong> nossa literatura, Machado<br />

<strong>de</strong> Assis, foi profundamente brasileiro, mas um brasileiro citadino, cujas<br />

personagens, por mais nacionais que fossem, participavam, <strong>de</strong> algum modo, da<br />

normal <strong>de</strong>snacionalização da classe média <strong>de</strong> qualquer cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>. Isto não<br />

era um mal em si, nem impediu que o escritor fosse ao ponto alto que realmente<br />

atingiu, mas o povo, cuja unificação se consolidara em meados do século passado,<br />

continuava à espera <strong>de</strong> outros livros. Na mesma época em que Machado<br />

escrevia seus melhores romances, a revolta <strong>de</strong> Canudos espantava a nação e<br />

exigia um tipo diferente <strong>de</strong> contador <strong>de</strong> histórias. Como, para cada tarefa, há<br />

sempre alguém apto a realizá-la, Euc1i<strong>de</strong>s da Cunha tomou a si a obrigação e<br />

narrou o caso <strong>de</strong> Canudos. Ali, nos Sertões, estava, pela primeira vez, um povo<br />

inteiro, com raízes que, sem que muita gente o soubesse, tinham ido bem<br />

fundo.<br />

O que fora feito <strong>de</strong> uma vez, em sentido total, continuou, mais tar<strong>de</strong>,<br />

sendo realizado aos poucos, em pequenas tomadas <strong>de</strong> consciência, em José<br />

Lins do Rêgo, Jorge Amado, Graciliano Ramos, todos com obras em que o<br />

povo surgia ao natural, embora muitas vezes tocado <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />

romantismo mo<strong>de</strong>rno.<br />

Agora, aparece-nos João Guimarães Rosa com seu Gran<strong>de</strong> Sertão:<br />

Veredas. E po<strong>de</strong>mos dizer que o romance brasileiro <strong>de</strong>u, com isto, um gran<strong>de</strong><br />

passo. Pela segunda vez, e em plano diferente, temos o Brasil <strong>de</strong> corpo inteiro<br />

numa narrativa. Vejamos, em primeiro lugar, a importância, digamos, geográfica,<br />

em que se situa o livro <strong>de</strong> Guimarães Rosa. A região do São Francisco,<br />

perto do Urucuia, pegando o Norte <strong>de</strong> Minas, o Sul da Bahia e o Leste <strong>de</strong><br />

Goiás, é, sob vários aspectos, o centro do Brasil. As andanças <strong>de</strong> suas personagens<br />

por essa região formam um resumo <strong>de</strong> todo o país. Nenhum dos habitantes<br />

do romance pensa em cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> – talvez o maior agrupamento humano,<br />

citado em Gran<strong>de</strong> Sertão: Veredas seja Montes Claros. Nem a capital do<br />

Estado, Belo Horizonte, nem o Rio <strong>de</strong> Janeiro, nem qualquer outra cida<strong>de</strong>

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