guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

Guimarães Rosa e o cinema ___________________________________________________ Paulo Augusto Gomes 207
do Corpo Fechado” narra a trajetória do vaqueiro João de Deus, empregado do
coronel Trajano dos Reis, que mantém sob sua guarda, quase presa, a moça
Dinorá. João e ela decidem fugir e são perseguidos por capangas do coronel.
Ele consegue se livrar de todos, inclusive do ex-patrão e, ao final, vai embora
com sua amada sertão afora. Não é muito, mas Schubert, como Rosa, sabia que
o segredo não estava na seqüência de ações dos personagens e sim na forma
com que emoções e sentimentos eram exprimidos.
O sertão, onipresente, mostra toda a sua grandeza na maneira como
Schubert o filma, integrando seus personagens na beleza do lugar. Escolhe
minuciosamente cada plano em função do que a paisagem exprime e opta quase
sempre por planos de conjunto, ou seja, aqueles em que as figuras humanas são
pouco mais que um detalhe no todo. Raros são os planos aproximados ou
closes, como se diz na linguagem cinematográfica. Também extremamente
funcional é a música de Tavinho Moura, na qual a viola caipira tem importante
presença.
De início, o filme de Schubert parece se filiar diretamente a Rosa. Afinal,
um dos contos do escritor em Sagarana tem exatamente o nome de Corpo
Fechado. Esse, aliás, era o nome original do filme, modificado em favor de
uma possível melhor bilheteria, algo que acabou não acontecendo. O cineasta
parte do mesmo motivo dramático e ainda coloca como epígrafe uma citação de
Rosa mas, a partir daí, o relacionamento se dá pela apropriação do sertão
rosiano por Schubert. Seu filme é direto, sem rodeios, na linha em que também
trabalhou o escritor. Acontece que, no caso, além do escritor, outra influência
forte também se faz presente: a do western americano, que Schubert também
admirava muito. É dessa mistura bem trabalhada que surge a beleza de O
Homem do Corpo Fechado.
Não se trata de exemplo isolado. Outros poderiam ser lembrados na
filmografia brasileira, com resultados igualmente felizes. Assim como,
tomando como base textos de Rosa, muitos cineastas perderam-se do seu
universo, é igualmente possível a outros, mais talentosos, encontrar uma
aproximação com o escritor por meio da captação sensível do seu universo. São
esses os filmes que interessam, no caso. Não é difícil imaginar que João
Guimarães Rosa teria se orgulhado das sementes que plantou na cultura
brasileira.