15.04.2013 Views

guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

guimarães rosa - Academia Mineira de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

82 _______________________________________________ REVISTA DA ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS<br />

gaturamo, tucano, coruja, perua, periquito, arara, alma-<strong>de</strong>-gato, bem-te-vi,<br />

passo-preto, nhambu, maitaca (em Goiás: maritaca), pica-pau, gavião, morcego,<br />

guache (em Goiás se diz guacho), curió (Guimarães Rosa registra curiol),<br />

borboletas, mosquitos, vespas (ele diz: avespa), urubu, coruja-branca, vagalumes,<br />

maria-preta, patativo, canarinho-cabeça-<strong>de</strong>-fogo, papa-capim, encontro,<br />

tatoranas-ratas, lagartixas, minhocas... Nos corgos e ribeirões e rios, peixes:<br />

piaba, timburé, bagre....<br />

É o narrador quem conta:<br />

– Entretanto, Miguilim não era do Mutúm. Tinha nascido ainda mais<br />

longe, também em buraco <strong>de</strong> mato, lugar chamado Pau-Roxo, na beira do<br />

Saririnhém. De lá, separadamente, se recordava <strong>de</strong> sumidas coisas, lembranças<br />

que ainda hoje o assustavam.<br />

Dessas lembranças mais remotas do Pau-Rôxo, que o assustavam, “sumidas<br />

coisas”, uma era a <strong>de</strong> uma pedrada que um Menino Gran<strong>de</strong> lhe acertara na<br />

cabeça, na testa; outra, <strong>de</strong> um banho em sangue <strong>de</strong> tatu que lhe <strong>de</strong>ram para<br />

curá-lo <strong>de</strong> uma doença, “para ele po<strong>de</strong>r vingar”, ele “nu, <strong>de</strong>ntro da bacia”. Se<br />

recordava também <strong>de</strong> que “umas moças chei<strong>rosa</strong>s, limpas, os claros risos<br />

bonitos pegavam nele, o levavam para a beira duma mesa, ajudavam-no a<br />

provar, <strong>de</strong> uma xícara gran<strong>de</strong>, goles <strong>de</strong> um <strong>de</strong>-beber quente, que cheirava a<br />

clarida<strong>de</strong>”. Mais: “Depois, na alegria num jardim, <strong>de</strong>ixavam-no engatinhar no<br />

chão, meio àquele fresco das folhas, ele apreciava o cheiro da terra, das folhas,<br />

mas o mais lindo era o das frutinhas vermelhas escondidas por entre as folhas –<br />

cheiro pingado, respingado, risonho, cheiro <strong>de</strong> alegriazinha. As frutas que a<br />

gente comia. Mas a mãe explicava que aquilo não havia sido no Pau-Rôxo, e<br />

bem nas Pindaíbas-<strong>de</strong>-Baixo-e-<strong>de</strong>-Cima, a fazenda gran<strong>de</strong> dos Barbóz, aon<strong>de</strong><br />

tinham ido <strong>de</strong> passeio”.<br />

Miguilim, assim criado longe <strong>de</strong> tudo, não sabia o que é teatro e circo,<br />

coisas que mãe <strong>de</strong>le, no entanto, conhecera uma vez, parece que em uma vila, e<br />

tentou uma vez explicar a ele o que são.<br />

A mãe era natural do Quartel-Geral-do-Abaeté. O pai, <strong>de</strong> Buritis-do-<br />

Urucúia. (Será a atual Buritis, não muito distante <strong>de</strong> Arinos?)<br />

O pai <strong>de</strong> Miguilim é um homem difícil, susceptível <strong>de</strong> ficar nervoso e<br />

<strong>de</strong>sequilibrado por pouca coisa, mesmo com pequenos inci<strong>de</strong>ntes comuns da<br />

penosa vida diária <strong>de</strong> fazenda sertaneja. Assim, por exemplo, quando alguma<br />

rês se machuca rasgando a barriga nas pontas <strong>de</strong> uma aroeira. Miguilim,<br />

recordando, <strong>de</strong>põe:<br />

– Como o pai ficava furioso: até quase chorava <strong>de</strong> raiva! Exclamava que<br />

ele era pobre, em ponto <strong>de</strong> virar miserável, pedidor <strong>de</strong> esmola, a casa não era

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!