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guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

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250 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />

A<strong>de</strong>mais, índices locativos <strong>de</strong>nunciam o uso racional do espaço, indicador<br />

das circunstâncias <strong>de</strong> tempo e lugar compartilhados com o leitor, num gesto<br />

referencial <strong>de</strong> baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> significativa.<br />

No entanto, o leitor espera do autor que lhe ofereça o prazer da evocação,<br />

mediante o agrupamento <strong>de</strong> vocábulos e sentenças que inebriam os ouvidos,<br />

estimulam a memória afetiva e acalentam a ilusão literária. Sim, o leitor<br />

espera os versos que ativem a reflexão ou que incen<strong>de</strong>iem a mente.<br />

Quando tomamos conhecimento da coletânea Tangências (Rio, 7 <strong>Letras</strong>,<br />

2005), <strong>de</strong> Sílvia Rubião, sentimos que um novo nome se acrescentou ao rol dos<br />

poetas mineiros. O primeiro poema, “Memória <strong>de</strong> água”, já nos motivou para a<br />

leitura e avaliação crítica do restante.<br />

Prega-se hoje a morte do livro, da expressão lírica, quer nos mol<strong>de</strong>s do<br />

verso livre, quer nos gêneros consagrados pela tradição; anuncia-se o fim do<br />

romance e da centralida<strong>de</strong> do sujeito, por mais que a poesia renasça em mil<br />

recantos do planeta, sob as mais variadas formas. Estão vivos, mais do que<br />

nunca, o impulso da criação poética e a fome <strong>de</strong> leitura dos melhores escritores.<br />

Sílvia Rubião organiza cada composição com segurança <strong>de</strong> linguagem,<br />

vocabulário rico e próprio, arranjos a<strong>de</strong>quados para exprimir uma situação<br />

lírica aberta à invasão das carências humanas. Explora um “eu lírico”<br />

angustiado, um <strong>de</strong>sencanto generalizado mediante composições verbais <strong>de</strong> alta<br />

energia dramática.<br />

O segundo poema, “O ouro da rua”, é tão expressivo quanto o primeiro,<br />

numa atmosfera <strong>de</strong> crepuscular visão-<strong>de</strong>-mundo. A poetisa cria uma ambientação<br />

evocativa, <strong>de</strong>serta <strong>de</strong> esperanças, enfileirando sintagmas ambíguos que<br />

projetam submersos e remotos <strong>de</strong>sejos: “Reencontrar a dupla fonte do meu rio”,<br />

numa era <strong>de</strong> outono, numa tar<strong>de</strong> em que “as cigarras enchem as tar<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

lamentos”, e uma circunstância <strong>de</strong> “subir a serra recortada no azul”.<br />

Ora, “O ouro da rua” imprime na memória do belorizontino a Rua do<br />

Ouro e o faz recordar, na mente, a escalada do bairro da Serra, com “S” maiúsculo:<br />

“Lá on<strong>de</strong> o meu cálice brilha e não há resposta”, conclui o poema.<br />

Com rigor e boa alquimia, a poetisa mobiliza os vários arquétipos da<br />

imemorial herança dos povos, valendo-se das suas convenções culturais. Exemplo:<br />

o “cálice” que brilha no final do poema aponta para a sensação <strong>de</strong> dor e<br />

sofrimento.<br />

Um dos recursos utilizados por Sílvia Rubião é a aproximação <strong>de</strong><br />

imagens contrastivas (freqüente, por exemplo, em Carlos Drummond <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>, que adotou um oxímoro para nomear uma <strong>de</strong> suas obras: Claro<br />

Enigma). Enquanto, no outono <strong>de</strong> “O ouro da rua”, “tudo se revela <strong>de</strong>finitivo e

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